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O silêncio dos indecentes
A memória fica anotada e não é renovável. Após dois anos, a primeira emboscada à Geringonça não aparece pela mão das linhas vermelhas do Bloco de Esquerda ou das ortodoxias do PCP: a primeira traição surge pelos interesses instalados no PS. Após um fim-de-semana seguramente eléctrico, o PS usou do silêncio dos indecentes e coloca-se na casa de partida para a posição "boomerang". O acordo com o Bloco de Esquerda, negociado, estabelecido e votado favoravelmente em especialidade na passada sexta, foi avocado pelo PS no plenário de segunda para que a votação fosse repetida, possibilitando a alteração do sentido de voto e dando o dito por não aprovado, sem qualquer justificação senão a cedência obscena aos interesses instalados no sector energético.
A conta, essa, sai dos bolsos dos portugueses que, perante o flic flac socialista, deixam de poder poupar 250 dos 400 milhões de euros que, por razões de conveniência, pagamos escandalosamente a mais para as renováveis. Condenados à mais alta factura de electricidade da Europa. Amarrados contra um poste, este é o momento de mais alta tensão na coligação parlamentar e - contrariamente aos especialistas de futurologia do ex-arco da governação e dos bloqueios centrais - é provocado pela falta de capacidade, compromisso e honra de um PS amarrado a um poste, como refém. Muito se diria do Bloco de Esquerda e do PCP se fossem estes a mudar de opinião após um fim-de-semana eléctrico.
Dividido mas obediente, o que dirá o PS de si mesmo? Poucas são as vozes que contrariam o revisionismo. Ana Gomes, deputada europeia, declara que também votaria a favor da proposta do Bloco de Esquerda, manifestando o desapontamento. Ascenso Simões, deputado socialista, vota a favor ao arrepio da bancada socialista. E tanto silêncio. Alguém poderá explicar o porquê da EDP Renováveis ter apenas 12% da sua actividade em Portugal enquanto aqui obtém 27% dos seus lucros? É defensável que a energia seja vendida noutros países pela mesma empresa a preço não subsidiado, colocando a nossa tarifa a preços irrazoáveis e sobrecarregando a dívida tarifária das famílias e empresas? Como pode o PS, à semelhança do PSD (que se absteve) e do CDS (que também votou contra), correr na contramão em 48 horas, boicotando a mais do que evidente necessidade de correcção e ajuste às rendas excessivas das eléctricas portuguesas? Tomai, todos, e bebei: esta é parte da factura da privatização da EDP, derramada por nós.
Depois de todas as bancadas terem cedido tempo para o PS explicar a cambalhota, a explicação surge arrancada a ferros ao deputado Luís Testa: "é necessário prosseguir o cenário de cooperação com estas empresas". Tão-só, um cenário de cooperação. Desenganem-se os crentes na conversão: há um PS dos interesses que nunca apaga a luz. Nem dorme no fim de semana.
Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 29 de novembro de 2017
Comments
Com esta cambalhota o PS
Com esta cambalhota o PS traiu o BE e tornou a geringonça descartável...
Miguel, este é o país que
Miguel, este é o país que temos, amigos dos e presos aos lobis. Escandalosamente, mas em silêncio, para não levantar a poeira e assim o povo não sentir.
Amarrados às facturas de energia, regados com o preço dos combustíveis, e rodeados de amizades que não servem mais do que sacar para eles em favor daqueles que estão acima do povo. Sim, porque para eles somos apenas "o povo".
Lamentavelmente agora foi com a geringonça. Ontem foi com o governo da direita e amanhã se verá.
Quando pensamos que podemos progredir e dar um passo em frente, olhamos e vemos que cada vez mais estamos atrás. Mas deveríamos saber que seria assim mais tarde ou mais cedo. Lembro-me perfeitamente da subvenção vitalícia que o amigo Costa deixou passar de fininho a mando do então deputado José Lello, enquanto o resta da esquerda disse que não. Sem ondas, sem levantar de novo muita poeira.
Estejamos atentos, porque quem não há duas sem três. Devemos serrar o punho e dar o murro na mesa. Fazer tremer este fantoche ligado ao poder dos lobis, porque sim. Temos a faca e o queijo na mão. E um abanão de vez em quando para meter medo a esta corja de amigos que tomaram conta da economia em Portugal é necessário.
Miguel Guedes e Nuno Pacheco,
Miguel Guedes e Nuno Pacheco, deixem-me ver vos entendo. O PS as ordens de Costa da o dito por não dito e ajoelha perante as ordens da oligarquia capitalista. E com isso põe as famílias portuguesas a pagar a electricidade mais cara e muito mais cara em paridade do poder de compra. Os camaradas falam da traição e das trafulhices de Costa para encobrir os favores ao capital e a defesa dos interesses corporativos.
Mas continuam a afirmar que a Geringonça é para manter. É como aquele tipo que a mulher põe os cornos as segundas, quartas e sextas e as terças quintas e sábados sai com as amigas, mas ele não se separa só para dizer que é casado com ela. O que a ela aprecia pois assim faz o que quer e tem cama, comida e roupa lavada e faz a vida que quer. Deixem-me perguntar : mandamos os princípios as ortigas em nome de que? Das reversões? Mas não percebemos todos que as reversões e os aumentos de miséria das pensões são pagos pelos aumentos dos impostos indiretos, pela degradação do serviço público? Pela redução dramática do investimento do Estado? Qualquer dia não distante o Estado são só funcionários que nem papel tem. Sabem quantos pessoas morreram por não terem sido operadas no tempos definidos pela OMS? As listas de espera para consultas que são” limpas” diria eu na cara dos deputados do Boco e do PC , para parecer que não estão a aumentar tanto . Há linhas vermelhas ou a dignidade já se troca por “estar no palco” a fazer de conta que se temi muito papel, quando o “papel” é dar cobertura a destruição dos Estado social? Expliquem por favor.
Lembro-me quando a troika, o
Lembro-me quando a troika, o Passos e o Portas deram a EDP aos chineses, enquanto punham o povo no desemprego a passar fome e os velhotes a sofrer em casa por não terem como pagar as taxas dos hospitais. Nessa altura o Pernes aplaudia satisfeito... Agora queixa-se de ter sido encornado pelo povo que despediu o governo da PAF no parlamento e chora lágrimas de crocodilo. A pena que eu tenho destes Pernes...
Miguel Pernes
Miguel Pernes
Obviamente que é para manter. Todos nós vemos e sentimos o que se tem feito ao longo destes 2 anos de governação. Não sou radical para pensar e requerer que este volte-face relativamente a energia faça cair o governo. Se tiver de amputar uma mão para manter o braço, não tenha dúvidas que o farei.
O que está aqui em causa são os lobis de um partido que com o apoio do Bloco governa Portugal. Sinto-me "traído". Tenho de me sentir. Sou parte do tal "povo" que todos os meses paga a factura de electricidade a uma taxa desigual e desumana relativamente aos outros países da Europa. Votei, e tenho o direito e a obrigação de me sentir traído. Mas não sou radical ao ponto de querer a cabeça do governo por este triste episódio. Mas também considero que devemos sim dar um murro ao PS. De que forma? Existem tantas, e é no Parlamento que esse mesmo murro deverá ser dado. Todos os dias, todas as semanas.
Estes últimos anos de governação de direita levou tudo ao povo. Acima de tudo racionalidade. Foram vidas rasgadas, empresas fechadas, milhares de pessoas que ficaram sem rendimentos e sem poder ir a um tratamento digno de um ser humano, sob o lema da austeridade. Politicas que deixaram o pais sem um rumo definido. E sempre de mão dada com os lobies. Basta ver os lucros descomunais que a Galp, EDP e afins tiveram quando o tal "povo", (onde obviamente me incluo e onde orgulhosamente me sinto) cada vez definhou mais e mais.
Num país onde somos 10 milhões, ter perto de 1,5 em pobreza ou no limiar da pobreza, dá-me náuseas...
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