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Rendas garantidas: 28 governantes passaram pela EDP

A esta longa lista de governantes - 16 do PS, 10 do PSD e 2 do CDS - a EDP junta ainda seletos quadros em áreas chave, como é o caso de Vital Moreira, que toma agora as dores das elétricas tendo sido, entre 2006 e 2009, membro do Conselho e Geral e de Supervisão da EDP.

Em 1991, à semelhança de muitos outros serviços estratégicos nacionais, a EDP teve o seu estatuto jurídico de Empresa Pública alterado para Sociedade Anónima. Estava dado o primeiro passo rumo à privatização de um serviço garantido pelo investimento público ao longo de décadas. Nesse ano, um jovem adjunto do Secretário de Estado do Comércio Externo acompanharia com atenção o processo, sem saber ainda o papel que desempenharia no futuro da elétrica portuguesa. O seu caminho até à administração da EDP passaria pelo Conselho de Administração do BES (1992-1998) e da GALP (2000-2004), assim como por uma breve mas importante incursão como Ministro das Obras Públicas, Transporte e Comunicações no governo de Santana Lopes. Terminado o mandato deste cargo público, António Mexia estava preparado para comandar os destinos milionários da elétrica, constituindo o exemplo mais conhecido das portas giratórias entre o poder político e económico abertas pela EDP, mas longe de ser caso único.

Só nos governos de Cavaco Silva (1985-1995) é possível identificar mais sete membros que viriam a ser cooptados pela EDP, além de um Ministro e um Secretário de Estado da Indústria e Energia que passaram da EDP para o governo: Luís Mira Amaral (1987-1995) e Nuno Ribeiro da Silva (1987-1991). Ao segundo Secretário de Estado da Energia, Luís Filipe Pereira (1991-1995), que seria indicado pelos Mello ao Conselho de Administração em 2002 e ao Conselho Geral e de Supervisão em 2011, juntaram-se também na EDP: Vítor Martins, Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (1985-1995) e administrador (2003-2004); Jorge Braga de Macedo, Ministro das Finanças (1991-1993) e membro do Conselho Geral e de Supervisão (2012-2017); Faria de Oliveira, Secretário de Estado das Finanças (1989-1990) e membro do Conselho Geral e de Supervisão (2008-2011); Oliveira Godinho, Secretário de Estado das Pescas (1985-1991) e administrador (1998-2008); José Pedro Sucena, Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia e administrador (2004); Eduardo Catroga, Ministro das Finanças (1993-1995), homem de confiança dos Mello, membro do Conselho Geral e de Supervisão (2006-2010) e Chairman (2012-2017).

Todos estes foram governantes antes da privatização, que haveria de chegar pela mão do governo de António Guterres. Em 1997, o Partido Socialista apresenta ao país a privatização de 30% da EDP utilizando a  retórica de um “capitalismo popular” e da “manutenção dos centros de decisão nacionais”:  800 mil compradores, ou 8% da população portuguesa, com os bancos a emprestar dinheiro a centenas de milhares de cidadãos. A verdade é que rapidamente estas ações foram parar às mãos dos grandes grupos que beneficiaram também das fases seguintes de privatização, como os Mello e o BCP. Outro ganhador neste processo seria a Iberdrola, primeiro grupo estrangeiro a comprar diretamente parte das ações e que mais tarde cooptaria o ministro Pina Moura para a sua administração.

O resultado destes governos socialistas (1995-2002) foram mais nove governantes com ligações à EDP: Mário Cristina de Sousa, Ministro da Economia (2000-2001), Eduardo Oliveira Fernandes, Secretário de Estado da Energia e Inovação (2001-2002) e José Penedos, Secretário de Estado da Defesa (1997-1999) vieram da EDP para o governo; João Nascimento Batista, Secretário de Estado da Cultura (2000-2002), foi depois diretor da EDP; Diogo Lacerda Machado, Secretário de Estado da Justiça (1999-2002) ocupou o Conselho geral e de Supervisão (2006-2012); Emílio Pereira Rosa, Secretário de Estado e depois administrador; Luís Braga da Cruz, Ministro da Economia (2001-2002) e futuro consultor (2005-2010); António Nogueira Leite, Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (1999-2000) e administrador da EDP Renováveis (2008-2012); António Vitorino, Ministro da Presidência (1995-1997) e consultor jurídico da EDP.       

Nos anos seguintes, o governo de PSD-CDS continuou este processo, cabendo ao governo de José Sócrates juntar uma nova fase de privatização da EDP à entrega da REN aos privados, valendo uma nova fornada de governantes, com Celeste Cardona, Ministra da Justiça do CDS (2002-2004) a assumir o lugar no Conselho Geral e de Supervisão da EDP (2012), Rui Pena, Ministro da Defesa Nacional (2001-2002) no Conselho Geral (2007) e o já conhecido caso de António Mexia. Com os anos de chumbo da austeridade, mais do que os milhões e o reconforto de cumprir uma das missivas da troika, a venda de 21% da EDP que permaneciam na posse do Estado concluiu um processo histórico. Abandonado o discurso dos “centros de decisão nacional”, Carlos Moedas e Eduardo Catroga lideraram as negociações com a troika, ditando a venda restante e carimbando a promoção do segundo a chairman da nova EDP entregue ao capital chinês.

A esta longa lista de governantes - 16 do PS, 10 do PSD e 2 do CDS - a EDP junta ainda seletos quadros em áreas chave, como é o caso de Vital Moreira, que toma agora as dores das elétricas tendo sido, entre 2006 e 2009, membro do Conselho e Geral e de Supervisão da EDP ou de Vítor Constâncio, quadro estrutural do Banco de Portugal e administrador não executivo da elétrica entre 1995 e 1999. Um poder implacável na manutenção das rendas garantidas no sector, fazendo curvar todo um governo em menos de 48 horas, como ficou patente no caso da contribuição das renováveis acordada com o Bloco de Esquerda. Uma contribuição justa, que permitiria reduzir os custos energéticos das famílias que em Portugal pagam sobremaneira o seu acesso a este serviço essencial.

Sobre o/a autor(a)

Sociólogo, dirigente do Bloco de Esquerda e ativista contra a precariedade.
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