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As tartarugas e o Sol do Brasil

Dilma passou à segunda volta seguida pelo candidato da direita Aécio Neves (PSDB). Agora sim, é preciso derrotar a direita com o 13 do PT mas sem ilusões. Há bolsa família, mas o capital financeiro é quem mais engorda.

O velho do andarilho caminha lentamente, mas firme no seu objetivo, essa pequena vitória saber-lhe-á pela vida. Talvez um dia as minhas vitórias quotidianas sejam semanalmente dar três passos para ir ao café ler as letras garrafais e as imagens de um semanário regional.

E todos os dias dar as mãos frias às mãos quentes da minha companheira, jurando-lhe, contra o mundo, amor eterno.

Admiro perseverança das tartarugas e molesta-me a urgência das lebres. Surda aos discursos do apocalipse, desmentidos a cada amanhecer, ainda que triste, a tartaruga segue o seu caminho. E acompanha a vida dos outros animais comuns, desprezando com a sua resistência indiferente os predadores que rápido desistem.

Era desta espécie paciente mas audaz Oscar Niemeyer, que teimou viver até aos 104 anos e teimou com muitos outros, especialmente com os braços dos candangos, a construção de Brasília no Planalto Central. Fazer a história com as mãos dos produtivos.

Houve também outros teimosos: as tartarugas também sabem quando é agora!, quando têm de correr pela vida. Lembro-me de um tal Prestes e da sua Coluna que percorreu 25 mil quilómetros confiante na adesão popular a uma revolta contra a república velha, mesmo sem sucesso. Lembro-me de Olga morrendo às mão dos nazis sem desistir.

Lembro-me destes do partidão e daquelas e daqueles que ousaram desalinhar da URSS e fazer um partido maior que o oficial, mas também do Brasil. E ainda deitaram sementes na Europa. Lembro-me destes e daquelas e aqueles que cederam à urgência da guerrilha mas não à capitulação. Lembro-me destes e daquelas e daqueles que souberam fazer um partido a partir da luta dos Trabalhadores, ainda que desalinhado das ortodoxias. Lembro-me destes e daquelas e daqueles que souberam desalinhar mais ainda, quando foi preciso, e reagrupar por caminhos vários a esperança: onde, com ou sem frente, brilha sempre o Socialismo.

Dilma passou à segunda volta, à frente, com 41,09%, seguida pelo candidato da direita Aécio Neves (PSDB) com 33,55%. E pelo caminho fica Marina (21,32%) para quem a "nova política" era capa para políticas económicas escritas por (ex)psdb's. Agora sim, é preciso derrotar a direita com o 13 do PT mas sem ilusões. Há bolsa família, mas o capital financeiro é quem mais engorda.

Olho para os demais candidatos e candidatas dos partidos de esquerda e recordo-me da primeira vez que votei nas presidenciais. Fui um dos 288 mil 261 votos de Francisco Louçã, nas presidenciais portuguesas de 2006. Felizmente esses votos representavam 5,31%, bem mais, em percentagem, do que o que representam os 1 milhão 612 mil 186 votos da Luciana Genro (PSoL, 1,55%), os 91 mil 209 votos do Zé Maria (PSTU, 0,09%), os 47.845 votos do Mauro Iasi (PCB, 0,05%) e os 12 mil 324 votos do Rui Costa Pimenta (PCO, 0,01%). Para que servem esses votos? Para desenvolver na luta o partido e o futuro.

É fácil agigantarmo-nos com as nossas percentagens portuguesas, sejam elas três, cinco, ou dez por cento, quando olhamos para o outro lado do Atlântico. No entanto, trata-se de fazer política para centenas de milhões de pessoas num país-continente onde o sistema político não nasceu de um processo revolucionário mas duma transição controlada.

Um vírgula cinquenta e cinco por cento é ainda pouco. Mas 1 milhão 612 mil 186 votos confirmam o lugar de quarta força política nas presidenciais, lugar já antes conquistado por Plínio de Arruda Sampaio em 2010, e simultaneamente são o dobro dos votos de há quatro anos.

O PSoL passa de três para cinco deputados federais, e a direita, oxalá!, vai perder o segundo turno para a coligação liderada pelo PT e onde figura também o PCdoB. Bem sei que aí há mas companhias e também políticas que servem a outros que não as trabalhadoras e os trabalhadores. Estes caminhos são complexos, e há descaminhos, mas tenho esperança em todas as diferentes tartarugas que teimam em caminhar em direção ao vermelho Sol.

Sobre o/a autor(a)

Investigador. Mestre em Relações Internacionais. Doutorando em Antropologia. Ativista do coletivo feminista Por Todas Nós. Dirigente do Bloco de Esquerda.
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