You are here
“Na periferia da Europa, a mudança começa a sorrir”

Marisa Matias abriu o comício que juntou centenas de pessoas em Lisboa com várias referências às mobilizações dos últimos três anos contra a troika e a austeridade. Mas também à necessidade de uma “luta que é internacional” e que juntou esta sexta-feira representantes de paridos da esquerda de Espanha, Grécia, Irlanda e Portugal.
“O Bloco é hoje um partido que procura aprender em todo o mundo como servir melhor a luta do povo português. E a nossa experiência ajudou bastante muitos dos partidos e organizações a fazer o seu caminho”, afirmou a eurodeputada bloquista, sublinhando a importância de “estarmos atentos ao que fazem estes partidos que foram os protagonistas dos maiores sucessos da esquerda nas últimas europeias”.
Pablo Iglesias: “O que os poderosos temem é o povo”
Pablo Iglesias, o recém-eleito secretário-geral do Podemos, começou por apontar o “nervosismo” das classes dominantes espanholas face à ascensão do Podemos: “insultam, difamam, tentam convencer as pessoas que nós somos como eles”, disse Iglesias, referindo-se ao cerco mediático que tem por missão “procurar o lixo” nas vidas dos protagonistas do Podemos, partido que fez da denúncia e do combate à corrupção da “casta política” do regime uma das principais bandeiras.
"Não estamos na política para reivindicar a nossa identidade mas para que as pessoas vivam melhor”, defendeu Iglesias, porque “se a maioria das pessoas está de acordo que há uma elite sem-vergonha que vive à nossa conta, então estamos obrigados a ganhar e não a ocupar um espaço à esquerda de ninguém”.
“Perguntam-me muito pela poção mágica da ascensão do Podemos”, prosseguiu Iglesias, prometendo revelar os seus “cinco ingredientes”: o primeiro é "acabar com o pessimismo, daqueles que nos dizem que “não há condições objetivas”, que “as condições não estão maduras”, ou que “não há consciência de classe””. E aos pessimistas, responde Iglesias: “Estamos nisto para ganhar”.
“O segundo ingrediente é que temos de ser laicos, porque a esquerda não pode ser uma religião, com os seus padres e os seus evangelhos que dão resposta a todas as dúvidas”, acrescentou o líder do Podemos, lembrando que “os poderosos não temem um partido ou um grupo de dirigentes iluminados, o que eles temem é o povo”; o terceiro ingrediente é a “audácia política”, o que distingue “os revolucionários dos burocratas”: “apontar quem são os inimigos do povo e partir a espinha dorsal do consenso político imposto pelo neoliberalismo” e que tem destruído as sociedades do Sul da Europa, fomentando a emigração de uma geração; o quarto ingrediente “é partir o tabuleiro político”, porque não se consegue ganhar “enquanto estiver divido em direita e esquerda, centro esquerda e centro direita”, já que estes são “a casta que defende os mesmos interesses”. No tabuleiro político do Podemos, há “os que estão do lado das elites, dos bancos e do totalitarismo de mercado, e os que estão do lado da democracia, dos interesses do povo e da mudança”.
“Não estamos na política para reivindicar a nossa identidade mas para que as pessoas vivam melhor”, defendeu Iglesias, porque “se a maioria das pessoas está de acordo que há uma elite sem-vergonha que vive à nossa conta, então estamos obrigados a ganhar e não a ocupar um espaço à esquerda de ninguém”. Por fim, o quinto ingrediente é “a empatia”: “Os políticos da casta, com os seus fatos e gravatas e carros oficiais são feios, mas às vezes também somos um pouco tristes”, reconheceu Iglesias, que defende a opção por uma linguagem simples que diga algo às pessoas, em vez do discurso político pré-formatado e repetido até à exaustão pelos líderes partidários.
“Sei que o Bloco está numa situação difícil mas é nos momentos de debilidade que se pode arriscar a fazer o que os outros não fazem”, lembrou o líder do Podemos, numa altura em que “o terreno político europeu está aberto e não se divide em esquerda e direita”, como provam os resultados expressivos da extrema-direita francesa, o movimento 5 estrelas italiano, ou os eurocéticos ingleses nas últimas eleições.
“Um partido é uma máquina de pensar, explorar as contradições do adversário e ganhar. Fazer política de outra forma implica arriscar, ou achamos que com as nossas ideias de sempre se pode ganhar aos que mandam e nos têm derrotado há 30 anos?”, perguntou Iglesias.
Trevor Ó Clochartaigh: “É preciso juntar forças para travar o consenso de Bruxelas”
Na sua intervenção, Trevor Ó Clochartaigh, senador irlandês do Sinn Féin, destacou a recente mobilização do povo irlandês, com a maior manifestação antiausteridade de sempre, contra o aumento de impostos e os cortes previstos no Orçamento. “Depois de 6 anos de salvamento dos bancos, de desemprego, pobreza e emigração, o povo diz já basta” e a prova disso é o crescimento do Sinn Féin enquanto força aglutinadora do movimento contra a austeridade da troika.
“A troika está contente com o nosso governo, porque segue a mesma agenda neoliberal dos países sob memorando”, resumiu Trevor Ó Clochartaigh, defendendo que a esquerda concentre as suas forças “para travar o consenso de Bruxelas”. “Chegou a altura de devolver o poder aos Estados membros e de parar o ataque aos salários e às condições de vida dos trabalhadores”, concluiu.
Giorgios Karatsoubanis: “Precisamos de um apoio forte a um governo do Syriza”
“A ascensão do Syriza está a incomodar o sistema instalado. É a primeira vez desde 1958 que uma força da esquerda radical é a maior força da oposição”, lembrou Karatsoubanis, reconhecendo que o Bloco de Esquerda inspirou várias decisões tomadas na formação do Syriza e lembrando a história desta coligação e o sucesso da sua intervenção nos movimentos de solidariedade e apoio às vítimas da crise.
Giorgios Karatsoubanis, dirigente do Syriza, enunciou várias medidas que a troika e o Governo de Samaras foram aprovando nos anos em que “a Grécia serviu de cobaia” às experiências do FMI, BCE e Comissão Europeia e cujo resultado foi a tragédia social e o disparar da dívida.
“A ascensão do Syriza está a incomodar o sistema instalado. É a primeira vez desde 1958 que uma força da esquerda radical é a maior força da oposição”, lembrou Karatsoubanis, reconhecendo que o Bloco de Esquerda inspirou várias decisões tomadas na formação do Syriza e lembrando a história desta coligação e o sucesso da sua intervenção nos movimentos de solidariedade e apoio às vítimas da crise.
“Precisamos de um apoio forte a um governo do Syriza, por isso precisamos de uma esquerda radical forte, dinâmica e unida também em Portugal”, concluiu o dirigente da esquerda grega, que lembrou ainda alguns dos compromissos de um governo do seu partido, com a restruturação da dívida em primeiro lugar.
Catarina Martins: “Em Portugal, a corrupção é uma forma de poder”
A encerrar o encontro, Catarina Martins destacou a importância da solidariedade dos povos numa “Europa da austeridade e da finança que nos persegue” e apontou baterias aos governos dos partidos da direita e dos socialistas que escolheram Juncker para presidir à Comissão Europeia “e agora se dizem espantados por descobrirem as 300 multinacionais que andaram a fugir aos impostos sob o seu Governo no Luxemburgo”.
“Em Portugal, a corrupção é uma forma de poder e não casos isolados. Não são duas ou três maçãs podres que é preciso tirar do cesto, o cesto é que está podre”, prosseguiu a coordenadora bloquista, referindo-se “ao colapso do BES, os vistos gold que são as autoestradas dos dinheiros sujos, os tráficos nas privatizações com promiscuidade entre escritórios de advogados, governos e partidos”.
No caso português, lembrou a “total falta de vergonha do PS e da direita a propósito dos privilégios dos políticos. Mas vimos também como o Bloco conseguiu fazê-los recuar” e retirar a proposta do fim da suspensão das subvenções vitalícias aos ex-deputados.
“Em Portugal, a corrupção é uma forma de poder e não casos isolados. Não são duas ou três maçãs podres que é preciso tirar do cesto, o cesto é que está podre”, prosseguiu a coordenadora bloquista, referindo-se “ao colapso do BES, os vistos gold que são as autoestradas dos dinheiros sujos, os tráficos nas privatizações com promiscuidade entre escritórios de advogados, governos e partidos”.
Por outro lado, “na periferia da Europa, a mudança começa a sorrir”, concluiu Catarina, referindo-se aos resultados eleitorais do Syriza, Sinn Féinn e Podemos “num regime político abalado com o terramoto das troikas, com a corrupção destapada e com os movimentos sociais presentes na rua”.
Comments
A coragem do Bloco de Esquerda analisada por um leigo
Exmo. BE
Ando há muito tempo para me filiar num partido mas a simpatia que nutro pela esquerda torna a minha decisão muito complicada: a esquerda é muito desunida e muito submissa do PS (o partido da direita envergonhada). Se o BE não tivesse apoiado o candidato Manuel Alegre e tivesse escolhido alguém da verdadeira esquerda, não tenho dúvida de que eu já estaria nas fileiras do BE, a colaborar no planeamento de uma verdadeira revolução que ainda está por acontecer em Portugal.
Aprecio o entusiasmo do BE, mas, quanto à sua coragem, acho que ainda falta muito para mostrar. Não basta ficarem entusiasmados com os ventos que neste momento sopram a favor dos novos partidos contestatários da Europa, nem que as vitórias das esquerdas dos outros países contribuam para influenciar as mentalidades dos portugueses.
Em Portugal está mais do que visto que a maioria da população é de centro-direita ou inconformada, não há como ignorar esta realidade. E na minha modesta opinião a única forma de combater o centro-direita é deixá-lo afundar-se.
Para mim, uma estratégia que pode produzir bons resultados é o facto de o PS vencer as próximas eleições legislativas com minoria e ver-se obrigado a coligar-se com o PSD, será a cereja no topo do bolo! Se neste momento o povo já não pode mais com o PSD, daqui por dois ou três anos, então o povo não aguentará mais nem com PSD nem com PS. Mas para isto é preciso que o BE tenha coragem para amargurar mais algum tempo e não se deixar cai na tentação de tolerar as asneiras do PS e ainda muito menos de se coligar com ele.
Entretanto, o BE deve começar urgentemente a mostrar ao país que é capaz de construir uma convergência das esquerdas com gente capaz de assumir a governação,e, mais do que isso, capaz de apresentar um orçamento de estado que transmita confiança e credibilidade governativa.
Aproveito para elogiar a filosofia do "Podemos" e desejo que este partido seja uma verdadeira inspiração para o BE.
Add new comment