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Transparências

Dizem-nos que a regulação do lobbying tem que ser porque o lobbying existe e mais vale regulá-lo do que deixá-lo desregulado. A justificação é pobrezinha. Mas, mais que tudo, gera expetativas falsas.

A divulgação das ligações do antigo Presidente da Comissão europeia, Durão Barroso, ao banco Goldman Sachs durante o seu mandato mostra isso mesmo.

De acordo com uma reportagem recente do Público, enquanto Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso manteve contactos diretos com as chefias do Goldman Sachs, seja em reuniões formais e informais de que não há registo formal, seja recebendo documentos com sugestões de legislação em matéria financeira, designadamente sobre venda a descoberto e sobre produtos financeiros derivados. Documentos que o seu gabinete terá garantido ler com grande interesse.

O que é que este caso nos diz sobre a regulação do lobbying? A regulação comunitária sobre o lobbying é tida como referência para as legislações nacionais sobre esta matéria. Ora, no caso de Durão Barroso e do Goldman Sachs, não houve registo obrigatório de lobistas, nem registo obrigatório de reuniões que valesse. E tudo, aparentemente, dentro do mais escrupuloso cumprimento da legislação comunitária.

O que o caso Barroso Sachs nos ensina é que o ganho de transparência através da regulamentação do lobbying corre o risco de ser pouco mais que marginal. A influência pesada, a que conta para a orientação das políticas fundamentais, a que condiciona as opções de fundo dos governos, essa não se faz em reuniões pré-marcadas e registadas nas agendas dos decisores. Os donos disto tudo nunca precisaram de reuniões com deputados, governantes ou comissários europeus para imporem o resgate dos seus desmandos à frente dos bancos através de dinheiro dos contribuintes. Não precisaram porque eram eles próprios a governar. É isso que os faz serem donos disto tudo, aliás. O seu poder é muito mais feito de conquista de hegemonia sobre o senso comum do que de favorzinhos momentâneos de políticos venais.

Por isso, se queremos ganhos de transparência a sério, concentremo-nos no combate à porta giratória pela qual um governante se torna CEO de uma empresa e um quadro de um grupo económico se torna governante para depois voltar ao grupo. Concentremo-nos em definir incompatibilidades que dificultem esta promiscuidade grosseira.

E assumamos que a opacidade aparente das influências de quem manda é, na verdade, de uma transparência surpreendente. Só não a vê quem não quer.

Artigo publicado no diário “As Beiras” a 1 de outubro de 2016

Sobre o/a autor(a)

Professor Universitário. Dirigente do Bloco de Esquerda
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