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Israel precipita-se para uma guerra impiedosa contra Gaza

Israel avança para a próxima erupção de violência contra os palestinianos, como se se tratasse de uma espécie de catástrofe natural que não pode ser evitada. Artigo de Gideon Levy, publicado no jornal israelita Haaretz.
Cerca de 150 mil pessoas sem abrigo vivem na faixa de Gaza e cerca de 10 mil refugiados estão nos abrigos do UNRWA.

A próxima guerra rebentará este verão. Israel dar-lhe-á mais um nome infantil e ocorrerá em Gaza. Já existe um plano para evacuar as comunidades israelitas ao longo da fronteira da Faixa de Gaza.

Israel sabe que essa guerra vai rebentar e sabe também porquê – e precipita-se ao galope, de olhos vendados, como se fosse um ritual cíclico, uma cerimónia periódica ou uma catástrofe natural que não pode ser evitada. Aqui e acolá nota-se até algum entusiasmo.

Pouco importa a identidade do primeiro-ministro e do ministro da Defesa – não há qualquer diferença entre os candidatos no que diz respeito a Gaza. Isaac Herzog e Amos Yadlin não dizem evidentemente nada e Tzipi Livni vangloria-se de, graças a ela, nenhum porto de Gaza ter sido aberto.

Os restantes israelitas também não estão interessados com o que se passa em Gaza e, não tarda, Gaza será obrigada a recordar-lhes mais uma vez a sua situação trágica da única maneira que lhe é permitida: com os rockets.

A situação em Gaza é desastrosa, terrível. Ela não é mencionada no discurso israelita nem na campanha eleitoral mais miserável e vazia que tenha havido aqui.

É difícil acreditar, mas os israelitas inventaram uma realidade paralela, cortada do mundo real, uma realidade cínica, insensível, enterrada na negação, embora todos estes desastres, que são na maior parte provocados por eles próprios, ocorram a uma curta distância das suas casas.

Os recém-nascidos morrem gelados sob os escombros das suas casas, os jovens arriscam a vida e atravessam a vedação fronteiriça para apenas obter uma ração de comida numa cela israelita.

Alguém ouviu falar disto? Alguém se preocupa com isto? Alguém percebe que isto conduz à próxima guerra?

Salma viveu apenas 40 dias, como a eternidade de uma borboleta. Era um bebé de Beit Hanoun, no nordeste da Faixa de Gaza, que morreu no mês passado de hipotermia, depois de o seu corpo frágil ter gelado com o vento e a chuva que penetraram na cabana de contraplacado e plástico onde ela vivia com a sua família, depois da sua casa ter sido bombardeada.

“Ela ficou gelada como um sorvete”, declarou a sua mãe sobre a última noite do seu bebé. O porta-voz do UNRWA [organização da ONU para os refugiados], Chris Gunness, contou a história de Salma na semana passada no jornal britânico The Guardian. Mirwat, a sua mãe, disse-lhe que, quando nasceu, ela pesava 3,1 kg. A irmã Ma'ez, de três anos, está hospitalizada por enregelamento.
Ibrahim Awarda, de 15 anos, que perdeu o pai num bombardeamento israelita em 2002, teve mais sorte. Decidiu atravessar a fronteira entre Gaza e Israel. “Eu sabia que seria detido”, declarou ao jornalista do New York Times em Gaza na semana passada. “Pensei que talvez fosse encontrar uma vida melhor. Deram-me comida decente e recambiaram-me para Gaza”.

Ibrahim ficou detido durante cerca de um mês em duas prisões em Israel antes de ser atirado de novo para a destruição, a miséria, a fome e a morte. Trezentos habitantes de Gaza morreram afogados no mar em setembro do ano passado, numa tentativa desesperada de deixar a prisão de Gaza.

84 habitantes de Gaza foram detidos pelas forças de defesa israelitas nos últimos seis meses, depois de terem tentado entrar em Israel; a maioria deles queria apenas fugir do inferno onde viviam. Outros nove foram detidos este mês.

Atiya al-Navhin, de 15 anos, tentou também entrar em Israel em novembro, apenas para fugir à sua sorte. Soldados do Tsahal abriram fogo sobre ele, foi tratado em dois hospitais israelitas e voltou para Gaza em janeiro. Agora, está deitado na sua casa, paralisado e incapaz de falar.

Cerca de 150 mil pessoas sem abrigo vivem na faixa de Gaza e cerca de 10 mil refugiados estão nos abrigos do UNRWA. O orçamento da organização foi gasto depois de o mundo inteiro ter ignorado o seu compromisso de contribuir com 5,4 mil milhões de dólares para a reconstrução de Gaza.

O compromisso de negociar o levantamento do bloqueio a Gaza – a única maneira de evitar a próxima guerra e a que se segue – também foi quebrado. Ninguém fala sobre isso. Não é interessante. Houve uma guerra, israelitas e palestinianos morreram para nada, passemos então à próxima guerra.

Israel fará mais uma vez de conta que está surpreendido e ofendido – os cruéis árabes atacam de novo com rockets, sem razão”.

Tradução de inglês para português por Comité de Solidariedade com a Palestina.

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