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Brasil: lei antiterrorista é acusada de criminalizar movimentos sociais

Projeto de Lei foi aprovado pela Câmara dos Deputados com os votos dos partidos do governo e da oposição de direita. “O terrorismo não pode ser usado como uma desculpa para tirar direitos civis e liberdades individuais”, denuncia o PSOL. Para as organizações de direitos humanos, o projeto é desnecessário e inconstitucional. (Artigo atualizado e corrigido em 18/8/2015)
Câmara dos Deputados aprovou uma lei "desnecerssária e inconstitucional" segundo organizações de direitos humanos. Foto de Agência Brasil

A Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira 12, por 362 votos a 85, o texto-base do projeto de lei antiterrorismo (PL 2016/15). O projeto, apresentado pelo governo de Dilma Rousseff, tipifica o crime de terrorismo e teve uma tramitação em tempo recorde no parlamento, por ser considerado de caráter urgente.

A nova lei, que ainda tem de passar pelo Senado, define os atos de terrorismo como aqueles que têm o objetivo de “intimidar Estado, organização internacional ou pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, ou representações internacionais ou coagi-los a ação ou omissão”, bem como “provocar terror, expondo a perigo pessoa, património, a paz pública e incolumidade pública”.

A lei teve os votos favoráveis dos partidos do governo e também das bancadas de oposição de direita. PT, PV, PMDB, PSDB, PPS, PDT, entre outros, deram orientação às suas bancadas de aprovar o projeto. Os dois únicos partido que se posicionaram pela rejeição foram o PSOL eo PC do B (a votação pode ser verificada aqui).

O governo defendeu a necessidade da aprovação de uma lei antiterrorista por o Brasil “ser signatário de todos os tratados internacionais sobre terrorismo” e cumprir todos esses compromissos levando em conta o panorama internacional”, de acordo com o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Gabriel Sampaio.

Brecha interpretativa

Os defensores da lei argumentam ainda que esta inclui uma ressalva que afirma que “não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais e religiosos”. Mas tanto o PSOL eo PC do B quanto grupos de direitos humanos acusam o projeto de abrir uma brecha interpretativa para criminalizar os movimentos sociais.

“Nós, do PSOL, somos contra esse projeto de lei”, diz o deputado Jean Wyllys ao Opera Mundi. “No Brasil, não temos histórico de grupos terroristas. Temos organizações criminosas, mas estas já são contempladas no Código Penal. Mas o que temos mesmo é o terrorismo de Estado, sobretudo das polícias nas favelas”, observa. Wyllys adverte que “o terrorismo não pode ser usado como uma desculpa para tirar direitos civis e liberdades individuais, principalmente de movimentos sociais e dos mais pobres”.

O terrorismo não pode ser usado como uma desculpa para tirar direitos civis e liberdades individuais, principalmente de movimentos sociais e dos mais pobres.

O PSOL estranhou também a pressa com que foi tramitado o projeto. “Por que tanta pressa? Por que um projeto de tamanha importância não é discutido em nenhuma Comissão Permanente da Casa? Por que nenhuma audiência pública foi realizada para debater o tema? Por que nenhum especialista foi ouvido sobre o tema?”, questionou o deputado Edmilson Rodrigues., para quem o projeto é inadmissível. Porque “criou uma lei que pode trazer prejuízos à democracia, fazendo com que os bandidos do terror posem de gente de bem e o pobre famélico vá para a cadeia, como se terrorista fosse”.

A líder parlamentar do Pc do B, Jandira Feghali, disse à Agência Brasil que "o texto levará à criminalização de atos sociais mesmo com a salvaguarda”, e que “se deixarmos um texto amplo e genérico, a interpretação ficará na cabeça de quem julgar”.

Desnecessário e inconstitucional

Para Rafael Custódio, coordenador de Justiça da organização de direitos humanos Conectas, não há um só crime previsto no projeto que já não esteja descrito no Código Penal. “Além de ser absolutamente desnecessária, a proposta é imprecisa, subjetiva e inconstitucional porque inclui a motivação política e ideológica no rol de elementos que configurariam o terrorismo. São duas garantias fundamentais previstas na Constituição que não podem, de maneira alguma, constituir delitos”, explica. “Países que tentaram fazer isso já foram condenados internacionalmente, como é o caso do Chile na Corte Interamericana de Direitos Humanos”, completa.

Uma nota técnica da Rede Justiça Criminal, da qual a Conectas faz parte, adverte que o texto “atenta contra as liberdades democráticas: não protege nenhum novo bem jurídico e expõe os cidadãos e cidadãs brasileiros à censura penal de atos políticos”.  

Nota: Este artigo foi atualizado em 18 de agosto de 2015, corrigindo uma informação errada, a de que o PC do B votara a favor da lei. A verdade é que o PC do B votou contra a lei. O Esquerda.net corrige o erro e pede desculpas aos responsáveis do PC do B, e em particular à sua líder parlamentar, Jandira Feghali. O erro do Esquerda.net foi provocado pelo facto de o PC do B ter votado a favor da emenda aglutinativa nº4, a única que foi feita por voto nominal e portanto a única que aparece discriminada na sessão ordinária Nº 221, de 12/08/2015, no site da Câmara dos Deputados. A votação principal foi a da Subemenda Substitutiva Global do Relator do Projeto de Lei nº 2.016 de 2015 foi feita apenas por bancadas, e por isso só aparece com tendo sido aprovada, sem discriminar quem votou o quê. Para saber qual foi a orientação de votação dos partidos, foi necessário recorrer à transcrição da sessão.

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