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Floreados: Construindo Canteiros e Abatendo Árvores

Construir e melhorar os espaços verdes em Viseu, ou qualquer outra cidade, é uma prioridade política. Mas isto não significa construir canteiros e ir abatendo árvores.

Seja de forma consciente ou inconsciente a cidade e os espaços que nos rodeiam afectam o nosso dia-a-dia de forma incrível. Estudos científicos mostram-no de forma clara: zonas verdes ajudam as cidades a “libertar-se” da poluição, ajudam a manter a população feliz e ajudam-nos a sentir mais confortáveis nas calçadas que pisamos todos os dias para ir para o trabalho ou para casa.

Considerando isto, construir e melhorar os espaços verdes em Viseu, ou qualquer outra cidade, é uma prioridade política. Mas isto não significa construir canteiros e ir abatendo árvores. Não me interpretem mal, a ideia das flores aqui e ali é fantástica, mas não é com floreados que vamos lá.

É importante que estes espaços verdes sejam compostos por plantas da zona. Estas plantas estão bem adaptadas ao nosso meio, são aquelas com as quais crescemos e as que nos fazem sentir em casa. Estando bem adaptadas ao nosso clima, estas também não necessitam de regras extras, fertilizantes ou pesticidas – poupando mão de obra, custos de manutenção e ambientais. Apenas desta forma, a restauração da flora levará à recuperação do verde no centro da cidade de uma forma realmente sustentável, o que se revelará importante para todos os habitantes de Viseu e para o ambiente local.

Um papel fundamental das árvores é a sua retenção de níveis elevados de carbono, melhoramento das propriedades e conservação dos solos, a qualidade da água e do ar e permitirem, pela conservação de todos estes aspectos, enriquecer e proteger a biodiversidade, assim como prevenir o desabamento de terra e diminuir o risco de incêndio. Ao invés de as deixarmos morrer naturalmente para se degradarem no solo, ao abatermos as árvores, quebramos também mais um ciclo natural de recuperação da matéria orgânica, que ocorre pela decomposição da espécie e permite a manutenção e recuperação dos solos.

As flores são importantes, claro que sim, mas não substituem a ação de uma árvore, nem revertem as consequências dos seus abates. Relembramos também que “Uma árvore (ou 9) não faz uma floresta, não é capaz de criar um clima local equilibrado, é vulnerável ao vento e às condições meteorológicas. Pelo contrário, muitas árvores juntas logram formar um ecossistema, capaz de mitigar o calor e frio extremos, de armazenar toda uma quantidade de água e de produzir ar bastante húmido. É neste tipo de ambiente que as árvores são capazes de viver protegidas e por muitos anos.” (Peter Wohlleben).

As florestas plantadas, os jardins artificiais que usamos para repor a flora que abatemos – mesmo quando as espécies são bem escolhidas – vêm as suas raízes danificadas o que dificulta a sua ligação à rede, prejudicando o seu desenvolvimento e deixando-as mais susceptíveis a pragas e doenças e obrigando assim a uma maior manutenção das mesmas. Manutenção na qual, em Viseu, invariavelmente, se recorre a métodos químicos.

Querendo atingir objetivos com consequências ambientais, a longo prazo, ao invés de puramente estéticas talvez seja melhor focarmos primeiramente as atenções na proteção, manutenção e recuperação dos espaços verdes já existentes e não abater árvores sem uma razão devidamente justificada, com especial atenção nas mais antigas.

Esperamos que esta onda ecológica englobe também e com urgência determinadas ações: eliminar o uso fitoquímicos para limpeza urbana, nomeadamente o glifosato; eliminar todos os descartáveis nos eventos promovidos ou apoiados pelo município e promover a devolução dos reutilizáveis, reduzindo o lixo dentro e ao redor dos mesmos; optimizar a recolha de lixo e higienização dos contentores em zonas da cidade como p.ex o centro histórico ou o bairro da paradinha; reflorestar zonas ardidas ou abatidas e promover a floresta biodiversa; posicionar-se contra os projetos de exploração mineira; promover o uso de transportes coletivos públicos apostando na sua adaptação às necessidades da população; aperfeiçoar a captação e uso dos recursos hídricos, perceber qual/quais o(s) foco(s) de poluição, se o tratamento efetuado às águas devolvidas é adequado e intervir sobre estas situações através de processos de fiscalização e penalização das entidades responsáveis – o que não ocorre atualmente, pelo menos, em Tondela, Lamego, Mangualde, Sátão, Viseu, Carregal do Sal, Santa Comba Dão, São João da Pesqueira ou Tarouca – e escolher opções viáveis a longo prazo, como seria a de optar pela construção de uma variante à Estrada Nacional 229 que não apresente risco de contaminação do aquífero, minas, galerias subterrâneas, instalação das Águas de Viseu e campos agrícolas que servem a população.

Artigo publicado em Interior do Avesso

Sobre o/a autor(a)

Psicóloga, ativista da plataforma “Já Marchavas” e da Rede 8 de Março
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