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Alguém vai ter de pagar, não é?
Tão inocente como uma história de crianças
No debate quinzenal no Parlamento, o Primeiro-Ministro, utilizando a habitual voz modulada, deixou uma pergunta que, de tão pérfida, nos deixa gelados. A propósito das críticas sobre novos cortes que ameaçam abater-se sobre os aposentados, falou e disse. Como classificar aquela asserção? Uma coisa fica claro: o Primeiro-Ministro tem para si, e executa-a com esmero, a determinação de assacar a alguém a responsabilidade de reduzir a dívida pública. Nem disfarça. Ora quem paga, paga alguma coisa. O quê? 600 milhões de euros! Alguém, quem? Os reformados!
Esta persistência absurda, a recair sempre sobre o mesmo grupo, acaba por nos pôr todos a fazer contas. Discutimos todos com grande afã de onde hão-de vir os milhões que faltam nas contas do governo (acreditando na Ministra das Finanças, serão 600 milhões, montante que deixou escapar em jeito de folguedo), onde e como se hão-de arranjar os ditos milhões. Escrutinamos passado e presente, orçamentos, rubricas, engenharia financeira.
Os mitos desfocam a realidade
O cansaço invade-nos. As contas são necessárias mas a desconstrução dos argumentos do governo, ainda mais. Os argumentos do governo são bons exemplos de mitos (urbanos e rurais, com certeza). O mito da baixa natalidade como causa central para a falta de sustentabilidade do sistema; o mito da falência do sistema de Segurança Social; o mito de que os reformados são os responsáveis; o mito de que vivemos acima das nossas possibilidades. Os números, as estatísticas são absolutamente indispensáveis para desmontar este esquema. Mas também devem servir para evidenciar como estamos todos a ficar toldados por estes argumentos desfocados. Os economistas e os técnicos da Segurança Social dominam esta matéria, colocam sobre a mesa mãos cheias de números e dados que desmontam as teorias terroristas governamentais. Mas será que este exercício não contribui para nos afastar do essencial, não nos distrai? E se nos distrai, então, trata-se de manobra maliciosa.
Provocar a intranquilidade é inaceitável
O vocábulo “terrorismo” embora pesado reflete com precisão o cenário em que vivemos. Quando economistas da área política do governo atacam as medidas e a argumentação do governo, somos obrigados a pensar duplamente e a suspeitar. Enquanto percebemos que as medidas não podem estar certas, ficamos a ponderar as razões que levam à prossecução renitente de políticas e propaganda enganadoras. Não se pode omitir o que é negro mas talvez se possa ser exato, honesto, claro e honrado. Propalar, por exemplo, a falência da Segurança Social, deixa em pânico todos quantos dependem da sua liquidez para [sobre]viverem. Não é decente uma argumentação continuada que deixa intranquilos e aterrorizados os pensionistas. A situação é difícil, sim; a situação pode ser resolvida, sim; a situação exige a adoção de medidas que este governo repudia, sim. Eis o calcanhar de Aquiles! As soluções existem, sim, mas não no quadrante ideológico e político deste governo.
As contas e os princípios
Puxemos, então, a discussão para o campo da política e dos princípios. Somos defensores de outros valores, façamos com eles a nossa luta e a nossa bandeira. Ao confrontar números, exijamos que sejam exemplificados com as questões concretas e com as pessoas. Para cada projeção, como é que as pessoas ficam? Hoje e amanhã? Porque as pessoas são o que mais conta. Os pensionistas, os desempregados, os precários. É da vida deles que falam os economistas e os técnicos de segurança social. É bom lembrar de vez em quando. Interessamo-nos todos pelo destino da Segurança Social e depressa percebemos que a solidariedade, a sustentabilidade e a estabilidade do sistema são o cerne do problema. É, não é?
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