O presidente do Uruguai, José “Pepe” Mujica, afirmou que a sensação que tem é de que o México é uma espécie de “Estado falido”. As declarações foram dadas em referência à crise vivida no país após o desaparecimento dos 43 estudantes da escola de Ayotzinapa, que ocorreu na cidade de Iguala, estado de Guerrero, em outubro. De acordo com Mujica, a vida humana no país “vale menos do que a de um cão” e a situação é pior do que a vivida numa ditadura, “que pelo menos tem enfoque político”, sendo que, neste caso, trata-se somente de “corrupção” e “dinheiro”.
A entrevista foi realizada na sexta-feira (21/11) pela revista Foreign Affairs e divulgada este domingo (23/11) pelos jornais mexicanos. Questionado sobre como se sentia diante dos recentes acontecimentos no México, tendo “vivido na própria pele a repressão política”, já que, durante a ditadura militar uruguaia, ficou 14 anos preso, o presidente afirmou que os poderes públicos parecem estar “perdidos” e “totalmente fora de controlo” no país norte-americano.
Quase dois meses depois do desaparecimento dos jovens, não foi dada nenhuma resposta considerada satisfatória pela sociedade, o que tem motivado uma série de protestos em todo o país.
Na avaliação do ex-guerrilheiro tupamaro, a situação mexicana é “pior do que uma ditadura” porque nas ditaduras, mesmo “sendo ferozes, pelo menos há um enfoque que pretende ser político”. Mas no país o que se vê “é corrupção, isso é um negócio, é dinheiro”, ressaltou.
Para Mujica, as pessoas boas do México devem esclarecer o assunto “caia quem cair, doa a quem doer e tenha a consequência que tiver”. Ele mencionou ainda as diversas valas comuns, onde foram enterrados diversos indigentes, encontradas na cidade de Iguala, onde desapareceram os estudantes: “quer dizer que há mortos que não foram sequer reclamados. Então a vida humana vale menos que a de um cão. É muito doloroso ver o México”, disse.
De acordo com o presidente uruguaio, apesar de ser um problema mexicano, a questão atingiu um nível que “ultrapassa o México”, sendo, por isso, “um problema de toda a humanidade”. Para ele, esse tipo de coisa não deveria ser permitida no mundo de hoje. “porque a civilização que temos tem muitíssimos defeitos, mas o progresso e a marcha dessa civilização não têm que atar as mãos, essas coisas não podem ocorrer nos dias de hoje”.
México vive uma “crise humanitária”
No dia 7 de novembro, tal como era esperado pelas famílias dos 43 estudantes, o procurador-geral do México, Jesús Murillo Karam, anunciou que todos os jovens estão mortos e que os corpos foram queimados e os restos, atirados para um rio. A informação dada por presos acusados pelo desaparecimento, longe de encerrar o caso, fortaleceu a onda de protestos no país.
A maior delas, considerada histórica no país, ocorreu na última quinta-feira (20/11), quando se comemorou o aniversário dos 104 anos da Revolução Mexicana. Durante o ato, familiares dos jovens denunciaram que as valas comuns e o desaparecimento forçado de pessoas são uma realidade em todo o país. Para a Amnistia Internacional, a situação revela que o México vive uma “crise humanitária”.
Apesar do caráter pacífico dos protestos, atos de violência foram registados pontualmente e motivaram uma resposta ofensiva por parte da polícia. Senadores do PRD (Partido da Revolução Democrática) e do PT (Partido do Trabalho) e o presidente do Morena (Movimento de Regeneração Nacional) denunciaram, no entanto, que o governo federal está por trás de tais atos violentos.
Em entrevista ao Opera Mundi, ex-agentes do Estado mexicano afirmaram que o presidente Enrique Peña Nieto e o Exército são os responsáveis pelo desaparecimento dos 43 estudantes.
Artigo publicado em http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/38621/mujica+mexico+e+um+estado+falido+onde+vida+humana+vale+menos+que+a+de+um+cachorro.shtml