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Greves contra a corrente de 1974 marcaram a história

Na inauguração da exposição “O futuro era agora – nos 40 anos das greves contra a corrente (maio – setembro de 1974)", nesta segunda-feira, os historiadores Fernando Rosas e João Madeira sublinharam que aquele movimento foi determinante para arrancar grande parte das conquistas históricas da classe trabalhadora e os órgãos de vontade popular.
Uma exposição para recordar um movimento essencial e do qual pouco se fala. Foto de Luis Leiria.
Uma exposição para recordar um movimento essencial e do qual pouco se fala. Foto de Luis Leiria.

“Ninguém fala das greves contra a corrente. Foram completamente silenciadas”, observou o historiador Fernando Rosas na inauguração da exposição “O futuro era agora – nos 40 anos das greves contra a corrente (maio – setembro de 1974)", nesta segunda-feira, na associação José Afonso em Lisboa. Só por esse motivo já se justificava a evocação desse poderoso movimento grevista que começou há 40 anos. Foi um movimento que explodiu “em grande medida espontaneamente” e que em vagas sucessivas foi até setembro de 74, enfrentando uma oposição determinada da Junta de Salvação Nacional, do governo provisório e, dentro dele, uma oposição muito ativa do Partido Comunista e da Intersindical, que estava em processo de formação. “Esse movimento impõe-se e vence contra essas oposições todas”, recordou Rosas. “Grande parte daquilo que vão ser as conquistas históricas do movimento operário português são conseguidas neste período. Saneamentos dos responsáveis do fascismo, salário mínimo, 40 horas semanais de trabalho, férias pagas – o que é essencial é conquistado nesses meses de maio até setembro de 1974”.

Derrota do golpe spinolista

O historiador e dirigente do Bloco de Esquerda destacou ainda o papel cumprido por essas mobilizações na derrota do golpe de Spínola de 28 de setembro de 74, e para impor um outro curso ao processo revolucionário nestes meses. “Estamos a falar de um movimento muito importante para a fundação do Estado Social português, para a fundação do património de conquistas da classe operária e dos trabalhadores em Portugal”.

Exposição pode ser vista na Associação José Afonso, núcleo de Lisboa.

A montagem da exposição foi dirigida pelo historiador João Madeira, uma equipa de jovens historiadores que deram a sua colaboração e contou também com a ajuda de sindicalistas daquela época.

Fernando Rosas sublinhou ainda que a exposição não é “um suspiro de nostalgia”. E explicou : “Nestas greves contra a corrente em que o futuro era agora, a classe trabalhadora inverteu a relação histórica de injustiça entre o capital e o trabalho, a favor do trabalho. Quarenta anos depois, ao comemorá-la, estamos numa situação em que essa relação volta a ser invertida a favor do capital. Por isso é importante aprendermos com o que ficou para trás e procurarmos refletir com base nisso naquilo que temos hoje pela frente”.

Órgãos de vontade popular

O historiador recordou ainda que foi neste movimento que se fundaram os órgãos de vontade popular, que os trabalhadores inventaram as comissões de trabalhadores eleitas por plenários de trabalhadores, livremente revogáveis, competindo com as estruturas sindicais na representatividade e condução das lutas: “Essa é uma experiência histórica inolvidável que é muito urgente no momento atual trazer à tona como reflexão”.

"Estas manifestações são a primeira grande afirmação do proletariado como sujeito histórico pós-25 de abril”, diz João Madeira.

Para o historiador João Madeira, a exposição foi um trabalho coletivo feito por duas gerações – uma que viveu os acontecimentos e tem bastante memória disso, uma outra geração mais nova, que no âmbito dos seus trabalhos académicos estudou, investigou e trouxe o contributo desse conhecimento.

Uma democracia que é feita com os trabalhadores”

João Madeira sublinhou que “muito poucas organizações apoiaram as greves a partir de maio de 74, porque o que se estava a instituir era um sistema democrático já demasiadamente fechado nos partidos do arco da governação da época, e portanto este era um movimento que extravasava completamente esses limites”. As greves tiveram um impacto público muito grande e nesta medida foram um marco fundamental da fundação da própria democracia, “uma democracia que é feita com os trabalhadores e não uma democracia que é feita só com os militares ou só com os partidos tradicionais. Estas manifestações são a primeira grande afirmação do proletariado como sujeito histórico pós-25 de abril”, concluiu.

Colóquios

No âmbito da exposição, a Cultra (cooperativa cultura trabalho e socialismo) promoverá também a realização de dois colóquios, o primeiro a 31 de maio em Lisboa e o segundo a 13 de setembro na Cova da Piedade, no Museu da Cidade.

O primeiro colóquio terá como tema “O movimento operário e as greves contra a corrente maio/setembro de 1974” e nele intervirão Fernando Rosas, Francisco Bairrão Ruivo, Miguel Perez, João Madeira, Miguel Cardina, José Casimiro e José Carlos Valente.

O segundo colóquio terá como tema “O 12 de setembro de 1974 na Lisnave. As lutas nas empresas por quem as viveu”. Neste colóquio intervirão Carlos Santos, Mário Tomé, Eduardo Pires, Celso Ramos, José Carlos Valente, Vladimiro Guinot, José Alves, Manuel Monteiro e outros ativistas dessa época.

A exposição pode ser visitada na  Associação José Afonso em Lisboa (na rua de S. Bento 170, em frente à AR).

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