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Trump e o estado de negação

Na sua primeira entrevista, Trump reafirmou a vontade de construir muros e deportar milhões de imigrantes. Parecem cair por terra as ilusões em que "talvez as coisas não corram tão mal como se espera".

Para além de tudo o resto, o que está em causa é a legitimação da agressão racista, xenófoba e sexista dentro e fora dos EUA. Um homem apoiado pelo Ku Klux Klan ocupa a Casa Branca. Sim, as coisas vão correr muito mal.

Como pode um país que reelegeu Obama ter eleito agora Trump?

O que se manifesta nos EUA, como na Europa, é o descontentamento popular com um sistema que prometeu muito mas entregou muito pouco. Para a maioria, o emprego é instável e os salários precários. Para uma minoria, os salários são milionários e os impostos uma brincadeira. Para uma maioria, o risco de perder a casa para o banco é real. Para os bancos, houve desregulamentação e benevolência. As multinacionais, sem rédeas, exploram o trabalho onde for mais barato e determinam as políticas económicas na sombra dos regimes democráticos. É desta desilusão que se alimenta a política de ódio da extrema-direita.

Na eleição, Hillary Clinton representou os consensos deste regime de injustiça - e por isso perdeu. O pré-candidato Bernie Sanders, apesar de vir do mesmo partido que Clinton, assustou as elites ao defender uma alternativa ao regime neoliberal, uma alternativa de reforço do Estado social. Os interesses falaram mais alto e Hillary foi escolhida.

Perante isto quem continua colado ao velho regime explica o presente com uma só palavra: "populista". Querem que a etiqueta cole em combate o racismo e quem o pratica, quem discrimina e quem quer mais direitos, quem protege o Estado social e quem o destrói. Quem tenta colar à Esquerda a etiqueta "populista" que cola em Donald Trump, só insiste no caminho do desastre. Não tem superioridade moral quem fez uma economia imoral e nunca respondeu pelo mal financeiro contra a vida de milhões de seres humanos.

A Esquerda não precisou de ver um Trump para propor respostas à ganância financeira, às desigualdades e às guerras que fizeram o caos. Essa diferença continua. Deste tempo, em vez do ódio, pode sair a esperança.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” em 15 de novembro de 2016

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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