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Um novo panorama político em Portugal?

Nem a Esquerda nem a Direita ficaram iguais depois das eleições. No dia seguinte, amanheceu-se num Portugal partidariamente diferente e que reflete o quadro socioideológico português.

À Esquerda, O Bloco de Esquerda foi capaz de sobreviver, provando que o seu eleitorado ficou satisfeito com a geringonça e com a maturidade do partido, ao ser capaz de encontrar posições de consenso e de ponderação democrática, indo além da disposição de guerrilha, afirmando-se de vez como flanco esquerdo democrático do PS. A CDU, por sua vez, dissolve-se, passando a ser a bancada do PCP. A perda de 5 deputados traduz o efeito de desgaste cada vez mais acentuado não apenas do seu líder, mas também do próprio partido, progressivamente percebido como perdido no tempo dos combates de que uma larga maioria da população não se reconhece, ou encontra maior dinamismo no Bloco de Esquerda. Numa interpretação mais contida, o desgaste de Jerónimo de Sousa é cada vez mais evidente e ou o partido regenera ou arrisca-se a desaparecer, mesmo com o controlo dos sindicatos. Em sentido contrário, o LIVRE, partido de Rui Tavares, graças à exposição mediática de Joacine Katar Moreira e à capacidade desta em catapultar a agenda da militância negra e feminista, consegue pela primeira vez a eleição de uma representante. É expectável que Joacine Katar Moreira seja capaz de traduzir a qualitativa, estruturada e pensada agenda democrática e de Esquerda do LIVRE, sendo mais do que um partido da (importante) “agenda negra”. Por sua vez, o PAN, consolida a sua posição no campo político português, conquistando um grupo parlamentar, gozando do sucesso de uma boa estratégia de comunicação e relação com a imprensa, catapultando a sua agenda animal e ambiental, permitindo-nos compreender o crescimento de uma consciência social “vegana” que não se reconhecia no PEV (possivelmente pela coligação com o PCP), ou no MPT, um partido mais conservador.

Na margem oposta, temos um CDS em total colapso, voltando a ser um partido pequeno, perdendo, muito provavelmente, eleitorado para o Chega e para a Iniciativa Liberal, consoante o tipo de agenda ideológica, comprovando que a Direita está a fragmentar-se, entre posições mais extremadas no campo social, e posições mais radicais em matéria económica. Mais do que a entrada em cena da IL, o crescimento do Chega dá-nos conta de um cenário mais preocupante, comprovando que já não basta um discurso católico-conservador marcante do CDS para acalmar um certo tipo de clamor social. Portugal deixou de ser, assim, um país parlamentarmente livre da extrema-direita. Enquanto o CDS volta a ser o partido “do táxi”, o Chega afirma-se como o partido “da taberna”, configurando um tipo de narrativa racista, de pendor autoritário, que catapulta uma ideologia nostálgica que capta um eleitorado mais velho, saudosista do antigo regime e do Portugal que não sendo racista, estava “livre” de ciganos, negros e toda essas “raças”.

Sobre o/a autor(a)

Doutorado em Estudos Africanos pelo ISCTE-IUL. Mestre em História e Cultura das Religiões pela FLUL. Investigador Integrado do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL.
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