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Eu "show" Portas

O líder partidário há mais tempo no activo anunciou um novo concurso de caça-talentos quinzenal para metade dos deputados da sua bancada parlamentar.

Perante a ameaça de inverno rigoroso, o gosto pela hibernação voltou e é, reconhecidamente, um prazer antigo do Paulo Portas político que evolui perante os nossos olhos desde que foi eleito presidente do CDS em 98. Com uma curta hibernação - lá está - de dois anos (entre a derrota nas legislativas de 2005 e a queda de José Ribeiro e Castro em 2007), o actual líder do CDS-PP brindou-nos com 16 anos de prática política activa e não consta que derive para um regresso ao passado, num fluxo de "irrevogável" para "independente", recuperando as suas lides jornalísticas de mel e fel. Paulo Portas anunciou que se afasta porque, pura e simplesmente, o poder deixou de passar por ali. E Portas não se vê ao espelho como vice-líder da oposição. Mais uma vez, analisa bem e a frio.

A primeira conclusão que se precipita como gotas de chuva no Inverno à Direita aproxima-se de um dilúvio: já ninguém acredita que o acordo à Esquerda dure apenas um ou dois anos. E esse período climático dá mais do que ensejo para vários chapéus de chuva e tacticismos de "golpe da caneta". Recordando o momento, à boca de urna interna. Aquele em que Manuel Monteiro (na altura, presidente do CDS) se dirigiu ao local de voto de caneta em riste e foi acusado de votar em branco, evitando a eleição do candidato único Paulo Portas como líder parlamentar centrista fruto do peso dos votos em branco e fazendo com que vários deputados do partido abandonassem o barco até Portas se coroar líder pouco tempo depois. Se, na altura, a caneta do líder foi um instrumento para o assalto à liderança, ninguém como Portas depois instrumentalizou tão fortemente a política portuguesa. Com indesmentível inteligência e mesmo que agora com a legítima vontade de vida própria, fica claro que a lógica que o mantinha ligado à política como vice-primeiro ministro era aquela, sinuosa, de quem só admite rodar a "geringonça" desde que tenha o poder na mão para a rodar a seu bel-prazer.

A "abrilada" absolutista de Portas no CDS-PP acabará em Abril e em Congresso. Mas o PP não cai da sigla, maduro de velho. A corrida para a sucessão no partido começa bem antes nos debates quinzenais com António Costa, onde os vice-presidentes do partido e do grupo parlamentar usarão da rotatividade para exprimirem voz própria ou afincada imitação. Mesmo com o afastamento de Portas, o seu "show" pessoal continuará a ser líder de influências. Para o futuro líder do CDS-PP, a vida sempre com uma constante incerteza: um jogador como Paulo Portas nunca soletrará um "Game Over".

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” em 30 de dezembro de 2015

Sobre o/a autor(a)

Músico e jurista. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990.
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