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Reforma económica e socialismo na China

O terceiro plenário do 18º congresso do Partido Comunista chinês decidiu abrir o mercado doméstico do país ao investimento estrangeiro. Isto implica uma transformação radical na economia. Por Alejandro Nadal, La Jornada.
Os principais líderes chineses Xi Jinping (centro), Li Keqiang (3º à direita), Zhang Dejiang (3º à esquerda), Yu Zhengsheng (2º à D), Liu Yunshan (2º à E), Wang Qishan (1º à D), Zhang Gaoli (1º à E) na 3ªa sessão plenária do 18º comité central do PCC em Pequim, em 12 de novembro de 2013.

O terceiro plenário do 18º congresso do Partido Comunista chinês será sempre recordado pela nova vaga de reformas económicas que aprovou. Esta nova série de reformas é comparável às que o partido introduziu em 1979 sob a autoridade do então primeiro-secretário Deng Xiaoping. Aquelas transformações abriram as portas do espaço económico chinês ao investimento estrangeiro orientado para o mercado internacional. As reformas desta sessão plenária têm objetivos diferentes.

As reformas de 1979 estabeleceram uma mistura de regulação através de planos quinquenais e do mercado, que procurava chegar a algo que poderia ser descrito como ‘socialismo de mercado’. As reformas concentraram-se em transformações nas empresas do Estado, mudanças na operação das finanças, nos impostos, na determinação de preços e no comércio externo. Para as empresas públicas foram introduzidas mudanças em matéria de retenção de dividendos, bónus de desempenho económico e excedentes além das quotas fixadas nos planos quinquenais. A partir de 1984-86, a transferência de dividendos foi substituída por impostos sobre os ganhos e muitas empresas públicas puderam começar a vender os seus excedentes (sobre as quotas dos planos quinquenais) no mercado livre. Entre 1987-92, introduziu-se um novo sistema de contratos de responsabilidade e em 1993 concedeu-se às empresas públicas um maior grau de autonomia. A cultura do desempenho económico tem sido interiorizada por toda a hierarquia das empresas públicas e o uso de orçamentos internos generalizou-se.

Outro grupo de reformas permitiu o investimento estrangeiro direto (IED) em múltiplos ramos da indústria. Mas o IED foi orientado primordialmente para o mercado externo e só uma fração da produção se pôde dirigir para o mercado doméstico. As zonas económicas exclusivas converteram-se num lugar de intercâmbio de tecnologia por mão de obra barata. Neste gigantesco esquema de divisão internacional de trabalho, a China conseguiu adquirir uma enorme base exportadora em muito pouco tempo, enquanto as corporações ocidentais (em especial, dos EUA) se apoderaram de uma enorme dotação de mão de obra barata, e assim puderam escapar às restrições que vinham experimentando nas suas próprias economias. A desindustrialização em boa parte dos Estados Unidos e em parte da Europa é consequência deste processo.

Hoje as mudanças que se veem no horizonte são bem mais profundos. Trata-se de abrir o mercado doméstico ao investimento estrangeiro. Isto implica uma transformação radical na economia, que se aproxima a grande velocidade. A China e a União Europeia estão em negociações sobre um possível acordo bilateral de investimentos. As reformas também seriam uma resposta de Pequim ao acordo transpacífico que os Estados Unidos promovem.

Aqui neste Pequim gelado todos sabem que a primeira vaga de reformas tinha a ver com mudanças que não eram difíceis de levar a cabo e para as quais não havia muita oposição. Hoje, as reformas orientadas a abrir o mercado doméstico serão mais difíceis de pôr em prática. As empresas públicas que operam na economia chinesa terão de enfrentar a concorrência de empresas estrangeiras e suas subsidiarias. É aqui que as coisas irão mostrar-se complicadas: haverá ajustes e ramos inteiros vão desaparecer. Na China há muitas indústrias crepusculares assentadas em barreiras artificiais que lhes oferecem proteção, mas logo que entre a concorrência, vão desmoronar-se como castelos de cartas. Também é provável que o comité de reformas do PCC promova a privatização de várias indústrias e até obras de infraestrutura.

O outro grande sector que será abalado pelas reformas é o financeiro. O saneamento dos bancos é uma tarefa urgente para enfrentar a mudança estrutural que vai ser levada a cabo. Além disso, a liberalização e a conta de capital é indispensável se Pequim quer projetar o yuan como moeda de reserva à escala global. Nos últimos anos, Pequim tem multiplicado os acordos de swaps de divisas com numerosos países, sinal inequívoco de que a hierarquia está consciente da transformação que está a acontecer na economia mundial. Tudo isso requer uma reforma financeira mais profunda, como parte da desregulamentação do sistema financeiro que agora é anunciada com maior força. Mas o capital financeiro pode converter-se num dragão que nem sequer a China consiga controlar.

Se a primeira vaga de reformas ofereceu às companhias transnacionais mão de obra barata quase ilimitada, a segunda vaga promete entregar além disso um mercado gigantesco. Deng Xiaoping, um dos principais arquitetos das reformas económicas na China, afirmou numa ocasião que a pobreza não é o socialismo. A hierarquia do Partido Comunista chinês deverá cuidar de que a via capitalista sob o neoliberalismo não acabe de devorar o que resta de caminho chinês para o socialismo.

Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net

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