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Dignidade e Democracia
Esta semana, não podia deixar de falar na Grécia. De falar da dignidade de um povo e do exercício da democracia por um partido de esquerda, que contrasta com a nossa experiência em Portugal.
A dívida pública da Grécia, em 2010, era 120% do PIB, hoje corresponde a 180%. Nestes cinco anos, o povo grego foi submetido a privações sem par no quadro europeu, que resultaram em 27% de desemprego global, 60% de desemprego jovem e 27% de descida do PIB.
O resultado destes números é a marginalização social em massa, a cada dia que passa, sem que a dívida, em nome do qual se faz tudo, não baixa, mas aumenta.
Aliás, o mesmo acontece no nosso país: a dívida, em 2011, representava 97% do PIB, e hoje ronda os 130%.
O actual governo grego apresentou-se às eleições com a bandeira da inversão do caminho de austeridade que tinha sido imposto à Grécia. Mas as instituições europeias impuseram o prosseguimento do mesmo caminho, e ao fim de cinco meses, fizeram mesmo um ultimato: ou isto ou nada!
Perante este ultimato, o governo grego não se fechou em si, entregou de novo ao povo a decisão do caminho a seguir, tirando daí as conclusões políticas da vontade popular.
O tal ‘governo de extrema esquerda’ – como muitos gostam de chamar – deu uma lição de humildade, de apego à democracia, e de responsabilidade perante o seu povo.
Notemos o contraste com o nosso país, onde tudo se fez – desde a entrada na CEE, os sucessivos tratados, a entrada no euro, o Tratado Orçamental, que foi de responsabilidade governamental para fugir ao Parlamento Europeu, e por fim a entrada da Troika – sem que o povo português fosse chamado a pronunciar-se.
A nossa experiência mostra que PS, PSD e CDS têm medo da democracia e fogem de colocar nas mãos do povo o seu futuro coletivo. A pergunta que se coloca é ‘porque têm medo da democracia?’.
O povo grego foi na última semana chantageado de forma absurda. Um povo exausto de tanta privação, que se confronta com falta de comida na mesa, que não tem acesso a cuidados de saúde, que vê os seus jovens a emigrar, ainda é acusado de andar a gastar o dinheiro dos povos da Europa.
O dinheiro emprestado, quer à Grécia, quer a Portugal, não foi para salários e pensões. Foi para pagar os juros e ‘reciclagens’ da dívida. Nós sabemos isso muito bem, porque estamos a sofrer a mesma chantagem.
As chamadas ‘instituições’ emprestam-nos para se ressarcirem, assim como aos bancos envolvidos.
Mas a tudo o que de mais baixo existe, o povo grego respondeu com uma dignidade, um civismo, e uma vontade coletiva que não me canso de exaltar e que me enche de alegria.
Não sei o futuro. A luta não terminou no domingo, mas não custa a crer que esta demonstração de dignidade e democracia seja vista pelo pensamento dominante – dirigido, na Europa, pelo capital financeiro – como um alvo a abater.
O pensamento único não pode ser confrontado com alternativas, não vá o povo querer a alternativa a sério, parafraseando António Aleixo.
Não quero terminar este artigo sem lembrar Maria Barroso, que esta semana nos deixou. Pelo seu empenho na luta pela liberdade, na cultura como instrumento emancipador, e pelo seu exemplo na libertação da Mulher.
Comments
Bom dia.
Bom dia.
Concordo com o expresso no texto.
A forma como a Grécia foi tratada, evidencia um novo tipo de genocídio e de uma eugenia, por parte de quem já o tinha feito antes.
Só mudaram a forma de o levarem a efeito.
Anti-humanismo puro e total.
Já devem estar a baba-ser, com a perspectiva do sangue alheio. Bárbaro, muito bárbaro.
Cumprimentos,
Paulo Figueiredo
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