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Trabalho transformado em ocupação

A Câmara Municipal de Angra do Heroísmo orgulha-se de manter 250 desempregados em programas ocupacionais. Julga que está a fazer um grande favor a quem trabalha a preço de saldo, ocupando postos de trabalho permanentes na autarquia.

A direita mais reacionária, mais retrógrada e que mais persegue os pobres, como se fossem os responsáveis pela sua condição, iniciou, há muito, uma campanha de estigmatização social, populista e demagógica contra os beneficiários do rendimento mínimo garantido, mais tarde redesignado por rendimento social de inserção, naquela que foi uma manobra para desculpar, é certo, o seu ódio visceral contra os desempregados, vistos como meros desocupados. Vai daí, optou por alimentar esquemas ludibriosos para forçar os desempregados a aceitar aquilo que apelida por trabalho socialmente necessário através de alegadas medidas de inserção no mercado de trabalho.

Insatisfeita com a perseguição aos beneficiários do RSI, também iniciou uma campanha contra os desempregados beneficiários do subsídio de desemprego. E, mais uma vez, atacou com total desprezo pela verdade quem cai no desemprego e recebe uma prestação social, não por caridade ou misericórdia, mas resultante daquilo que pagou com as suas contribuições enquanto trabalhou.

Uma direita liberalizante que não vê no subsídio de desemprego uma medida da mais elementar justiça social de um Estado de Providência e regulador, à boa maneira social-democrata, mas como um peso que descapitaliza a Segurança Social ou, ainda mais perverso, um entrave à redução de salários e ao aumento da precariedade. Porque, afinal de contas, e segundo os defensores da liberalização de tudo como caminho para a competitividade, mais vale um baixo salário e a precariedade do que o desemprego.

O que capitaliza a Segurança Social e a torna sustentável é o emprego, justamente remunerado e com direitos, em vez de expedientes maquiavélicos que condicionam, sob o disfarce de programas ocupacionais, a perceção de subsídio de desemprego, à aceitação de trabalho socialmente útil.

O recurso abusivo a programas ocupacionais, pese embora as louváveis intenções subjacentes à criação destes programas, normaliza relações laborais precárias, tidas como ocupacionais ou socialmente necessárias, precisamente pelos órgãos da Administração Pública Autónoma e pelo poder local que deveriam servir de exemplo de boas práticas.

A Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, na figura do seu presidente, orgulha-se de manter 250 desempregados em programas ocupacionais, sem sequer considerar que alguns destes desempregados se encontram a ocupar postos de trabalho permanentes na autarquia, e assume uma postura de quem está a fazer um grande favor a quem trabalha a preço de saldo.

Se considerámos aberrantes e revoltantes as declarações de António Saraiva (presidente da CIP), quando afirmou que mais vale a precariedade ao desemprego, Álamo Meneses vai mais além, e acrescenta que, porventura, o precário também deve estar agradecido pela sua condição.

Dir-nos-ão que melhor é impossível, que não há alternativa, que o desemprego na Região baixou e que a nossa economia está a recuperar. Frases feitas por alguém que um dia até disse que “a vida das pessoas não está melhor mas o país está muito melhor” (Luís Montenegro, deputado do PSD).

Sobre o/a autor(a)

Deputado à Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores. Membro do Bloco de Esquerda Açores. Licenciado em Psicologia Social e das Organizações
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