Todos sofremos agora mais do que em qualquer outro momento
pela falta total de agentes, de instituições coletivas capazes de atuar efetivamente.
Zygmunt Bauman1
Ao longo da história da humanidade, a formação da cidade enquanto território político de uma comunidade (polis) ou das mais diversas instituições (políticas, sociais, culturais, cívicas, etc), surge como resultado da interação entre pessoas e a envolvente contextual com o propósito de organizar a vida coletiva em torno de princípios, valores e bens comuns (paz, saúde, liberdade, segurança, igualdade, educação, cultura,...) orientadas para promover a “vida boa” (bios) na sua pluralidade de situações, e assim salvaguardar o futuro.
Sem um nível adequado de interação social e simbólica que permita gerar laços de pertença cultural, estimular novos vínculos sociais e simultaneamente produzir a capacidade para partilhar novas ideias e novos mundos, uma instituição não cumpre o seu desígnio de nutrir e sustentar as relações sociais. Neste sentido, uma instituição pode também ser vista como uma tecnologia social que possibilita a durabilidade e sustentabilidade de uma determinada sociedade.
Uma instituição é assim um coletivo de elementos em interação permanente – com maior ou menor inércia-, composto por atores humanos e não-humanos (máquinas), os quais em conjunto favorecem o desenvolvimento de estratégias de ação. No caso das redes telemáticas, veja-se, por exemplo, o papel das tecnologias de mediação, nomeadamente nas “redes sociais” (facebook, twitter,etc.) e o potencial que comportam para criar ligações online e offline.
Na esfera pública cultural uma das mais relevantes funções sociais das instituições, especialmente por via das práticas artísticas, é a capacidade de criticar e propor alternativas ao status quo vigente, o qual se expressa na cristalização das hierarquias, dos privilégios e das desigualdades. É por esse motivo que uma sociedade democrática não pede instituições paternalistas com modelos pré-concebidos, inculcados e administrados de cima para baixo, designadamente em épocas de crises múltiplas. As instituições devem antes conjugar as vontades coletivas e representar a sociedade civil (ou parte dela) face aos poderes políticos previamente instituídos no âmbito das constituições políticas republicanas, contribuindo desse modo para o desenvolvimento das sociabilidades, das solidariedades e para a intensificação da democracia.
As instituições devem (re)conhecer e agir mediante os problemas concretos que afetam as sociedades em cada época, funcionando como um dispositivo coletivo de resolução/mitigação desses mesmos problemas. Os públicos das instituições seriam então mobilizados pelo pragmatismo e por uma ética que não é fundada na noção de obrigação mas na noção de valor, porque para lidar com os problemas as pessoas teriam de ajustar o seu comportamento (atitudes, motivações, estratégias, etc.) em relação à situação concreta.
Ao mesmo tempo que sustentam a coesão e o equilíbrio necessário à construção social do mundo, as instituições (em geral) deveriam ser catalisadores do debate plural de ideias e projetos distintos - acolhendo o agonismo inerente às dissensões- de forma regular e sistemática, pois a isso obriga a diversidade sociocultural. Neste aspeto é fulcral que as instituições articulem estratégias de resistência contra fenómenos extremos, em especial contra toda e qualquer configuração do fascismo, seja político, social, financeiro ou de outro género. Desse modo, abrem espaço à inovação social e ao questionamento radical, não ficando exclusivamente ao serviço de esquemas reprodutores do condicionamento social e de comportamentos miméticos.
Artigo de Rui Matoso para esquerda.net. Este artigo é a primeira parte de um conjunto de três artigos.