You are here
Se as portas da fortaleza Europa se abrissem, as tragédias do Mediterrâneo cessariam
O Mediterrâneo é hoje palco de tragédias. As suas personagens são os seres humanos que perecem na procura por um futuro, por uma vida melhor. Os holofotes do mercado da emoção estão ligados. A cada tragédia assistimos à comum ritualização: declarações de pesar e de horror dos governantes europeus, o descer das suas lágrimas de crocodilo, a realização de uma qualquer cimeira de ministros europeus, a visita ao local da tragédia, a promessa de que algo será feito. Um ritual que os governantes europeus já ensaiaram e praticaram vezes demais nos seus já longos mandatos. Os próximos dias serão, infelizmente, mais uma repetição com todo o desrespeito pelas vidas que não quiseram salvar. Os naufrágios continuarão e vidas se perderão.
As medidas de resposta a este flagelo humanitário que a Europa continua a aplicar baseiam-se na criminalização e militarização da imigração, em deter e expulsar os imigrantes que já sofreram o suficiente e na realização de maciças operações militares de patrulhamento do Mediterrâneo. Medidas que visam a “proteção” da fortaleza Europa dos invasores, dos indesejáveis. O mais recente desastre demonstra que esta orientação falhou, quando não teria que o fazer. Quantas mais vidas perdidas serão necessárias?
O capitalismo tem a infeliz capacidade de conseguir transformar qualquer desgraça humana em lucro. É com base nesta sua capacidade que desde a década de 80 do século passado temos vindo a assistir nos Estados Unidos da América (EUA), Escócia, África do Sul, Alemanha, Itália, entre outros, à privatização dos estabelecimentos de detenção e “acolhimento”. Se estes nem deveriam existir para os imigrantes, a verdade é que existem e produzem lucros exorbitantes a empresas subcontratadas pelos respetivos Estados para fornecerem estes serviços. Se os custos para os Estados são avultados, as condições dos imigrantes são deploráveis. Os Direitos Humanos perante o lucro nada são. A imigração tornou-se um negócio não apenas para os traficantes de seres humanos, mas também para as grandes multinacionais que lucram com a prisão de seres humanos em condições desumanas. “Os privados gerem melhor”, dizem eles.
A Europa que se afirmava defensora dos Direitos Humanos deu azo à Europa dos mercados.
Se as portas da fortaleza Europa se abrissem por terra, as tragédias do Mediterrâneo cessariam. Se a Europa da austeridade desse azo à Europa do investimento público e criação de emprego, novos postos de trabalho seriam criados para todos e todas. Se a Europa envelhecida abrisse as suas portas, tornar-se-ia mais jovem. Se a Europa abandonasse a criminalização e militarização da imigração, diminuiria o racismo e a xenofobia.
Entretanto, a tragédia continuará e os holofotes desligar-se-ão.
Comments
Boas noites,
Boas noites,
Ricardo, as portas da Europa nunca deveriam de ter sido fechadas, pelo que abri-las é urgente pois salvarão milhares de vidas. Mas no artigo não referiste a causa principal desta tragédia e ela é, a meu ver, a politica que a generalidade dos países da Europa, os Estados Unidos, a ex-URSS, etc etc, uns no passado e os outros que continuam, há décadas persistem em prosseguir no continente Africano e também no Médio Oriente, que é sugar os recursos naturais, nem que para isso, elejam e derrubem governos fantoches, que exploram o seu povo e os condenam a um estado de miséria inadmissivel nos tempos modernos. Acreditas que, se estes cidadãos que perdem a vida no Mediterrâneo e outros que escapam, tivessem oportunidades nos seus países viriam para uma Europa que apodrece e sucumbe, dia a dia pelas, mãos de governantes sem escrúpulos? Um abraço.
Boa noite Armindo,
Boa noite Armindo,
Concordo contigo. É verdade que o continente africano e o Médio Oriente são explorados, lapidados, pelas potências imperialistas desde há séculos. Grande parte do nosso desenvolvimento deveu-se à exploração de outros povos, impedindo-os de terem uma vida digna e bem-estar. O imperialismo apoiou e derrubou ditadores sempre que dava jeito às respectivas potências.
A Europa deve abrir as suas portas, mas a questão é estrutural, não conjuntural. Isso está bem presente na expansão do Boko Haram e do Estado Islâmico, que germinam e se alargam perante a fragilidade dos Estados africanos, fragilidade que sempre deu bastante jeito aos interesses imperialistas.
Abraço
Add new comment