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Pobres dos ricos…
Comecemos por dados concretos. Em Portugal, as 1000 famílias mais ricas (ou seja, as que acumulam 25 milhões de euros de património ou recebem 5 milhões de euros de rendimento por ano) pagam menos impostos que a generalidade dos cidadãos. Quem o revelou, aliás publicamente, foi o antigo chefe da Direção Geral de Impostos, Azevedo Pereira. “Em qualquer país que leva os impostos a sério”, dizia Pereira numa entrevista, este grupo garante 25% da receita de IRS. No nosso país, assegura apenas 0,5% , isto é, paga 500 vezes menos do que seria suposto.
Numa audição no Parlamento, aquele dirigente informava que o grupo dos 240 “super-ricos” de Portugal, ou seja, os contribuintes com a mais elevada capacidade patrimonial, escapou à austeridade. Durante o mandato do anterior Governo, a generalidade da chamada “classe média” viu o seu IRS subir vertiginosamente, com a alteração de escalões e taxas. Mas em 2012, os “super-ricos” pagavam uma taxa efetiva de IRS de 29,2% e em 2014 de 29,5%, ou seja, quase igual. A austeridade nunca lhes bateu à porta.
O imposto sobre o património imobiliário de luxo ontem anunciado, em resultado da negociação do Bloco de Esquerda com o Governo, é por isso uma medida da mais elementar justiça. A Direita esperneou no Parlamento, mas era só cabeça perdida porque as contas são o que são. E alguns comentadores, como José Gomes Ferreira (o “especialista em economia” que não tem formação económica e que a SIC insiste em impingir aos portugueses), chegaram ao ridículo de dizer que era um imposto que ia recair sobre “a classe média”. Não é só falta de rigor. É mesmo alucinação.
Em Portugal, o valor patrimonial médio é de 69 mil euros, ou seja, quase dez vezes menos do que o valor a partir do qual se fará incidir o novo imposto. E 89% dos agregados familiares (dados da Autoridade Tributária disponíveis na Pordata) tem um rendimento anual até 27 mil euros. É pouco, sim – mas é aqui que está a tal “classe média”. Não, a nossa “classe média” não tem casas de 600 mil euros.
Nos últimos anos, a Direita tratou os pobres como lixo a quem era preciso cortar os “vícios” dos apoios sociais, tratou a classe média como ricos que podiam ser extorquidos e tratou os ricos como pobres a quem não pudesse exigir-se nenhuma contribuição. Era um projeto e deu no que deu: um país com mais desigualdades, que agravou a injustiça do sistema de impostos, onde a fatura fiscal recaiu sempre sobre os mesmos.
Tem por isso uma certa graça ver agora o CDS e o PSD a indignarem-se com medidas básicas de justiça fiscal. A atual maioria quer, imagine-se, reforçar os rendimentos dos de baixo e dos do meio, pondo os de cima a pagar. Um autêntico desastre, já se vê. Pobres dos ricos…
Artigo publicado em expresso.sapo.pt a 16 de setembro de 2016
Comments
Tenho muita pena dos ricos.
Tenho muita pena dos ricos. São muito desinfelizes. O José Soeiro não percebe que eles, tadinhoss, não podem - nem devem pagar impostos. Senão ficavam... menos ricos. E isso não se faz aos ricos! Ó Soeiro fizeste-me recordar um tal André Gonçalves Pereira que disse que o vencimento de ministro dos Negócios Estrangeiros (que muito justamente era) não dava nem para pagar os charutos que usava fumar. Tadinho!
E também aquele sôr que era o "ocupas" do Palácio de Belém que disse o que disse quanto às ma$$a$ que auferia e que eram muito poucas e se não fosse a amantíssima esposa Dona Maria e a Senhora de Fátima conjugadas...
Por isso ó Soeiro deixa-me que te diga: Portugal precisa de fontes de rendimento (por exemplo para pagar os famosos "empréstimos" da Santa Casa da Miseri, oops, da benfeitora troika, porque a não ser assim o ditoso "resgate" vai às urtigas!!!! E onde se pode ir buscar a ma$$a? Poizé, à apelidada "classe média" e aos reformados. Isto ´que é uma merda! Faço parte das duas - mas só recebo de uma...
Já comecei a rezar uma novena ao Santo Padre Cruz para que voltem - e depressa - os Santos Coelho e Das Feiras. Para que volte num ai a ansiada austeridade. Ámen.
Caro José Soeiro, notei que
Caro José Soeiro, notei que no artigo que publicou aqui (e originalmente tinha publicado no Expresso) que errou num cálculo matemático muito simples e nunca o corrigiu.
Se as receitas das 1000 famílias mais ricas deviam ser, de acordo com o antigo chefe da DGI, entre 20% a 25% do total da receita de IRS, e se eles pagam apenas 0.5%, então 20/0.5=40 e 25/0.5=50, ou seja, pagam 40 a 50 vezes menos do que deviam, e não as 500 vezes que escreveu erradamente.
Não sei se lhe é possível fazer esta correção, que aqui quer no artigo do Expresso, mas devia fazê-lo, pois é um erro que mina a credibilidade do seu artigo, com o qual, de resto, estou de acordo.
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