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Lamentavelmente não somos a Grécia

Nenhuma esquerda digna desse nome pode abdicar de defender os povos da Europa contra uma Europa que só serve para os punir.

Se os diretórios europeus continuarem assim, longe de limitarem o nosso avanço, eles vão aumentar o movimento de apoio popular a nosso favor. (…) Porque as pessoas não votarão simplesmente no Syriza, votarão pela Grécia, votarão pela sua dignidade”. As palavras de Alexis Tsipras falam da Europa realmente existente. Sem alimentar ilusões sobre a Europa que não existe porque isso é alimentar embustes e irresponsabilidade política. Tsipras responde com a defesa da Grécia e da dignidade das suas pessoas à chantagem que está aí, feita de nervoso das bolsas e de ameaças não veladas de exclusão da Grécia da zona euro e até da União Europeia. Os gregos sabem hoje que a escolha é entre eles e a trituração do que resta dos laços sociais na Grécia. E sabem de que lado está a democracia e de que lado está a Europa. A sua escolha será decisiva para uma e para a outra.

Precisamente ao mesmo tempo em que Tsipras mostra este realismo, em Portugal o Partido Socialista remete para uma Europa de fantasia a solução do problema da dívida do país. À manifesta insustentabilidade de uma dívida acima dos 130% do PIB e ao seu uso como ferramenta de legitimação de mais e mais cortes nos salários, nas pensões e nos serviços públicos, o Partido Socialista contrapõe a conversão da Europa. É a uma Europa que dá três meses de clemência à França e à Itália para que se verguem à obediência rígida às metas orçamentais que lhes foram impostas, é a essa Europa que o Partido Socialista insta o governo a dirigir-se para pedir o favor de nos deixar ter uma leitura inteligente do Tratado Orçamental e para que faça o favor de esquecer o Tratado e adote – assim estilo ‘para anteontem’ – normas alternativas sobre valor do défice.

O Partido Socialista sabe, por dever de honestidade diante da verdade das coisas, que essa Europa é uma pura quimera e que garantir tudo fazer para a conseguir é não garantir rigorosamente nada. O choque entre o realismo do combate duro pela democracia e a fantasia da Europa connosco é o choque entre uma esquerda empenhada na solução dos problemas concretos e uma política tão criativa como a contabilidade do BES. Nenhuma esquerda pode abdicar de lutar pela mudança da relação de forças em escala europeia. Mas nenhuma esquerda digna desse nome pode abdicar de defender os povos da Europa contra uma Europa que só serve para os punir. Esta é uma escolha irredutível. E não há fuga em frente nem ‘nim’ que permitam fingir que não é assim.

Sobre o/a autor(a)

Professor Universitário. Dirigente do Bloco de Esquerda
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