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De Berlim, nem bons ventos…
Há quem, na busca de causas, se queira focar apenas nos fatores externos, como o Brexit ou as loucuras da política comercial de Trump. São fatores importantes, que têm testado os nervos dos mercados e que afetarão a economia europeia. Mas, como bem notou o economista Paul Krugman, a fraca recuperação europeia pós-crise é fruto de escolhas económicas internas erradas e a fuga para a frente só acabará em mais crise.
É urgente reconhecer que a obsessão austeritária mergulhou as economias europeias numa profunda recessão que se transformou depois numa espécie de letargia próxima da estagnação.
Nestes anos fez-se de tudo, tal como manda a cartilha neoliberal: programas intensos de "reformas estruturais" que incluíram privatizações, liberalização de setores económicos e desmantelamento das leis laborais, bem como "ajustamentos" orçamentais sem precedentes, com cortes nos serviços públicos, no investimento do Estado e nos apoios sociais.
Perante o falhanço, fez-se até uma intervenção musculada do BCE, que injetou triliões de euros no sistema financeiro. Os juros da dívida pública desceram mas a economia europeia permaneceu um zombie económico preso aos seus próprios dogmas.
Depois de um choque de empobrecimento, desemprego e destruição de capacidade produtiva, a Europa impôs-se assim um novo normal. O objetivo não é reduzir o desemprego e a precariedade, melhorar os serviços públicos e a produção ou combater as alterações climáticas com um programa de investimentos, à semelhança do que foi feito depois da Segunda Guerra Mundial. O maior objetivo é manter excedentes orçamentais, nos países do Sul, castigados por preconceito, mas também na Alemanha, em superavit desde 2013. Mas agora a Alemanha está à beira da recessão, sem consumo ou investimento que lhe permitam sustentar o crescimento - e o mesmo se passa em geral na Zona Euro. E, desta vez, já há muito pouco que o BCE possa fazer, uma vez que as taxas de juro já não podem descer mais. É por isso que em Berlim se discute agora, para tentar travar a recessão, romper com as regras internas que limitam o investimento público.
Para evitar a crise, a Europa, como Portugal, tem que aprender com os erros do passado. A estabilidade não vem da autoridade para impor medidas de restrição económica e social. Mais salário e emprego, um programa de investimento produtivo, direitos sociais e controlo sobre a Banca. É aí que temos que procurar as respostas que contam no futuro.
Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 27 de agosto de 2019
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