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É a falta de regras claras que coloca em causa o verdadeiro alojamento local

A captura de fogos de habitação para alojamento de turistas mais do que quadruplicou em território nacional.

A captura de fogos de habitação para alojamento de turistas mais do que quadruplicou em território nacional.

Os dados do Registo Nacional de Estabelecimentos de Alojamento Local (AL) são reveladores: nos últimos três anos foram registados 42.061 espaços de Alojamento Local em Portugal.

Em 2014 estavam licenciados 13.326 estabelecimentos. Passados 3 anos, esse número subiu para mais de 55.000.

O problema não está no crescimento de um setor de atividade ou no aumento do turismo e dos seus efeitos positivos na economia.

O verdadeiro drama é que esse crescimento sem regras esteja a contribuir para que o acesso à habitação seja cada vez mais difícil para cada vez mais pessoas, praticamente impossível em grandes centros urbanos, como Lisboa e Porto, com diminuição da oferta e aumento brutal do preço da habitação.

O Ivan mora há 7 anos na antiga freguesia de Stª Catarina. Há 4 anos, no prédio onde mora e no outro ao lado, havia 1 alojamento local. Convivia bem com a situação. Hoje há 13 unidades de alojamento local, que corresponderam a outros tantos despejos.

O ruido, o estacionamento, a limpeza da zona alteraram-se completamente, a qualidade de vida degradou-se e o aumento da renda e a ameaça de despejo surgiram. Vai ter de sair da cidade.

De forma predatória sobre as cidades, formaram-se empresas à volta do AL onde devia haver economia de partilha. Grupos hoteleiros compram prédios inteiros, promovem o despejo dos residentes e transformam-nos em empreendimentos turísticos com a designação de AL. Beneficiam da fiscalidade e da menor exigência de critérios de licenciamento e de serviços.

Não é a instabilidade legislativa (que nem existe), mas a liberalização do setor, a falta de regras claras, que coloca em causa o verdadeiro AL, o da família que arrenda o quarto ou casa temporariamente a visitantes ou a estudantes.

Desejamos turismo nas cidades, mas em primeiro lugar queremos cidades.

Propomos uma separação efetiva entre o que é Alojamento Local e o que é Empreendimento Turístico. A lei já o prevê. Porém, a liberalização do AL degradou a prática dessa distinção, como está evidente.

AL é temporário e em habitação própria. Empreendimento turístico é intensivo e permanente.

O impacto do turismo e do AL é diferenciado no território nacional. Por isso propomos a habilitação dos municípios para o licenciamento e definição de quotas para o AL por área geográfica.

Finalmente, propomos uma nova tipologia, a do Estabelecimento de Hospedagem, no âmbito do Empreendimento Turístico, que pode acolher algumas das iniciativas que actualmente são designadas por AL.

Propomos regulação do AL para que esta atividade subsista sem colocar em causa o direito à habitação, a vida nos bairros, os residentes mais velhos e os mais jovens que querem lá viver.

Este é apenas o início de um debate que o Bloco considera essencial para que, em sede de especialidade, seja encontrada a melhor solução para a regulação do AL.

Intervenção de apresentação do Projeto de Lei do Bloco de Esquerda que altera o regime jurídico da exploração dos estabelecimentos de alojamento local, Assembleia da República, 5 de janeiro de 2018.

Sobre o/a autor(a)

Docente universitário IGOT/CEG; dirigente da associação ambientalista URTICA. Dirigente do Bloco de Esquerda
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