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Um metro para cada eleitor e já

22-novas estações de Metro-22. O mapinha que Assunção Cristas exibiu no debate parlamentar com o primeiro-ministro é um dos factos mais significativos da semana [passada] e por várias razões que, todas, enfraquecem a ideia e talvez até a condenem ao pior dos destinos, ser ridicularizada.

Mas começo pelo que me parece normal no debate político: a apresentação de planos de médio e longo prazo quanto aos investimentos públicos e à rede de infraestruturas é imperativo. Melhora o debate e evita que se isolem as escolhas de curto prazo. Portanto, se um governo, ou um partido, ou uma outra associação, ou técnicos, ou quem seja, apresentam um plano para o Metro, essa ideia deve ser levada a sério.

Planos Metro Lisboa
Planos Metro de Lisboa

Ora, não é isso que tem acontecido em Portugal: Sócrates apresentou um plano de 28 novas estações nas vésperas das eleições de 2009 e Cristas retoma este plano, numa versão de 22 estações, nas vésperas das eleições autárquicas. Portanto, faz o pior serviço a este debate necessário: intoxica-o com o truque eleitoral. Não foi quando era ministra das cidades que Cristas propôs soluções; não foi quando estava no governo que procurou financiamento para a proposta; foi quando se candidata à Câmara que cuidou do mapinha e alguém que pague a conta.

Fugiu assim do debate técnico e político mais difícil: deve haver um plano que concentra agora tantos recursos públicos só em Lisboa (2,2 a 3 mil milhões de euros até 2030), ignorando as outras cidades? Uma candidata a Lisboa pode até achar-se com via verde para ignorar o assunto, mas quem o trate com seriedade não pode – e portanto quem se candidata a Lisboa também não deve.

Em Lisboa, a degradação do Metro é certamente uma questão essencial e merece um debate eleitoral que busque soluções. A curto prazo: o governo comprometeu-se em contratar mais 60 maquinistas até final do ano passado e nada. Experimente usar o Metro e percebe o problema. E a longo prazo: fazer o Metro como rede densa na cidade e como acesso metropolitano é uma estratégia certa, desde que faça parte de prioridades respondendo a todo o país.

Cristas tinha ainda por cima uma hipótese de brilhar: o governo tinha acabado de anunciar quatro estações e, correção meia hora depois, afinal eram só duas por que não tem financiamento para mais. Não é costume haver este improviso e esta leviandade na apresentação de propostas governamentais.

Portanto, lá apareceu o mapinha no debate parlamentar. Mas sem dinheiro, sem prazos, sem fundamentar a decisão, a ação eleitoralista condena-se ao enxovalho. Fica o facto político. Que é este, na minha opinião: com sondagens muito difíceis e nomeadamente as que a põem em quinto lugar em Lisboa, mesmo sendo a candidata que está em campanha há mais tempo e sendo líder de partido, Cristas mostra exasperação, que é o pior dos conselheiros.

Correio da Manhã
Correio da Manhã

Leia o Correio da Manhã, que oferece semanalmente a Cristas uma página de publicidade eleitoral e perceberá a que ponto chega esta exasperação. No exemplo cuja imagem anexo, Cristas usa esta página para publicar nada menos do que três fotos de si própria, para explicar que leu 15 mil mails, fez tantos colóquios, 108 reuniões, que “é bom comprar nos mercados” e lá está a foto dela na banca de fruta, faz convites para a Semana Santa da Páscoa e explica que “por todo o mundo vivemos a paixão e ressurreição de Cristo, num convite permanente à conversão e à oração”, protesta contra não haver mais IRS devolvido às famílias que têm filhos, tudo sob o lema de “Lisboa menina e moça”, tudo num Correio da Manhã próximo de si, na próxima semana há mais.

Não me espantaria que, depois do mapinha, seja em Fátima a próxima iniciativa eleitoral de Cristas. Até adivinho que a sua página no Correio da Manhã me mostrará as fotos na próxima semana.

Artigo publicado em blogues.publico.pt a 12 de maio de 2017

Sobre o/a autor(a)

Professor universitário. Ativista do Bloco de Esquerda.
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