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Notas simples sobre uma greve na TAP

A greve será eficaz se bater no centro do interesse do patronato e dos seus representantes: o dinheiro, o lucro e as vantagens.

O horror, o escândalo, a barbárie, o espanto. Quem poderá voltar a dormir à noite?! Várias proeminentes personalidades e um incontável número de cidadãos, do café da esquina ao café da universidade, mostram-se perdidos e perplexos: “Então não é que os pilotos, organizados num seu Sindicato, quiseram infligir um prejuízo financeiro, um dano administrativo, na empresa onde trabalham?” Ah Malandros!

Este episódio, triste e interessante ao mesmo tempo, relembra-nos o outro lado desta estória – a greve. O lado em que as greves não estão propriamente na moda e tantas vezes são entendidas socialmente - apoiadas ou criticadas - como uma espécie de direito democrático que os trabalhadores têm para fazer uma birra, colocando-a, à greve, como uma imagem da inconsequência das organizações laborais. Ou como gostam de afirmar os socialistas e centristas do mundo laboral: “todos têm direito a mostrar a indignação e a insatisfação”. Ou seja, todos têm direito a refilar desde que não façam mossa ao patrão e aos dividendos sejam distribuídos, quer seja na EDP, nos CTT, na PT ou na mercearia da esquina. Já agora, “façam greve mas metam lá os autocarros a andar”.

Mas neste caso houve realmente dano e provavelmente não haverá nenhuma forma de diálogo que as administrações compreendam melhor do que a linguagem usada pelos pilotos: a diminuição de lucros e a entrada de novas linhas na página da Despesa nos seus Orçamentos. Quais direitos sociais, qual direito ao trabalho, qual dignidade… é mesmo nas contas que é preciso tocar. Não há choque nem pavor, só houve eficácia e determinação dos pilotos da TAP.

Em 40 anos de experiência e puro afinco, PS, PSD e CDS dedicaram-se a criar uma moldura legal na área do Trabalho que fez com que a maioria dos trabalhadores tenha enormes dificuldades em aderir a uma greve, primeiro através da precarização do trabalho, e depois através do bullying governamental e patronal feito às organizações de trabalhadores (da responsabilidade destas também se vai falando).

Enquanto alguns dos (agora) horrorizados vão esperando ansiosamente pela sua oportunidade de, numa qualquer próxima privatização ou reorganização acionista, ficarem com uma fatiazinha da empresa pública ou privada onde trabalham, os patrões vão impondo o último grito do bullying social: a reposição do trabalho no dia do Trabalhador.

Tudo isto parece sublinhar a traço grosso algumas das formas da vida e do mundo do trabalho de hoje. Sim, a greve será eficaz se bater no centro do interesse do patronato e dos seus representantes: o dinheiro, o lucro e as vantagens. E sim, a oportunidade faz o ladrão ou o capitalista. Dinheiro fácil no BES ou na TAP, venha ele de onde vier.

Mas como tudo funciona como vasos comunicantes, sabemos que, ou ganhamos a capacidade de lhes infligir perdas e danos fortes, ou eles – os patrões, atuais ou aspirantes - regressarão cada vez com mais força.

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Engenheiro informático
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