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A insustentável leveza da clarificação na cultura
No domingo, 24 de Julho, o Público publicou uma longa entrevista com o Ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes. A entrevista é muito útil porque clarifica algumas questões menos confortáveis que o ministério tem tido em mãos enquanto é menos útil porque sendo uma entrevista muito urbana adia as resoluções. O ministro leva décadas de diplomata: não afronta, não fecha portas, não se enerva nem nos irrita, não é distante.
A entrevista vai ao sabor do jornalista. Não é um relatório e, portanto, deixa de fora quer os temas que não interessam ao jornalista quer aqueles que o Ministro prefere não tocar. Fica uma visão parcial da atividade e estratégia do Ministério. Afinal, o que ficamos a saber?
O ministro é um político sobre uma longa prática de diplomata, não se vincula, vai abrindo janelas de esperança mas seria fundamental que a estas promessas juntasse um calendário mais concreto
Que não irá contra os constrangimentos orçamentais. As verbas são mínimas, o Ministério atuará dentro dos limites impostos. Até um certo ponto, é possível avançar porque a análise de dossiers, muitos e quentes, não exige despesas de capital. Não é obrigatório ficar à espera que haja maior disponibilidade financeira para se fazer alguma coisa. É o caso das obras de Miró. Reconforta saber que não passou na cabeça do ministro vender. Vender representava uma afronta, uma solução com travo forte de mercearia. Certamente o Porto arranjará forma de acomodar Miró. Por uma vez, a coleção determina o tecto que a abrigará. Nos dias de hoje, os museus são momentos arquitetónicos a visitar mas as coleções, que é delas? Qual a sua importância? Onde estão? Qual o seu significado? Portanto, é muito positivo que se tenha decidido que o Miró fica em Portugal para ser visto e apreciado. Outro dossier escaldante é o do legado Vieira da Silva. Humilhação gigante só de imaginar que as pinturas de Vieira da Silva podiam deixar o país! Os museus para Castro Mendes são uma preocupação, não restam dúvidas e a decisão de enviar para os museus os originais espalhados pelos quatro cantos do Ministério também é muito positivo. O décor que proporcionavam situava-se nos antípodas das indispensáveis condições de conservação, refletia um comportamento anti cultural que nenhuma alegria justifica.
Museus, cuja rede vai repensar, e alguma forma de património merecem a ponderação ministerial. Desta vez as artes performativas não mereceram destaque mas o património bibliográfico e arquivístico, para além de uma caixa introduzida pelo jornalista, também não foi considerado. Ou antes, a referência que lhe é feita é absolutamente insignificante. Este é um aspeto muito negativo da entrevista. O património documental tem de ser conservado, enriquecido com aquisições e o seu acesso garantido hoje e no futuro. Para conseguir estes objetivos, as alternativas são várias com defensores acalorados mas urgem decisões que merecendo debate público só podem aportar melhores respostas. O património documental é silencioso, basta um minuto para se calar para sempre. Falta-lhe glamour para merecer mais?
Se à mesa das negociações para o OE 2017, as verbas do Ministério da Cultura não saírem reforçadas, as artes e o património vão à vida mais depressa do que se manda a Viscondessa de Menezes de volta ao museu
As respostas do ministro mantiveram-no à tona de água: estamos a analisar, a ponderar, já falamos, vamos ver, não me comprometo. O ministro é um político sobre uma longa prática de diplomata, não se vincula, vai abrindo janelas de esperança mas seria fundamental que a estas promessas juntasse um calendário mais concreto. Previsivelmente, o próximo OE não trará alterações e como os dossiers que implicam negociação irão ficando concluídos, a certa altura, tem de se passar à prática. Portanto, urge saber quais são as prioridades, começa-se pelos museus ou pela dissolução da DGALB um anacronismo gritante? Devolve-se dignidade ao arquivo de Estado ou a Torre do Tombo continua escondida num cantinho? Acode-se às livrarias, revê-se o IVA para os livros ou encara-se a revisão da lei do Depósito Legal com determinação? Fica-se pelos elogios à Biblioteca Nacional ou reforça-se o orçamento da instituição para que tenha um plano de aquisições como se exige? Um cardápio de perguntas a exigir a definição de estratégia e plano para o que resta de legislatura. Se à mesa das negociações para o OE 2017, as verbas do Ministério da Cultura não saírem reforçadas, as artes e o património vão à vida mais depressa do que se manda a Viscondessa de Menezes de volta ao museu.
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