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Impostos e isenções...

Se todos, sem exceção, beneficiam da aplicação dos fundos públicos, faz sentido que alguns estejam isentos das contribuições fiscais?

O Estado, enquanto tal, necessita de recursos financeiros para desenvolver e operacionalizar as suas funções e obrigações. O modo de arrecadar essa receita é diversificado. Tem a via fiscal (impostos, taxas, contribuições, multas, emolumentos, contraordenações, licenças); emissão de dívida pública (certificados de aforro, obrigações do tesouro e produtos afins); transferências da União Europeia (comparticipação europeia num conjunto alargado de projetos de investimento em diversas áreas); donativos de particulares e empresas; empréstimos obtidos junto da Banca nacional ou estrangeira. Um primeiro aspeto que importa salientar, é que neste leque diversificado de fontes de financiamento, a predominância deverá ser da via fiscal, sob pena de o Estado estar sempre dependente da “boa vontade” dos credores e beneméritos investidores.

Os recursos financeiros são posteriormente aplicados nas funções sociais do Estado (Saúde, Segurança Social, Educação, Segurança Pública, Defesa Nacional, Infraestruturas de comunicações, Habitação, investimento e apoio público às empresas, etc.).

Nesta aplicação, todos os contribuintes, sejam eles as famílias, as empresas, as IPSS, as ONG, Associações, a Igreja, os Partidos Políticos, beneficiam direta ou indiretamente delas, senão vejamos: as famílias beneficiam por exemplo das escolas e hospitais; as empresas beneficiam das vias de comunicação ferroviárias e rodoviárias bem como das infraestruturas aeroportuárias e portuárias para escoamento e transporte dos seus produtos. As restantes organizações beneficiam também desta aplicação pública dos recursos, seja diretamente, ou indiretamente através do usufruto de todas as infraestruturas criadas pelo Estado.

Ora bem, desta constatação, uma primeira questão se coloca: se todos, sem exceção, beneficiam da aplicação dos fundos públicos, faz sentido que alguns estejam isentos das contribuições fiscais? Os defensores das isenções argumentam com a importância social de algumas entidades, como sejam a Igreja e as IPSS ou, no caso dos partidos políticos, com o facto de serem pilares da democracia.

Bem, sobre esta lógica argumentativa, tenho a dizer que então, neste pressuposto, todos os contribuintes deveriam estar isentos, senão vejamos: as empresas privadas disponibilizam bens, produtos e serviços úteis à sociedade e cidadãos. Só assim conseguem manter a sua rentabilidade. Se aquilo que vendem deixar de ter procura, isto é, deixar de ser útil, as empresas acabarão por encerrar. Portanto, isto significa que, enquanto existem e laboram, as empresas estão a ser úteis à sociedade. No entanto, esta utilidade não é razão para deixarem de pagar impostos. O mesmo pode-se dizer sobre os cidadãos e famílias. Todos nós precisamos do desempenho funcional das diversas profissões existentes. Todas elas, no seu conjunto, contribuem para o nosso bem-estar coletivo e qualidade de vida generalizada. No entanto, mais uma vez, as famílias e os cidadãos não estão isentos de cumprir com o pagamento de impostos. Portanto, cai por terra o argumento da importância e papel social desempenhado por alguns tipos de contribuintes como justificação para a isenção fiscal. Assim, se todos são importantes e todos beneficiam, não faz sentido a existência de isenções fiscais só para alguns. As mesmas a existir só devem ser atribuídas por uma questão de impossibilidade efetiva e real de pagamento.

Posto isto, passamos a uma segunda questão: não devendo ninguém estar isento (excecionando quem não tem rendimentos nem património que permita pagar), como deve ser exigida a contribuição fiscal? Quais os critérios de arrecadação? O mais justo, parece ser o da capacidade contributiva, isto é, exigir mais a quem mais tem. Os opositores a este critério advogam que quem fruto do seu trabalho criou riqueza pessoal não deve ser penalizado. Esta lógica argumentativa parte de um pressuposto falacioso: tributar a riqueza não é um castigo, mas sim uma forma justa de desonerar quem menos tem e consequentemente menos pode pagar, em prol da arrecadação adequada de recursos. Eticamente é errado incutir o princípio de que a tributação à riqueza criada e acumulada constitui um castigo para quem produz e poupa. A ser verdade este argumento, então os contribuintes mais ricos deveriam ter a hombridade de abdicar do usufruto gratuito de todos os bens e serviços públicos disponibilizados pelo Estado, passando a pagar por eles todos na justa medida do seu real valor. Se acham que é imoral verem a sua riqueza criada e gerada com trabalho honesto ser superiormente tributada, com certeza também não se sentirão confortáveis em usufruir de recursos públicos alimentados em grande maioria por quem menos tem, correto? A ética e a justiça, para assumirem pleno significado e serem integrais terão de implicar sempre uma postura coerente tanto na contribuição, como na arrecadação.

Conclusão: Se todos beneficiam, todos devem contribuir. Sendo todos importantes, não faz sentido que à luz da importância de alguns, haja isenções seletivas. A contribuição deve ser proporcional à capacidade contributiva de cada um. Tudo o que fugir destes parâmetros e todas as posturas tendentes a desvirtuar este “espírito” colidem com uma atitude cívica, madura e de exercício de uma plena cidadania solidária e responsável!

Artigo publicado em jm-madeira.pt a 17 de outubro de 2016

Sobre o/a autor(a)

Deputado na Assembleia regional da Madeira, Presidente da Assembleia Municipal do Funchal. Professor.
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