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Quem semeia ventos, colhe Trumps!

A receita é simples e antiga: um discurso de ódio, populista e demagógico, que direcione o descontentamento da população para lhes conquistar o voto.

Mas a receita, apesar de não ser nova, está a ganhar eleições e a dar corpo a uma gigantesca viragem conservadora.

Ainda recentemente tínhamos visto isso mesmo no Brexit, com uma campanha baseada no ataque aos imigrantes e em promessas irrealistas. Agora, do outro lado do oceano, no epicentro da globalização e maior potência mundial, assistimos à reprise do filme.

Os povos estão descontentes com a globalização, com o dumping dos direitos laborais e rendimentos, com o desemprego brutal, com dirigentes políticos corruptos e aldrabões, com economias que continuam a servir a especulação à custa do empobrecimento generalizado. Genericamente é isto que é identificado como sendo o “sistema”.

Ora aqui reside a vantagem e o logro de Trump: um candidato que se apresenta como sendo contra o “sistema” e que bateu o “sistema”. Com um discurso de outsider conseguiu juntar os vários descontentamentos e aproveitar o descrédito generalizado da elite política, com a cereja no topo do bolo de ter como grande adversária direta a personificação do establishment, do tal “sistema”. As vantagens estão identificadas, o enorme logro está na definição do tal “sistema”.

O “sistema” que cria descontentamento tem um nome: capitalismo. E é esse mesmo sistema que Trump defende. Ele não é um candidato contra o capitalismo, ele é o garante da perpetuação capitalista, lambendo as suas feridas e desviando os seus efeitos com os ataques aos imigrantes, aos direitos individuais, às liberdades, às mulheres. Não conseguirá travar ou responder ao descontentamento popular existente e nisso reside a esperança à esquerda.

Por isso se percebe como era possível vencer Trump, tal como é possível vencer a onda conservadora. Bernie Sanders demonstrou que tinha uma mensagem política mobilizadora capaz de bater Trump e só não o conseguiu por jogadas de bastidores no Partido Democrata.

O descontentamento popular com o sistema capitalista é o campo de luta da política na atualidade. O desafio à esquerda é o de tomar a liderança nessa luta e não deixar esse campo aberto à extrema-direita. Estamos à altura desse desafio e desse confronto ao capitalismo.

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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