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O banco do capital europeu

A Comissão Europeia (CE), presidida pelo ex-Primeiro Ministro luxemburguês Jean-Claude Juncker, anunciou recentemente um plano de investimento que irá supostamente recuperar a economia europeia sem que seja necessário renegociar dívidas ou acabar com a austeridade.

Central para este plano é o Fundo Europeu para o Investimento Estratégico, criado com o irrealista objetivo de atrair 15 euros de investimento privado para cada euro de investimento público. O fundo, gerido pelo Banco de Investimento Europeu (BEI), que contará com um financiamento de 21 mil milhões de euros, visa sobretudo transferir o risco do investimento dos privados para os estados membros da UE.

O Fundo Europeu para o Investimento Estratégico, gerido pelo Banco de Investimento Europeu (BEI), que contará com um financiamento de 21 mil milhões de euros, visa sobretudo transferir o risco do investimento dos privados para os estados membros da UE.

Criado em 1957, o BEI tem servido cada vez mais como um instrumento para por o dinheiro dos contribuintes europeus ao serviço da acumulação de capital. Sediado no Luxemburgo, este banco é a maior instituição financeira multilateral pública do mundo, superando o Banco Mundial. O seu capital é assegurado pelos estados-membros da UE, o que lhe garante um rating de AAA, o máximo na escala das agências de notação financeira. Em 2013 o seu volume de financiamento ascendeu a 72 mil milhões de euros, dinheiro que foi investido, através de empréstimos e de investimentos em capital, em projetos de investimento decididos ao nível da CE.

Apesar de ser uma instituição da UE, o BEI opera com uma total falta de transparência, recusando-se tipicamente a divulgar informações sobre como o dinheiro dos estados membros é aplicado. Apenas em 2010 foi aprovada uma política de transparência que prescreve a obrigação de publicar informação sobre os investimentos antes da sua aprovação e um processo de consulta pública envolvendo as partes afetadas. As múltiplas exceções a esta política, contudo, apoiadas na “confidencialidade comercial”, assim como o grande atraso na publicação de informação, faz com que seja muito difícil para organizações não governamentais monitorizar a atividade do BEI. Pior ainda, o BEI está a preparar uma revisão da sua política de transparência que irá provavelmente tornar o processo de aprovação de projetos de investimento ainda mais opaco.

Tal como nas parcerias público-privadas, os investimentos geridos pelo BEI têm o condão de privatizar os lucros e socializar as perdas.

Para esta falta de transparência contribui também o uso cada vez mais frequente de intermediários financeiros, através de “linhas de crédito”. Com o fim de chegar a mais empresas, o BEI empresta dinheiro a instituições financeiras, como bancos e fundos de investimento, que depois emprestam o dinheiro a empresas a uma taxa de juro superior. Os empréstimos intermediados representam já 30% do volume de crédito do BEI mas os beneficiários finais dos créditos não são conhecidos. Esta falta de transparência faz com que seja impossível saber qual o impacto dos projetos de investimento.

Que o PS e os seus acólitos apostem na bondade do “Plano Juncker”, assente em mais um fundo de investimento do BEI, para relançar a economia portuguesa sem ter de mexer no Tratado Orçamental ou na governação económica da UE mostra o quanto estão comprometidos com as fantasias que sustentam a austeridade eterna

Uma ilustração de o que pode correr mal com o novo fundo europeu de investimento gerido pelo BEI pode ser encontrada olhando para uma iniciativa semelhante lançada em 2012, em que foi criado um sistema de emissão de obrigações para o financiamento de projetos europeus destinados a relançar o crescimento. O primeiro projeto financiado foi a construção de um armazém de gás offshore na costa espanhola. O projeto Castor acabou por ter de ser abandonado, dado que a injeção de gás no subsolo causou centenas de terramotos na região, e o valor das obrigações, num total de 1.4 mil milhões de euros, teve de ser suportado pelo estado espanhol. Como assinalou a Counter Balance, uma ONG que vigia a atividade do EIB, o que era suposto ser um motor de crescimento foi antes um motor de dívida.1

Tal como nas parcerias público-privadas, os investimentos geridos pelo BEI têm o condão de privatizar os lucros e socializar as perdas. Que o PS e os seus acólitos apostem na bondade do “Plano Juncker”, assente em mais um fundo de investimento do BEI, para relançar a economia portuguesa sem ter de mexer no Tratado Orçamental ou na governação económica da UE mostra o quanto estão comprometidos com as fantasias que sustentam a austeridade eterna.


1 Counter Balance, “First EU project bonds pilot project fail and will cost Spain EUR 1.4 billion”, 22 setembro 2014, http://www.counter-balance.org/first-eu-project-bonds-fail-and-will-cost-spain-eur-14-billion/

Sobre o/a autor(a)

Ricardo Coelho, economista, especializado em Economia Ecológica
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