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Venda ruinosa do Novo Banco
Neste dossier, respondemos às principais peguntas sobre o negócio da venda do Novo Banco e fazemos a cronologia do processo desde a resolução do BES. Francisco Louçã apresenta o novo dono do banco e José Gusmão explica por que este negócio não é o mal menor. Publicamos a intervenção de Mariana Mortágua na AR em defesa da nacionalização e o ponto da situação feito por Cristina Semblano no que toca aos emigrantes lesados do BES, ainda sem solução à vista. Por fim, recordamos a lista dos 20 maiores devedores ao banco após a resolução do BES.
O anúncio da venda do Novo Banco ao fundo financeiro Lone Star foi o mais recente passo de um processo que correu mal desde o início, sob a liderança do governo PSD/CDS e do governador do Banco de Portugal, reconduzido no cargo em maio de 2015, apesar de todas as falhas de supervisão apontadas no colapso do BES.
Uma resolução decidida por SMS
Com o processo de resolução do BES imposto pelo BCE e por Bruxelas, deu-se a separação do “banco bom” e do “banco mau”. Sabe-se agora que o assunto - tal como os problemas do setor financeiro em geral - nunca foi tema de discussão no Conselho de Ministros. A atual líder do CDS e então ministra confessou que aprovou a resolução do BES quando estava de férias e recebeu um telefonema de Maria Luís Albuquerque.
“Como pode imaginar, de férias e à distância e sem conhecer os dossiês, a única coisa que podemos fazer é confiar e dizer: ‘Sim senhora, somos solidários, isso é para fazer, damos o OK’. Mas não houve discussão nem pensámos em alternativas possíveis — isto é o melhor ou não —, houve confiança no Banco de Portugal, que tomou uma determinada decisão”, declarou Assunção Cristas em entrevista ao Público. O próprio primeiro-ministro de então recusou-se a interromper as suas férias no momento da resolução do BES, comentando o assunto nas televisões perto da praia que frequentava e endossando toda a responsabilidade em Carlos Costa.
Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque garantiram na altura que a solução não traria custos aos contribuintes, sugerindo que os 3900 milhões injetados no Novo Banco pelo Fundo de Resolução, com garantia pública, seriam recuperados quando o banco fosse vendido.
Mas cedo se verificou que as potenciais ofertas pelo Novo Banco nunca chegariam perto daquele valor. O interesse pelo negócio por parte da maioria dos primeiros candidatos rapidamente desapareceu. Em vésperas de eleições, o governo PSD/CDS e o governador do Banco de Portugal optaram por congelar o processo. A seguir às eleições, o governo em gestão colocou o secretário de Estado responsável pelas privatizações, Sérgio Monteiro, no recém-criado lugar de responsável pela venda do Novo Banco.
Entretanto, a dívida do Fundo de Resolução ao Estado foi restruturada, com as maturidades a prolongarem-se por décadas e a um juro inferior ao do financiamento da República. As contribuições da banca para o Fundo acabam por ser semelhantes às que já existiam antes da resolução do BES, com a diferença a ser suportada pelos contribuintes.
Venda ao Lone Star implica mais perdas para os contribuintes através das garantias ao Fundo de resolução
A mudança de governo de outubro de 2015 ocorreu num quadro de polarização política, com a direita a acusar a maioria do parlamento de lhe ter retirado o direito a governar em minoria. No entanto, o bloco central depressa se repôs quando chegaram as ordens de Bruxelas e Frankfurt para o sistema financeiro português. A oferta do Banif ao Santander, patrocinada pela Comissão e pelo Banco Central Europeu, foi viabilizada com os votos do PSD no parlamento.
No caso do Novo Banco, a situação parece repetir-se, embora não tenha existido sequer um banco a aparecer na lista final de interessados. Os contornos do negócio com o fundo Lone Star, que recebe 75% do banco de graça, obrigam-no apenas a capitalizá-lo e deixam para o Estado, através das garantias ao Fundo de Resolução, a responsabilidade por 80% dos encargos decorrentes de imparidades e processos judiciais. O limite de garantias públicas previsto no acordo de venda vai até aos 3890 milhões de euros em perdas com créditos duvidosos que se reflitam nos rácios de capital do banco.
O governo insiste que a única alternativa à venda seria a liquidação e recusa fazer o braço de ferro com Bruxelas e o BCE para manter o banco na esfera pública, assumindo o encargo imediato da recapitalização, e conta com o apoio do PSD para evitar a nacionalização do Novo Banco.
A fase que se segue ainda não afasta a perspetiva de novo fracasso negocial, caso falhe a necessária troca de obrigações no valor de 500 milhões de euros, de adesão voluntária por parte dos investidores. Por outro lado, os processos interpostos pelos gigantes dos fundos de investimento contra a passagem das suas obrigações para o “banco mau” também pretendem travar a concretização da venda do banco. Por último, continua sem fim à vista a situação difícil de milhares de emigrantes que não foram abrangidos pelos acordos de compensação dos lesados dos produtos financeiros tóxicos vendidos aos balcões do BES.
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