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Uma nova respiração

A manifestação de jovens na Avenida da Liberdade contra a violência racista, a greve feminista e a greve estudantil pelo clima mostram essa nova vitalidade do movimento social, a sua criatividade propositiva e a sua determinação transformadora.

Há movimento social em Portugal. A manifestação de jovens na Avenida da Liberdade contra a violência racista, a greve feminista e a greve estudantil pelo clima mostram essa nova vitalidade do movimento social, a sua criatividade propositiva e a sua determinação transformadora. E, mais que tudo, têm a força irreprimível da juventude.

O que fez os/as jovens racializados/as, os/as jovens feministas e os/as jovens ambientalistas vir à rua dizer um sonoro ‘basta’ foi a lucidez de perceberem que a democracia política convive bem demais com a perpetuação de uma cultura pesada de racismo, de discriminação das mulheres e de destruição irresponsável do ambiente. Disse Greta Thunberg, a jovem sueca que desencadeou o movimento estudantil mundial pelo combate às alterações climáticas: “Nós, os jovens, começámos a mobilizar-nos. Vamos mudar o destino da humanidade, quer queiram, quer não. Unidos vamo-nos sublevar até que haja justiça climática. Vocês falharam-nos no passado. Se continuarem a falhar no futuro, nós, os jovens, faremos acontecer a mudança pelas nossas próprias mãos.”

É idealismo? É. É o melhor dos idealismos – o idealismo dos realistas. Greta sabe que o tempo se está a esgotar e que, só no tempo curto da sua vida, se registaram 8 dos 10 anos mais quentes desde que há registos. Greta sabe que os governos do mundo celebraram um acordo de mínimos em Paris, mas que em 2030 esses mínimos já terão sido inviabilizados por um sistema económico de gula predatória. Greta sabe que essa gula estúpida matará a sua geração. E por isso, é com uma autoridade desconcertante que proclama do alto dos seus 16 anos que “somos o futuro sem voz da humanidade”.

As mulheres que pararam a sua vida em 8 de março sabem que o tempo se está a esgotar para erradicar a discriminação de que são alvo no trabalho, na casa, na rua, no discurso. Pararam porque a nossa democracia política convive bem demais com essa cultura funda de secundarização das mulheres.

Os/as jovens pretos que ocuparam a Avenida da Liberdade sabem que o tempo se está a esgotar e que o Jamaica foi apenas mais uma gota de água num quotidiano feito muito mais de estigmas institucionalizados do que de frases grosseiras. Não tiveram mais pejo em sair à rua porque, também para eles/as, a nossa democracia política convive bem demais com a violência que é a negação de direitos por causa da cor da pele.

Sim, há movimento social. Com ele, a democracia respira. Quem não perceber isso vai-se dar mal.

Artigo publicado no diário "As Beiras" a 16 de março de 2019

Sobre o/a autor(a)

Professor Universitário. Dirigente do Bloco de Esquerda
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