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A demagogia do Governo sobre os fogos

As medidas do Governo para o “pós-fogos” são demagógicas, amplamente ineficazes e demonstram um enorme desprezo pelas populações rurais e pelas economias locais.

No meio da tragédia dos fogos florestais e das suas vítimas, foi confrangedor perceber que as medidas do Governo para o “pós-fogos”, anunciadas após a reunião do Conselho de Ministros desta quinta-feira, são demagógicas, amplamente ineficazes e demonstram um enorme desprezo pelas populações rurais e pelas economias locais.

Como já é habitual, é o critério financeiro que determina a decisão governamental. Na realidade, o Governo não vai gastar um cêntimo no apoio aos territórios afetados. As populações são mandadas recorrer a fundos comunitários para “reposição do potencial produtivo” e será permitido a oito autarquias, as dos concelhos mais afetados, ultrapassarem os limites de endividamento e utilizarem o fundo de emergência municipal.

Estas duas medidas, que se dirigem sobretudo para as infraestruturas e equipamentos, não abrangem o problema principal com que as pequenas economias de montanha estão confrontadas nos próximos meses: a alimentação animal.

Milhares de cabeças de gado ficarão sem capacidade de sobrevivência por ausência de pasto e os produtores pecuários de montanha não terão capacidade económica para alimentar os animais com forragem até à chegada da Primavera. Evidentemente que o despovoamento e o abandono serão as consequências imediatas, claramente associadas ao aumento do risco de incêndios cada vez mais prolongados e devastadores.

Esta situação prende-se com uma outra absolutamente decisiva, a das políticas públicas para prevenção dos fogos florestais, sempre desvalorizadas pelos últimos governos.

Para além da incapacidade de colocar as ZIF (Zonas de Intervenção Florestal) a funcionar, que seria a melhor forma, pela gestão coletiva ou em condomínio da floresta, de resolver o problema da estrutura de propriedade muito dispersa, o Governo teima em não adotar quatro medidas essenciais:

- Colocar a PAC (Política Agrícola Comum), que tem privilegiado o latifúndio, a apoiar o desenvolvimento das economias de montanha, nomeadamente subsidiando a aquisição de animais, o tratamento das pastagens, o aproveitamento da biomassa e a melhoria das condições de vida das comunidades locais;

- Cuidar do ordenamento da floresta, incentivando a diversidade das espécies florestais, ao contrário do recente decreto-lei de Assunção Cristas que incrementa a monocultura do eucalipto mesmo em terrenos com aptidão agrícola;

- A criação de um corpo profissional de bombeiros florestais que faça prevenção e gestão estratégica de material combustível florestal fora da “época de fogos” e amplie a capacidade de combate durante o verão;

- Aumentar o investimento na prevenção, com transferência progressiva das verbas alocadas ao combate para um programa nacional de prevenção, que inclua a gestão estratégica de combustíveis.

Os fogos florestais estão a debilitar de forma acelerada as economias rurais do interior. Enfrentar esta situação é um imperativo democrático da República e de um governo decente.

Sobre o/a autor(a)

Docente universitário IGOT/CEG; dirigente da associação ambientalista URTICA. Dirigente do Bloco de Esquerda
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