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“Nunca tivemos uma política educativa tão extremista e tão fundamentalista”, afirma Sampaio da Nóvoa

Durante uma entrevista ao Negócios, o ex-reitor da Universidade de Lisboa acusou Nuno Crato de “voltar ao famoso ‘ler, descrever e contar’ do salazarismo”. Sobre a especulação financeira, Sampaio da Nóvoa adiantou que “temos que reconquistar algum controlo sobre as nossas vidas”, defendendo “a nacionalização de parte dos sistemas bancários”.
Foto de António Cotrim, Lusa.

Sublinhando que não consegue “separar este Governo da troika nem a troika deste Governo”, António Sampaio da Nóvoa sublinhou que “Portugal precisa de abrir um tempo novo na sua história, na sua vida política”. “Este tempo da troika está esgotado”, frisou.

Segundo o ex-reitor da Universidade de Lisboa, “o problema principal desta governação é a ideologia da austeridade”.

E, segundo Sampaio da Nóvoa, as consequências deste modelo de “austeridade como ideologia de empobrecimento, de desqualificação, de dependência, da especulação financeira”, já se começam a “notar no trabalho, no desemprego, no desperdício da geração jovem”.

“Mas vão notar-se sobretudo nos próximos anos”, destacou, avançando que “uma das coisas que se vai notar é a política educativa deste Governo”.

Desde a década de 60, talvez desde a década de 50, quando o Leite Pinto foi ministro da Educação Nacional, 1955, 61, nunca tínhamos tido uma marca ideológica tão fundamentalista e tão extremista como tivemos neste Governo

“Nunca tivemos uma política educativa tão extremista e tão fundamentalista como tivemos desta vez”, referiu António Sampaio da Nóvoa durante a entrevista ao Jornal de Negócios, defendendo que “desde a década de 60, talvez desde a década de 50, quando o Leite Pinto foi ministro da Educação Nacional, 1955, 61, nunca tínhamos tido uma marca ideológica tão fundamentalista e tão extremista como tivemos neste Governo”.

“A política educativa do Nuno Crato é decalcada, vírgula a vírgula, ponto a ponto, da política educativa de George W. Bush, no princípio do século XXI”, acrescentou.

O ex-reitor da Universidade de Lisboa teceu críticas à “obsessão dos exames” e a uma política que seleciona, corta as pernas, afasta as pessoas, e, consequentemente empurra-as precocemente para vias profissionais.

“Isso é uma linha clara desta política”, arguiu Sampaio da Nóvoa, adiantando que “a segunda linha é “o voltar ao famoso ‘ler, descrever e contar’ do salazarismo”.

“Quando Nuno Crato fala do Português e da Matemática, hoje, a metáfora é a mesma que levou à escola salazarista. Uma escola paupérrima, medíocre, minimalista”

“Quando Nuno Crato fala do Português e da Matemática, hoje, a metáfora é a mesma que levou à escola salazarista. Uma escola paupérrima, medíocre, minimalista”, reiterou.

Lembrando que a Educação “foi de longe o sector onde houve mais cortes orçamentais ao longo destes últimos três anos”, inclusive “muito superiores aos que estavam propostos no memorando da troika”, António Sampaio da Nóvoa frisou que, “alegremente, Estamos a recuar, em termos de percentagem do PIB dedicado à Educação, a valores da década de 80, quando a escolaridade obrigatória ainda era de quatro anos, quando havia muito menos pessoas no sistema”.

“O retrocesso não se nota de imediato, não é amanhã. Estamos a criar um atraso e um desastre – é a palavra certa – que vai ter consequências graves no futuro”, alertou.

“Temos que reconquistar algum controlo sobre as nossas vidas”

Referindo-se a um “mundo regulado por um capitalismo financeiro completamente selvagem, sem nenhum controlo, especulativo”, o ex-reitor da Universidade de Lisboa afirmou que a letra de Os Vampiros, de Zeca Afonso, se mantém atual e que “não podemos consentir esta lógica autodestrutiva, estes bancos e empresas que ora estão a ganhar milhões, ora estão na miséria”.

“O nível de selvajaria chegou a tal ponto que temos que reconquistar algum controlo sobre as nossas vidas”

Confrontado com o que é necessário fazer para tornar esse mundo mais habitável, Sampaio da Nóvoa defendeu não só uma “maior regulação dos sistemas bancários e financeiros” como “a nacionalização de parte dos sistemas bancários”.

“O nível de selvajaria chegou a tal ponto que temos que reconquistar algum controlo sobre as nossas vidas”, frisou.

“O conhecimento que é capaz de trazer dignidade à vida”

António Sampaio da Nóvoa destacou ainda que é necessário “haver mecanismos de democracia que vão para além da representação de quatro em quatro anos”.

“As energias de mudança estão nestas duas coisas: primeiro, o trabalho de tornar intolerável a situação atual, este capitalismo voraz, selvagem; e o reforço da sociedade, da presença da sociedade nas suas diversas dimensões”, advogou. Por outro lado, o ex-reitor da Universidade de Lisboa salientou que “só podemos reforçar a sociedade por via do conhecimento” e que este “tem que ser educação, tem que ser formação, mais a capacidade de pôr esta gente bem preparada a trabalhar”.

“Uma terceira dimensão do conhecimento, que hoje é muito importante, é o conhecimento que é capaz de trazer dignidade à vida"

Para Sampaio da Nóvoa, “um dos grandes problemas de Portugal é que ciência e cultura científica não estão a chegar à sociedade”. “Não estamos a ser capazes de fazer dinâmicas de inovação”, lamentou, acrescentando que “uma terceira dimensão do conhecimento, que hoje é muito importante, é o conhecimento que é capaz de trazer dignidade à vida”.

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