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E assim vai a nossa saúde…

À privatização crescente, impõe-se contrapor uma prioridade: a revisão da atual Lei de Bases da Saúde, aprovada em 1990 com os votos favoráveis do PSD e CDS.

Em 28 de Setembro de 2017, a empresa “José de Mello Saúde” anunciou o propósito de adquirir “uma posição mínima de 80% e eventualmente a totalidade do capital social” da Clínica Particular de Coimbra, S.A..

Recorda-se que a José de Mello Saúde é a concessionária de exploração das Parcerias Público-privadas (PPP) do Hospital de Braga e do Hospital de Vila Franca de Xira, e de mais 16 hospitais ou clínicas privadas.

Em Março de 2017, o Grupo Idealtower vendeu a exploração da “Clínica Idealmed – Coimbra” à sociedade de capital de risco “Capital Criativo Health Care”, detentora de quatro clínicas na Região Centro, mantendo a posse do edifício da Idealmed.

Em comunicado à CMVM de 24 de Janeiro, o “Grupo Luz Saúde” (detido pelo Grupo Fosun International - capitais chineses), concessionário do contrato de exploração da PPP de Loures (para além de onze hospitais privados, dez clínicas privadas em regime de ambulatório e duas residências sénior) anunciou que irá passar a deter “70% do capital social da “Capital Health Care Investement II, S.A.”, no que “terá por contrapartida o pagamento de 35.000 euros”.

O Grupo Fosun International, recorda-se, já detém, em Portugal, a seguradora Fidelidade, a “Luz Saúde” e é o maior acionista do BCP) e, a partir de agora, passará a ser o dono da Idealmed.

Não podemos por isso deixar de concordar mais com as palavras da Eng.ª Isabel Vaz, CEO da Luz Saúde, aquando da inauguração do Hospital da Luz (Abril de 2007): “melhor que o negócio da saúde, só mesmo o da indústria do armamento.”

Remetendo-nos para Coimbra, não deixa de ser sugestivo que com a criação do CHUC e a decorrente desactivação parcial do Hospital dos Covões – com perda de camas de internamento, blocos operatórios, salas de consulta e encerramento nocturno da Urgência – tenhamos assistido à abertura da Clínica Particular, da Idealmed e ao crescimento da Sanfil. Diminuiu a capacidade de resposta do SNS e, como que funcionando em vasos comunicantes, aumentou a oferta e prestação de cuidados privados, muitas das vezes pagos por dinheiros públicos.

A esta privatização crescente - com o crescimento exponencial do complexo industrial de prestação de cuidados de saúde e o decorrente definhamento do SNS – impõe-se, contrapor uma prioridade: a revisão da actual Lei de Bases da Saúde, aprovada em 1990 com os votos favoráveis do PSD e CDS, e que prevê, na sua Base XXXVII:

O Estado APOIA o desenvolvimento do sector privado de prestação de cuidados de saúde em função das vantagens sociais decorrentes das iniciativas em causa e EM CONCORRÊNCIA com o sector público”.

Este será um primeiro mas decisivo passo para a inversão das actuais políticas que tendem a transformar a saúde dos portugueses num mero negócio e que nos conduzirá a uma refundação de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, conforme preceituado na Constituição.

Mas, para que esta iniciativa tenha o desfecho pretendido, importará que os cidadãos, em unidade, manifestem com veemência o seu propósito na defesa de uma das maiores conquistas da Democracia – O SNS.

Artigo publicado no diário “As Beiras”, 27 de janeiro de 2018

Sobre o/a autor(a)

Médico de Família
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