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Arroja, tira as mãos do SNS!

Em 2015, Passos Coelho lançou a primeira pedra da nova ala pediátrica do hospital de S. João, apadrinhando um projeto onde o Estado delegava em associações e construtoras uma função social fundamental para a sociedade.

3 de março de 2015. Ano de eleições legislativas. Passos Coelho, à altura primeiro-ministro, desloca-se ao hospital de S. João, Porto, para lançar uma pedra, aquela que seria a primeira pedra da nova ala pediátrica.

A associação de Pedro Arroja cederia, por 50 anos, um terreno de mais de 7.000m2 para que a Sonae instalasse ali um supermercado da cadeia Continente. Em troca, a Sonae transferiria 300 mil euros por ano para a Associação

Não é que o Governo fosse investir no SNS ou fosse disponibilizar um cêntimo para a obra. Não. Passos Coelho passou por lá para apadrinhar um projeto onde o Estado se desresponsabilizava de financiar o SNS e delegava em associações e construtoras uma função social fundamental para a sociedade.

Pedro Arroja também estava nesse happening e não estava lá por acaso ou coincidência. Arroja presidiria a uma associação – Um Lugar para o Joãozinho – que se propunha a angariar os mais de 20 milhões de euros necessários para a construção da ala pediátrica, estabelecendo depois um acordo com um consórcio de construtoras, em concreto o Lúcios-Somague.

Esta Associação, constituída IPSS, angariou 700 mil euros em mais de dois anos. O valor não chegava a 1/30 do que era necessário, mas, para sermos honestos, temos que admitir que já tinha servido para alguma coisa. Em primeiro lugar, serviu para anunciar com pompa e circunstância o início de uma obra que não tinha dinheiro para o seu financiamento e concretização; em segundo lugar, serviu para que os ditos mecenas pudessem abater os montantes doados em sede de IRC e de IRS. Para a construção da ala pediátrica é que certamente não serviu.

Tornava-se por demais evidente que a capacidade de iniciativa e de empreendedorismo por parte de quem sempre combateu o Estado não passava de um enorme flop. Foi então que o ultraliberal Pedro Arroja pensou em ceder terrenos pertencentes ao hospital para a instalação de um supermercado. Um negócio típico de quem odeia o público, feito à custa dos recursos públicos.

Os contornos do negócio falam por si: a associação de Pedro Arroja cederia, por 50 anos, um terreno de mais de 7.000m2 para que a Sonae instalasse ali um supermercado da cadeia Continente. Em troca, a Sonae transferiria 300 mil euros por ano para a Associação. A tudo isto acresce este pormenor: o terreno não era nem da Associação, nem de Pedro Arroja. Era do Estado.

Dois anos depois do lançamento, com pompa e circunstância, da primeira pedra da ala pediátrica, ficava claro o enorme falhanço do projeto Passos-Arroja.

Foi tudo uma perda de tempo, uma absoluta irresponsabilidade. Foi uma perda de tempo e correu-se o risco de o hospital de S. João ficar com os seus terrenos capturados por uma superfície comercial.

O preconceito do Governo PSD/CDS contra o Estado e contra o SNS deu nisto: delegaram funções essenciais do Estado em quem não tem mínima competência e em quem, à primeira oportunidade, tentou concretizar um negócio que nada tinha a ver com saúde ou com a melhoria dos cuidados de saúde prestados aos utentes.

O projeto de Passos Coelho e do Governo PSD/CDS que, depois de retirarem 1.000 milhões de euros ao SNS, julgavam poder substituí-lo por uma qualquer Arrojice falhou com estrondo.

Como é óbvio, o SNS é uma responsabilidade do Estado e é ao Estado que cabe financiar os investimentos necessários. E é isso que é preciso fazer agora, sem mais demoras, sem mais manobras dilatórias, sem mais planos absurdos.

Arroja continua a querer ser um obstáculo para a concretização do investimento que é preciso fazer no hospital de S. João, agora porque se recusa a devolver os terrenos que são públicos e que pertencem ao hospital

O problema é que o ainda presidente da associação Um Lugar para o Joãozinho continua a querer ser um obstáculo para a concretização do investimento que é preciso fazer no hospital de S. João, agora porque se recusa a devolver os terrenos que são públicos e que pertencem ao hospital.

Segundo o que já foi explicado pelo Conselho de Administração do centro hospitalar, neste momento existe um projeto que está na fase final de revisão, existem também recursos financeiros (seja em aumento de capital estatutário, seja em financiamento para a construção da nova ala), mas falta que Pedro Arroja e a sua associação libertem o espaço (que é público) para que se possa lançar o concurso.

O protocolo entre o centro hospitalar e a associação caducou em dezembro de 2018, altura em que se estabeleceu um período de 3 meses para a devolução do terreno ao hospital. Apesar de informada disso, a associação recusa-se a entregar o terreno e decidiu mesmo interpor uma ação em tribunal para, pasme-se, fazer uma obra para a qual não tem nem nunca teve financiamento num terreno que não é nem nunca foi dela!

De facto, Pedro Arroja continua a disputar os terrenos e a titularidade da obra. E essa reclamação é agora mais sonante. Agora que há financiamento real, agora que o Estado já garantiu os mais de 20 milhões de euros necessários, Pedro Arroja acha que pode usá-los e geri-los como bem entender. Por isso interpôs uma ação judicial a reclamar os terrenos do hospital. Enquanto isso, o hospital público anunciou ter desencadeado os procedimentos legais para a tomada de posse administrativa de terrenos que são seus.

Os que acharam que o SNS deveria ser substituído por figuras como Pedro Arroja não só falharam redondamente como querem fazer com que o SNS falhe. Não é a ala pediátrica ou os utentes que os move, é o fanatismo contra o Estado e contra o serviço público de saúde.

Tirar o Arroja do São João é tão importante como manter o PSD e o CDS longe do SNS.

Sobre o/a autor(a)

Doutorando na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto e investigador do trabalho através das plataformas digitais. Dirigente do Bloco de Esquerda
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