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Escola a tempo inteiro ou escola por inteiro
O gabinete do Ministério da Educação fez saber da intenção de alargar horários para todos os alunos do ensino público até ao 9º ano para que estes possam estar na escola num horário alargado, ou seja, um horário semelhante aos dos seus pais. A questão é normalmente colocada como “Escola a tempo inteiro”, mas é importante perceber se estamos a aumentar o tamanho e tempo do depósito na escola, ou se aproveitamos a oportunidade para enriquecer a escola em Portugal e torná-la mais moderna e progressista.
A ideia baseia-se na introdução de Atividades de Enriquecimento Curricular (AEC) até ao 9º ano, à semelhança do que já acontece no 1º ciclo, sendo opcional a sua frequência ou não.
Algumas coisas devem ser então transportadas para uma decisão sobre este tema:
Em primeiro lugar, a frequência de atividades escolares complementares (como a aprendizagem de um idioma), culturais ou desportivas, devem estar acessíveis a todos independentemente da sua capacidade económica. Hoje isso não acontece de forma sistematizada e não acontecerá se não for a escola pública a fornecê-lo. É por isso uma boa (e progressista) ideia trazer esses vetores e valores sociais para dentro das escolas.
Em segundo lugar, partimos para um debate de uma forma já bastante informada sobre as opções de estruturação das AECs no 1º ciclo. Estas são muitíssimo fracas de uma forma generalizada. Os professores titulares, responsáveis por tudo o que diz respeito a uma turma, têm mais do que fazer do que verificar da qualidade e da implementação do programa das AECs. Aliás, nenhuma entidade se preocupa verdadeiramente com elas. O dinheiro é vertido do Ministério da Educação para uma rede esquisitíssima de entidades que cedem a outras entidades a gestão e execução dessas atividades. Desta rede resulta a responsabilidade… de ninguém. Nem Ministério, nem Câmaras Municipais, nem Juntas de Freguesia, nem Direções de Agrupamentos, nem Associações de Pais… ninguém se responsabiliza verdadeiramente pelos programas e qualidade de implementação das AECs.
Portanto, aprendemos já alguma coisa…
O Ministério não tem hoje nenhum mapa sério do que se passa no país no que diz respeito às AEC – Atividades de Enriquecimento Curricular – no 1º ciclo. Seria bom que tivesse e é incompreensível que não tenha. Não tem hoje e não terá, se continuar a aceitar que a gestão das AECs seja passada de mão em mão - numa mão o dinheiro, noutra uma concessão.
Mais simples é mais fácil, mais transparente e de melhor qualidade
Espera-se portanto que do debate de ideias e da decisão saiam coisas simples: as AEC são um instrumento importante e podem permitir a todos aquilo que é importante para todos. Têm de ser pagas com o financiamento público e têm de ser geridas de forma coerente por todo o país porque é a única forma de podermos aferir da sua qualidade e execução.
Quem goste de jargão, pode chamar-lhe accountability. É isso que é preciso e só será possível quando as AECs estiverem na gestão direta e universal das Direções dos Agrupamentos e das Escolas. Não há e não haverá outra forma melhor.
Comments
Excelente análise, que só
Excelente análise, que só pode ser feita por alguém que conhece esta realidade de perto e se empenha na vida escolar de um filho. Partilho as mesmas preocupações: que a "escola a tempo inteiro" seja uma forma de valorização educativa e de combate às desigualdades de oportunidades, não um "depósito" ou um negócio pouco claro; que a "escola a tempo inteiro" não substitua, mas antes apoie os alunos e suas famílias.
No meu concelho, Seixal, 56% das crianças do 1º Ciclo na rede pública têm de partilhar as mesmas salas de aula, em horários duplos. 5 horas de aulas por dia espremidas (numa manhã, ou numa tarde), apenas com 20m de intervalo. Nem salutar, nem pedagógico. E como não há mais salas, as AEC são dadas em vestiários esconsos ou refeitórios.
Para cúmulo, o CAF/ATL atinge valores elevados, mais caro do que as propinas do ensino superior. Como estão em horário duplo, as crianças esperam os seus pais horas a fio num CAF /ATL, instalado no refeitório da escola.
As crianças do 1.o CEB passam
As crianças do 1.o CEB passam 8h e meia na escola, 2h e meia são intervalos sem meios humanos suficientes para a prevenção de indisciplina.
Desde o início da "escola a tempo inteiro" tenho verificado mais indisciplina e menos motivação nos meus alunos.
Olá Carla e Rita, e obrigado
Olá Carla e Rita, e obrigado pelos comentários.
De facto ouvimos com frequência sobre o aumento da indisciplina. Concerteza este modelo de escola de banco/secretária não ajuda. Precisamos de retirar as crianças da Escola para que elas possam gostar mais da escola, e também, expandir a escola para fora do espaço físico que hoje a demarca.
Em todo o caso, para já, e sobre o modelo mais imediato sobre o qual precisamos de decidir, pensar e posicionar-nos, acho que a possibilidade de introduação de mais cultura e desporto dentro das escolas públicas um ótimo princípio, que podemos tentar aproveitar para melhorar o sistema fraquinho que temos no momento nesses aspetos.
Abraço
RM
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