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Tratado Orçamental: Pacto Colonial

No modelo colonialista do tratado orçamental não há espaço para conciliação, apenas para o combate. É esse o caminho da emancipação dos povos.

O Tratado Orçamental nasceu no calor da crise da zona euro. Num contexto político que dividiu a Europa entre credores e devedores, entre os virtuosos do centro e do norte e os mandriões da periferia do sul, a dívida foi o argumento para reforçar as antigas regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento e as transformar num verdadeiro colete de forças aos povos europeus.

A Comissão Europeia passou a ter o direito a controlo prévio das políticas orçamentais de cada país, ainda antes da sua submissão aos parlamentos nacionais. As novas regras são o garante da austeridade permanente: a dívida pública deve ser reduzida para o máximo de 60% do PIB num prazo de 20 anos e o défice estrutural deve ter o teto de 0,5%. Se a Comissão Europeia entender que as regras não estão a ser cumpridas ou o esforço para o equilíbrio orçamental não é o adequado, terá imediatamente de ser aplicado um mecanismo de correção que, em caso de incumprimento, levará à aplicação de sanções. Se ficar o bicho pega, se correr o bicho come, porque caso um país rejeite em absoluto a submissão à comissão haverá sempre uma (ou várias) agência de rating que fará o trabalho sujo de criar o pânico nos mercados para degradar as condições de financiamento dos países e forçar essa cedência. Por último, mas não menos significativo, as sanções são automáticas e a única forma de as impedir é através de uma maioria qualificada no Conselho Europeu, onde 6 países detêm 70% dos votos e nenhuma decisão pode ser tomada contra a vontade dos quatro maiores países.

Se em todo o parágrafo anterior não foi mencionada a palavra democracia, não é mera coincidência. Todo o processo de visto prévio pela comissão e de debate das escolhas orçamentais acontece à margem das escolhas populares ou dos parlamentos nacionais. Neste modelo, os povos só entram na parte da equação que implica o empobrecimento, a agudização das desigualdades, a destruição do Estado Social, a redução de direitos ou o enorme desemprego estrutural.

No modelo colonial, a metrópole fica com a riqueza produzida na colónia, as elites da metrópole têm nas elites da colónia a reverência necessária para cumprir as diretivas e garantir a submissão do povo, os instrumentos de dominação garantem a dependência económica dos colonizados. É isso que representa o Tratado Orçamental: garante a transferência da riqueza da periferia para o centro com o abusivo pagamento da dívida, as privatizações ou o desmantelar do Estado Social; cria uma dependência do financiamento e mantém latente a pressão dos mercados contra os países; garante à elite europeia a determinação das políticas orçamentais acima da vontade e da determinação dos povos.

No modelo colonialista do tratado orçamental não há espaço para conciliação, apenas para o combate. É esse o caminho da emancipação dos povos.

Artigo publicado no blogue A Contradição

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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