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Não brinquem aos transportes públicos

Dr. Rui Moreira, não brinque com os passageiros, não brinque com a importância dos transportes públicos.

Desde o início dos anos 90 que os sucessivos governos PS, PSD, PSD/CDS optaram pelo desinvestimento no transporte público de passageiros. Do encerramento de cerca de 800 Km de via férrea pelo então primeiro ministro Cavaco Silva, passando pelo investimento em autoestradas ligando ao centro das cidades, assim como criar parques de estacionamento, e lugares na via pública, retirando espaço aos peões e originando uma progressiva degradação da qualidade de vida das populações.

O congestionamento de tráfego e a poluição atmosférica e sonora são alguns dos problemas originados pelo aumento progressivo de veículos automóveis nas vilas e cidades, causando stress, problemas de saúde e perdas económicas (aumento de horas perdidas no trânsito e consequente diminuição de horas de trabalho ou lazer, assim como perdas económicas, seja pelo consumo de energia – aumento de importação de combustíveis – seja pelas perdas relacionadas com acidentes ou taxas de carbono, resultando na consequente diminuição da qualidade de vida nos centros urbanos).

A isto, junta-se o facto do crescimento das cidades e do aumento do custo de vida, que levou a que a população se deslocasse e fixasse na periferia, não sendo este movimento acompanhado pela criação de uma rede de transportes adequada, contribuindo assim para a necessidade das pessoas se deslocarem em viatura própria.

A crescente tomada de consciência por parte da população das alterações climáticas, o facto de os transportes contribuírem com cerca de 25% da emissão de gases de efeito de estufa (GEE), assim como a necessidade de rentabilização do tempo, motiva a opinião para o estabelecimento de novos critérios e metodologias de mobilidade. Estes critérios passam por diminuir a dependência quer do tempo, quer da energia associada às deslocações, levando à necessidade de introduzir padrões de mobilidade sustentável, estabelecendo como prioritária a utilização de transportes públicos e dos modos suaves de deslocação (deslocações a pé, bicicleta e veículos partilhados – automóveis, trotinetes e bicicletas elétricas).

Desde o início da legislatura que o Bloco de Esquerda defende a redução tarifária e o investimento em transporte público de passageiros.

O Governo assumiu em 2016, na COP 22 em Marraquexe, o objetivo de atingir a neutralidade carbónica até 2050, cumprindo os objetivos do acordo de Paris no que às alterações climáticas diz respeito.

Fruto deste assumir de compromissos, e na negociação do OE para 2019, entenderam as partes envolvidas criar um Programa de Apoio à Redução Tarifária dos Transportes Públicos (PART). Este programa prevê uma dotação orçamental, a ser entregue às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e às CIM (comunidades intermunicipais).

A Lei do Orçamento do Estado para 2019 prevê o financiamento do PART, que tem como objetivo combater as externalidades negativas associadas à mobilidade (congestionamentos, poluição, ruído, emissão de gases de efeito de estufa, etc.) visando também atrair passageiros para os transportes públicos.

No despacho nº 1234-A/2019, de 31 de janeiro, fica definido o modelo de implementação do PART, assim como as verbas a atribuir a cada área metropolitana e a cada CIM. Dos 104 milhões de euros orçamentados para o PART, 15 % são atribuídos à AMP (cerca de 15,1 M€). Para ter acesso a estes valores, os municípios estão sujeitos a uma comparticipação mínima de 2,5% da verba que lhes for transferida pelo estado central, assim como têm de, até 15 março, remeter ao Fundo Ambiental o plano de aplicação das dotações do PART (em que o mínimo de 60% dessa verba tem que ser aplicado na redução do valor dos passes e o restante pode ser aplicado nas infraestruturas).

Todos reconhecemos que estas propostas, assim como o aumento de investimento nos transportes públicos, podem significar o inverter das questões de mobilidade, seja pela poupança direta aos utilizadores, seja pelos ganhos à sociedade e ao planeta em geral.

Em 22 de fevereiro, o Conselho Metropolitano do Porto, em reunião efetuada na Póvoa de Varzim, decidiu favoravelmente a implementação do PART (Programa de Apoio à Redução tarifária nos Transportes Públicos). Anunciou também que esta implementação será faseada, ou seja, em 01 de abril de 2019 entraria em vigor o Passe Único de 30€ (para viagens dentro de um município, ou em 3 zonas quando sejam viagens intermunicipais) e o Passe Único de 40€ para toda a AMP, em todos os operadores que integram o Andante e em 01 de Maio seria aplicado a toda a AMP, prevendo também a entrada em vigor do passe gratuito para crianças até 12 anos, no inicio do próximo ano letivo e o passe família (máximo 80€ por agregado familiar) para o próximo ano civil.

Se à não aplicação da Lei na sua totalidade se poderá justificar com questões relacionadas com o facto de nem todos os operadores estarem ainda abrangidos pelo tarifário Andante, ou questões relacionadas com a forma como será “comprovado” o agregado familiar, o mesmo não se entende quanto à posição transmitida pelo Dr. Rui Moreira (presidente da Câmara do Porto) no dia 06 de março, dando conta que na cidade do Porto, o dia 01 de abril não será a data de entrada em vigor, afirmando que será disponibilizado até ao final do ano, mas ainda sem data definida, invocando um conjunto de razões técnicas, quando a bilhética (Andante) é da responsabilidade da TIP (Transportes Intermodais do Porto).

Dr. Rui Moreira, não brinque com os passageiros. Dr. Rui Moreira, não brinque com a importância dos transportes públicos.

Começam a ser demasiados casos de tomada de posição, individual, em que os interesses das populações, e compromissos assumidos anteriormente na AMP, não são colocados em primeiro lugar. Muito recentemente, o Dr. Rui Moreira tomou a decisão de alterar o término de algumas carreiras intermunicipais, quando essa opção deveria passar sempre por ser debatida na AMP, a quem foi delegado pelos municípios o preparar e efetuar os contratos de serviço público de transporte de passageiros que deverão entrar em vigor até 31 dezembro de 2019 (no mínimo com os restantes municípios envolvidos).

Agora, está novamente o Dr. Rui Moreira, disposto a violar os anteriores compromissos assumidos com a AMP, e com o Conselho Metropolitano do Porto, e viola o estabelecido na Lei do OE2019 relativamente ao Programa de Apoio à Redução Tarifária dos Transportes públicos, não cumprindo com o despacho 1234-A/2019 de 31 de janeiro?

Mais parece uma “guerra de guerrilha”, entre as duas margens do Douro. Por um lado, Eduardo Vítor Rodrigues (preside ao Conselho Metropolitano do Porto), pelo outro, Rui Moreira (presidente da Câmara do Porto), mas com “tiques” de DDT (Dono Disto Tudo), no que aos transportes diz respeito.

Como anteriormente, aguardemos os recuos de Rui Moreira. Até dia 15 de março, dia em que o plano de aplicação das dotações do PART tem que ser remetido ao Fundo Ambiental. Pode e deve-o fazer.

Não havendo recuo, novas “batalhas” se aproximam, nomeadamente a dois níveis:

Primeiro, têm as populações o direito de protestar pela não aplicação do PART, tendo mesmo os passageiros do Porto e dos municípios vizinhos que viajam para o Porto o “justo” direito à indemnização pelos custos acrescidos e derivados da não aplicação da lei.

Segundo, terá que ser exigida responsabilidade pelo não cumprimento de uma lei que deriva do OE2019 e dos acordos assumidos anteriormente na AMP, assim como clarificar a utilização, ou não, das verbas atribuídas pelo Fundo ambiental no âmbito do PART.

Se todos os passageiros, ao adquirir os passes, pedirem a respetiva fatura com NIB, e depois se dirigirem aos serviços da Câmara Municipal do Porto, efetuarem a respetiva reclamação por incumprimento da lei e pedirem o reembolso, aí sim, haverá um conjunto de razões técnicas, para serem solucionadas pelas decisões de Rui Moreira (enquanto presidente da CMP).

Sobre o/a autor(a)

Regulador. Membro da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda e da concelhia de Valongo.
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