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Angola: Cronologia das manifestações

O site Maka Angola publica esta sexta feira uma cronologia das manifestações no país desde 2011, que o esquerda.net reproduz neste artigo.
Alguns dos jovens manifestantes, exibindo as ordens de libertação do tribunal, no dia 20 de setembro, momentos antes de terem sido novamente detidos por agentes da PIR. Foto do site Maka Angola.

O Maka Angola está a realizar um projeto de documentação sobre o exercício constitucional do direito de manifestação desde 2011. No princípio do referido ano, alguns jovens, inspirados pela primavera árabe, tentaram emular as mesmas ideias de mudança de regimes autoritários por via de protestos de rua.

Todos quantos queiram contribuir para o projeto podem enviar dados sobre protagonistas e participantes, casos de detenção, tortura e outros atos de violência, incluindo também eventos que tenham ocorrido nas províncias e não tenham sido registados.

2011

7 de março: Tentativa de manifestação antigovernamental na Praça da Independência, em Luanda, convocada anonimamente por um desconhecido Movimento Revolucionário do Povo Lutador de Angola e assinada com o pseudónimo Agostinho Jonas Roberto dos Santos. A Polícia Nacional (PN) deteve 12 cidadãos, incluindo o rapper Luaty Beirão, a jornalista Ana Margoso, do Novo Jornal.

O dia 7 de março de 2011 marcou o princípio dos protestos de rua em Angola. Os números da data, 070311, passaram a simbolizar o crescente movimento contra o presidente José Eduardo dos Santos.

22 de abril: O desdobramento de fortes dispositivos policiais forçou o cancelamento de duas manifestações previstas para este dia, uma no atual distrito do Cazenga, em Luanda, e outra em Caxito, na província do Bengo. Os moradores do Cazenga pretendiam protestar contra a insalubridade da zona. No Bengo, professores pretendiam reivindicar melhorias sociais.

3 de setembro: Agentes da PN, forças de segurança e milícias pró-governamentais, dispersaram violentamente uma manifestação contra o presidente José Eduardo dos Santos em que participavam várias centenas de manifestantes em Luanda. Forças de segurança e membros das milícias atacaram vários jornalistas que faziam a cobertura da manifestação. Apreenderam ou partiram as suas câmaras e outros aparelhos de gravação, na vã tentativa de impedir a cobertura mediática.

A brutalidade policial foi uma constante das manifestações desde 2011.

3 de dezembro: Polícias e agentes de segurança à paisana dispersaram violentamente uma manifestação pacífica de cerca de 100 jovens em Luanda e feriram pelo menos 14 pessoas.

2012

27 de janeiro: Uma manifestação organizada por residentes de Cacuaco exigindo acesso a água e eletricidade foi reprimida pela polícia. Foram detidos 12 manifestantes.

3 de fevereiro: Cerca de 50 manifestantes, que protestavam contra a prisão de cidadãos detidos numa manifestação anterior em Cacuaco, Luanda, foram agredidos por agentes da Polícia Nacional e de Intervenção Rápida. A polícia deteve 10 manifestantes, mas libertou-os no mesmo dia sem acusação.

4 de fevereiro: Em Cabinda, a polícia deteve 21 grevistas do sindicato dos trabalhadores da saúde, incluindo dois dirigentes sindicais. Os trabalhadores da saúde, em greve desde o dia 30 de janeiro, reclamavam melhores condições de trabalho e o pagamento de subsídios em atraso.

10 de março: No bairro do Cazenga, em Luanda, cerca de 40 manifestantes foram atacados por uma dúzia de agentes da PN, à paisana, armados com bastões, facas e pistolas. Um dos líderes dos protestos, Luaty Beirão, foi ferido, bem como dois outros manifestantes. Três jornalistas que cobriam o evento – um da Voz da América, outro da Rádio Despertar e um jornalista freelancer – e os manifestantes procuraram refúgio em residências privadas nas proximidades para escaparem à violência. Nessa tarde, membros das milícias atacaram violentamente o secretário-geral do Bloco Democrático, Filomeno Vieira Lopes, com barras de ferro. Teve de ser submetido a intervenções cirúrgicas no exterior do país.

Luaty Beirão, um dos líderes dos protestos, foi ferido numa manifestação a 10 de março de 2012.

Dois dias depois, a Televisão Pública de Angola (TPA) deu amplo espaço a um suposto “Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia na República de Angola” que reivindicou os ataques e prometeu mais actos de violência contra todos aqueles que se manifestem contra o regime.

Em Benguela, a polícia destacou unidades de intervenção rápida, brigadas caninas e carros de jato de água por toda a cidade. Polícias fardados e à paisana, armados com pistolas, dispersaram um grupo de cerca de 60 manifestantes pacíficos e detiveram três ativistas: Hugo Kalumbo (um dos organizadores do protesto), Jesse Lufendo (membro da organização de direitos humanos Omunga) e um motorista de táxi que estava a assistir aos acontecimentos.

31 de março: Marcha de cerca de quatro mil veteranos das ex-FAPLA (Forças Armadas Populares de Libertação de Angola) e simpatizantes, na cidade de Menongue, na província do Kuando-Kubango.

19 de maio: A UNITA realizou uma manifestação pacífica em Luanda com a presença de milhares de apoiantes.

23 de maio: Um grupo de cerca de 15 indivíduos afetos às milícias pró-governamentais, armados com pistolas, catanas e varas de ferro, atacou o núcleo de jovens que se havia notabilizado na organização de manifestações anti-Dos Santos, desde Março de 2011. O ataque ocorreu na residência de Dionísio “Carbono”, onde vários jovens estavam reunidos. Vários jovens ficaram gravemente feridos.

O ataque de 23 de maio de 2012 causou vários feridos.

27 de maio: Rapto de Alves Kamulingue, 30 anos, quando circulava, ao meio-dia, na baixa de Luanda. Kamulingue dirigia-se a uma manifestação que deveria ter juntado antigos membros da Unidade de Guarda Presidencial (UGP) e antigos combatentes, para a reclamação de pensões. A 29 de Maio, o seu companheiro Isaías Cassule, 34 anos, um dos organizadores da manifestação, também foi raptado.

7 de junho: Cerca de 3,000 veteranos de guerra saíram à rua, em Luanda, em protesto pelo atraso no pagamento das suas pensões.

Manifestação de desmobilizados de guerra, 7 de junho de 2012.

20 junho: Centenas de desmobilizados realizaram uma manifestação de protesto, em Luanda, que causou pânico na cidade. Um forte aparato da Polícia de Intervenção Rápida e da Polícia Militar dispersou violentamente os manifestantes a cassetete e com gás lacrimogéneo. Os antigos combatentes reclamavam o pagamento das suas pensões, muitas das quais em atraso desde há 20 anos. A Polícia Militar procedeu à detenção de mais de 50 veteranos de guerra. Ver vídeo.

29 de junho: Mais de 500 desmobilizados das ex-Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA) concentraram-se no Bairro João de Almeida, na cidade do Lubango, província da Huíla, para uma marcha de protesto em reclamação das pensões que lhes são devidas há 20 anos. O Fórum Independente dos Desmobilizados de Guerra de Angola (FIDEGA), responsável pela iniciativa, cancelou a marcha na hora, após um encontro com o Comando da Região Militar Sul no dia anterior.

14 de julho: Dois jornalistas (Coque Mukuta, correspondente do serviço em língua portuguesa da Voz da América, e Isaac Manuel, jornalista da estação de televisão RTP), foram detidos em Luanda numa manifestação antigovernamental impedida de se realizar pela polícia. No total, além dos jornalistas, foi confirmada a detenção de mais 10 pessoas.

3 de agosto: Um forte dispositivo combinado da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), agentes da ordem pública e dos Serviços de Inteligência e Segurança de Estado (SINSE), dispersaram, de forma violenta, uma concentração de veteranos de guerra que se preparava para realizar uma manifestação na cidade do Lubango, província da Huíla.

25 de agosto: Manifestação organizada pela UNITA, em Luanda, contra a fraude eleitoral.

22 de dezembro: Manifestação do Movimento Revolucionário para exigir da polícia uma explicação sobre o desaparecimento de Isaías Cassule e Alves Kamulingue.

2013

2 de fevereiro: Mais de 700 professores saíram à rua na cidade do Lubango para exigir melhores condições laborais e o pagamento de dívidas em atraso.

Manifestação de professores, Huíla. O Sindicato Nacional de Professores (SINPROF) tem vindo a organizar vários protestos em diferentes pontos do país.

30 de março: A Polícia Nacional deteve cerca de 20 pessoas durante uma tentativa de manifestação em Luanda sob o tema “Direito à Vida e Liberdade para Quem Pensa Diferente”, em protesto pelo desaparecimento de Isaías Cassule e Alves Kamulingue.

27 maio: Agentes da Policia Nacional dispersaram à bastonada os manifestantes que participavam na vigília convocada para esta tarde, em Luanda, pelo Movimento Revolucionário, em protesto pelo desaparecimento, há um ano atrás, de Isaías Cassule e Alves Kamulingue. Um dos manifestantes, Raúl Lindo “Mandela”, de 27 anos, foi brutalmente espancado. Um outro, Emiliano Catumbela, foi detido durante quase um mês e torturado sob ordens directas da comandante provincial da Polícia Nacional, Comissária Elizabeth “Bety” Rank Frank.

Tentativa de manifestação, 27 de maio de 2013.

15 de junho: Mais de 15 mil pessoas saíram à rua em protesto contra a onda de homicídios de camponesas, na localidade diamantífera de Cafunfo, município do Cuango, província da Lunda-Norte.

Manifestação em Cafunfo, Lunda Norte, de repúdio à onda de violência contra camponesas.

14 de setembro: Cerca de 5 mil professores aderiram a uma marcha de protesto no Lubango, província da Huíla. A marcha foi convocada pelo Sindicato Nacional de Professores (SINPROF), reivindicando melhores condições de emprego.

19 de setembro: Uma manifestação de protesto contra as injustiças sociais em Angola, organizada pelo Movimento Revolucionário, foi mais uma vez violentamente reprimida pela Polícia Nacional, em Luanda. Foram detidos 23 manifestantes. Por acaso, o secretário nacional do Bloco Democrático e vice-presidente do Sindicato Nacional dos Professores, Manuel de Victória Pereira, que se encontrava a distribuir boletins informativos do seu partido, na sua área de residência, também foi detido como manifestante. Vários manifestantes declararam ter sido agredidos por agentes policiais.

A cobertura noticiosa da manifestação foi também fortemente reprimida pela polícia que ordenou aos jornalistas estrangeiros que abandonassem o local, sob ameaça de serem também detidos. Coque Mukuta, jornalista da Voz da América, foi brevemente retido por agentes da polícia quando tentava apurar o nome de um manifestante detido junto ao cemitério da Santana.

20 de setembro: Menos de meia hora após terem sido libertados, sob termo de identidade e residência, a Polícia de Intervenção Rápida (PIR) deteve sete membros do autodenominado Movimento Revolucionário, que organizara uma manifestação antigovernamental, reprimida pela polícia no dia anterior. Adolfo António, Adolfo Campos, Amândio Canhanga “Sita Valle”, Joel Francisco, Quintuango Mabiala “Dimas Roussef”, Pedro Teka “Pedrowski”, Roberto Gamba “Pastor”, concediam entrevistas aos jornalistas Alexandre Solombe, Coque Mukuta e Rafael Marques de Morais quando foram detidos, incluindo os jornalistas. Estes foram violentamente agredidos e os seus materiais de reportagem foram apreendidos e destruídos pelos agentes da PIR. Depois de várias horas, os jornalistas foram libertados mas os manifestantes permaneceram detidos. Dias depois foram libertados sob caução, fixada em um milhão e 520,000 kwanzas (US $15,400).

Alguns dos jovens manifestantes, exibindo as ordens de soltura do tribunal, no dia 20 de setembro, momentos antes de terem sido novamente detidos por agentes da PIR.

23 de novembro: Um militante da CASA-CE, Manuel de Carvalho Hilberto Ganga, foi morto a tiro nas primeiras horas da madrugada por um agente da Unidade de Segurança Presidencial (USP). O malogrado foi detido enquanto colava cartazes nas paredes do Estádio dos Coqueiros, levado para a unidade da USP, junto à presidência, onde foi morto com um tiro nas costas.

Uma manifestação convocada pela UNITA, em protesto pelas notícias recentes dando conta da execução dos ativistas Isaías Cassule e Alves Kamulingue, foi violentamente reprimida com disparos sobre os manifestantes, canhões de água quente e granadas de gás lacrimogéneo. Foram registados vários feridos, incluindo o presidente da UNITA. Quase três centenas de pessoas foram detidas em todo o país, a maioria militantes da CASA-CE, que se tinham antecipado à manifestação com atos de colagem de cartazes nas ruas.

27 de novembro: A marcha funerária de Manuel de Carvalho Hilberto Ganga, militante da CASA-CE assassinado por operativos da USP a 23 de Novembro, foi impedida de prosseguir na Avenida Deolinda Rodrigues, nas imediações do Jumbo. O cortejo, que juntava centenas de pessoas, muitas envergando camisolas com os dizeres “Exigimos Justiça”, foi bloqueado por um forte dispositivo policial, que incluiu o uso de helicópteros, Polícia de Intervenção Rápida, Polícia Montada, duas viaturas com canhões de água e disparos de gás lacrimogéneo. O funeral prosseguiu após mais de uma hora de impedimento.

Marcha funerária de Manuel de Carvalho Hilberto Ganga, militante da CASA-CE assassinado por operativos da USP a 23 de novembro.

 

Cronologia publicada em http://makaangola.org/2013/12/27/cronologia-das-manifestacoes/

Desmobilizados Dispersos a Tiro

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