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O nosso bom povo de direita
Democracia e um cravo na lapela, desde que não seja para praticar. Nestes dias uma minoria do nosso bom povo grita a bons ventos contra tudo o que mexe. Como é que, com uma espantosa votação que representa cerca de 20% dos eleitores inscritos, o PSD e o CDS não podem mandar sobre tudo e sobre todos? Inconcebível!
Essa minoria do nosso bom povo, de direita e conservadora, desconhece a Constituição nas suas ideias mais essenciais. Vociferam, rosnam, insultam com um ódio inaudito os partidos de esquerda, os cidadãos que votaram nos partidos de esquerda, e insultam também, às vezes diretamente, o regime democrático.
Para o bom e esclarecido povo de direita, quando se vota, vota-se no Primeiro Ministro. O resto é despesa em serviços administrativos, ou seja, é para cortar. Democracia de mercearia.
Para o conhecedor sabichão de direita, quem ganha deve governar de forma absoluta. E se ainda não foi possível transformar o regime político nacional num sistema bi-partidário (tudo estaria resolvido à partida), já uma revisão constitucional podia permitir apenas a formação de governos de maioria absoluta.Aliás, o boletim de voto do carinhoso povo de direita até pouparia na tinta, porque de um lado colocava-se o PS e do outro o PSD. O CDS ficava num asterisco, em ambos, para nota de rodapé.
O bom povo de direita (e não só) que grunhe habitualmente porque os partidos são todos iguais, a seguir muge porque afinal não são. Uns roubam mas são de confiança os outros… não sabem, mas são perigosos.
O entendido povo de direita cantarola que “os políticos” só querem é tachos, mas “se estivessem no lugar deles fazia o mesmo”. Para a inteligência altiva da direita, o caso do outsourcing de Daniel Campelo do CDS para o PS (o tal asterisco) só pode ser sinal de vitalidade democrática e a coligação pós-eleitoral do CDS com o PSD nas anteriores eleições é um ato tão natural como os descritos por Pedro Arroja no magnífico Porto Canal. Que Passos minta nas campanhas aos seus eleitores, é natural, afinal a política é mesmo assim. Viva a direita!
Enfim..
A direita mostra o que vale nos momentos difíceis, e a direita é isto e sempre foi. Conservadora, com medo da democracia, com agressividade perante os diferentes. A política de direita engoliu há muito a Europa e boa parte da sua representação política (até os partidos socialistas). A cultura de que o dinheiro circula livremente e voa por cima de todas as fronteiras mas as pessoas, as crianças e os adultos, esses não. Para esses, a direita política constrói muros de betão e forma armadas invencíveis para que morram na sua terra... ou no caminho. Nos países evoluídos, a política de direita constrói muros invisíveis que separam a maioria da população do acesso à dignidade. Em Portugal, quase 3 milhões de pessoas são carenciadas, pobres que vivem no limiar da dignidade.
Mas nada disto interessa ao bom e inteligente povo de direita porque a ignorância é uma sala sem portas nem janelas. A direita é a fortaleza que antes de fechar as fronteiras aos outros se fechou a si própria. E nesta guerra, não há lugares no meio: ou estamos lá dentro, ou cá fora. A esquerda, tem de estar cá fora.
Comments
A capacidade com que a
A capacidade com que a esquerda transforma a esmagadora abstenção em votos a favor de um acordo tão ou mais danoso para a democracia e sua aplicação como um governo minoritário de direita é assustadoramente semelhante ao procedimento salazarista para a aprovação da sua Constituição (a mero título de exemplo).
Olá Joaquim,
Olá Joaquim,
Não me parece que alguém tenha transformado a abstenção em votos. Ou se alguém o fez, parece ter sido a direita e o seu bom povo, dado o entendimento de que é inabalável o seu direito a gerir o país. E se 20% não é pouco, quando os partidos que representam mais do isso, chegam a acordo político, representando mais gente, mais país, então, parece que a direita, ao querer anular essa hipótese, quer mesmo anular votos... Sobre Salazar e a sua constituição... enfim, não merece comentários.
A abstenção é isso mesmo,
A abstenção é isso mesmo, abstenção. Se a esquerda não deve reivindicá-la, também a direita não pode fazê-lo como se fosse uma sua maioria silenciosa.
A direita pensava poder continuar com as políticas altamente agressivas de transferência de rendimentos do trabalho para o capital. As últimas eleições permitiram, se não pôr um travão nessas políticas, que é o que era preciso, ao menos pôr a direita com dono...
À falta de argumentos, a direita pensava que lhe bastava a leitura convenientemente redutora dos números que dão mais votos à sua coligação do que a qualquer um dos outros partidos. O esbracejar enraivecido de quem votou na PàF a contar com o ovo no cu da galinha, isto é, com a esperada tendência por parte do PS para a pasokização, são urros que não vão chegar ao Céu. Convençam-se disso de uma vez por todas.
Com toda a certeza ao arrepio da direita mais matarruana, é de louvar que o procedimento salazarista seja entendido como mau. Valha-nos isso!...
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