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O negócio de alugar pessoas
O trabalho temporário institui uma relação triangular entre o trabalhador, a empresa utilizadora e a empresa de trabalho temporário: as empresas utilizadoras do trabalho temporário externalizam os seus deveres quanto aos funcionários, as empresas de trabalho temporário operam como intermediário acumulando lucros milionários com a precarização dos trabalhadores. A parte mais fraca desta relação tripartida, os trabalhadores/as, perdem direitos e salário.
Tanto se tem falado, nesta casa [Assembleia da República], da necessidade de modernização e inovação na área laboral, mas estamos a falar de uma realidade que se baseia no negócio de alugar pessoas, tão típico de outros tempos que não deixam saudade. Logo deveria ser absolutamente inaceitável!
No entanto, temos assistido no nosso país a uma banalização de um modelo de contratação perverso, que isenta entidades empregadoras (neste caso utilizadoras) de responsabilidades e pagamentos, escudando-se num intermediário cuja única fonte de rendimento é ficar com parte do salário devido ao trabalhador!
Há, por isso, vários dados que devem merecer a nossa atenção e ilustram a realidade do problema:
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Em Portugal existem cerca de 250 empresas de trabalho temporário licenciadas, número que tem vindo a aumentar rapidamente na última década;
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Segundo o livro verde sobre as relações laborais, “os contratos não permanentes no tempo assumiram proporções historicamente elevadas – em 2014, mais de 30% dos trabalhadores” estavam nessa situação;
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Também se pôde apurar, a partir dos dados do Fundo de Compensação do Trabalho, que 82% dos contratos de trabalho iniciados em 2014 e 2015 são não permanentes.
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Este dados estão em linha com as tendências preconizadas pelo estudo publicado pelo Observatório sobre Crises e Alternativas: quando se trata do salário de contratos não permanentes, estes tiveram um ligeiro aumento (fruto do aumento do salário mínimo nacional), mas a média salarial é de 603 euros. É um valor francamente baixo e, pior, está a fazer baixar todos os outros salários, mesmo os de contratos permanentes (que passaram de uma média de 1024€ para 809€, em menos de 3 anos).
Estes dados indicam que é preciso uma solução, tanto mais que é uma situação que afeta particularmente os mais jovens, levantando problemas de sustentabilidade do modelo laboral do futuro. No entanto, há que ter em conta que o problema está hoje disseminado por vários setores e faixas etárias: da limpeza às vendas, do apoio ao cliente ao jornalismo, das grandes superfícies aos call centers, nenhum setor é hoje imune!
No nosso país, um mecanismo que deveria ser de absoluta exceção passou a ser regra! Além do mais, as medidas de embaratecimento do despedimento e o ataque à contratação coletiva do anterior governo da direita vieram agravar a situação dos trabalhadores e trabalhadoras!
É um problema real, que pede soluções concretas. É o que o Bloco de Esquerda traz hoje a debate, soluções concretas e não debates sem consequência prática!
O caminho percorrido no último ano e meio tem demonstrado que uma política de reposição de rendimentos ajuda a economia e a vida das pessoas. Mas também tem demonstrado que os grandes impedimentos estão na legislação laboral. Por isso é preciso aprofundar um caminho de proteção dos trabalhadores relativamente ao abuso em que o trabalho temporário de transformou.
Propomos, por isso, restrições temporais à utilização de contratos temporários, bem como à possibilidade da sua renovação por tempo indeterminado, aumentando, por outro lado, a salvaguarda de acesso a toda a informação ao trabalhador e delimitando mais o âmbito em que o trabalho temporário pode ser utilizado, fazendo, assim, respeitar o espírito com que o trabalho temporário foi legislado: para corresponder a uma exceção!
Recusamos que o futuro do mundo do trabalho seja construído à base de precariedade, baixos salários e intermediários que lucram com parte do salário dos trabalhadores.
O Bloco de Esquerda continua a bater-se por condições de trabalho dignas e contratos de trabalho com direitos. E é no parlamento que temos que responder a estas questões, pois é aqui que respondemos perante o mandato do povo, que num cenário de melhorias económicas, ainda não teve a sua correspondência nos direitos laborais!
Hoje tratamos de justiça para quem trabalha e tratamos de acabar com os abusos perpetrados no trabalho temporário. Que não nos falte a coragem para a aprovação destas medidas, sob risco de contribuirmos para o abuso e não para a solução necessária: direitos para quem trabalha!
Apresentação do Projeto de Lei n.º 554/XIII/2.ª do Bloco de Esquerda, que restringe o recurso ao trabalho temporário e combate o falso trabalho temporário – Assembleia da República 12 de junho de 2017
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