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O PSD entre a troika e o PS

Quem agradece as pretensões galvanizadoras de Montenegro é António Costa, que terá mais facilidade em ensaiar o discurso da bipolarização que justifica o pedido de maioria absoluta.

A candidatura de Montenegro expôs o vazio político em que se afunda o PSD. Quando a política falha aos partidos habituados ao poder, o que resta é a intriga que assegura o direito a disputar a próxima oportunidade. Trata-se sempre de estar no sítio certo à hora certa, são assim as regras do rotativismo partidário em Portugal.

A oposição é fraca, a linha política de Rio é incompreensível, e o seu estilo é o que é. Mas nem Rio é o principal problema do PSD, nem Montenegro a solução. Nas eleições de 2015 o PSD já valia menos 10pp que em 2011. Ainda assim, o resultado foi positivamente influenciado pelo mesmo aditivo com que a Direita contou nos anos de agressão e radicalismo liberal: o medo, cuidadosamente fabricado por quem culpou o povo pela crise e repetiu que a austeridade era a única redenção possível.

Era por isso óbvio que a estratégia do PSD não resistiria à demonstração de que, em democracia, há sempre alternativas possíveis. Passos ainda tentou, imbuído de um negacionismo alienado, clamar que o Governo lhe pertencia, mesmo não sendo maioria. Ameaçou e amaldiçoou o país que se atrevia a desprezar o sacrifício pessoal com que tinha sido sacrificado. Mas nada parecia funcionar. Já então a oposição era fraca, a linha política incompreensível, e o estilo de Passos era o que era. Não foi preciso um Rui Rio para a derrota nas autárquicas. Foi o medo que se foi, e com ele o que restava do PSD.

Montenegro não tem mais nada para acrescentar a este vazio. Não tem uma ideia que escape à banalidade, só conhece a política da austeridade, e não vai ser o que não foi. Diz ter chegado para "galvanizar os portugueses", mas em torno de quê? Já sabíamos, quando afirmou que "a vida das pessoas não está melhor, mas o país está muito melhor", que o ex-líder parlamentar de Passos tem alguma dificuldade em identificar sujeitos coletivos abstratos e ler as suas aspirações. Os únicos portugueses que parecem poder ser galvanizados por Montenegro encontraram-se em Belém, para um congresso de inconformados saudosistas da troika, animados pelo sucesso eleitoral das direitas por esse Mundo fora.

Quem agradece as pretensões galvanizadoras de Montenegro é António Costa, que terá mais facilidade em ensaiar o discurso da bipolarização que justifica o pedido de maioria absoluta. No vazio da política, é aqui mesmo que se encontra o PSD, entre o regresso à troika e uma maioria absoluta do PS. Um tem de voltar a ser o que era para que o outro possa ser o que sempre foi. São assim as regras do rotativismo partidário em Portugal.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 15 de janeiro de 2019

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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