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Prevenção dos fogos: o debate para depois do combate
Esta quinta-feira faleceu o sétimo bombeiro depois de ter ficado ferido no combate ao incêndio da serra do Caramulo. Bernardo Cardoso, Ana Rita Pereira, António Nuno Ferreira, Daniel Falcão, Cátia Pereira Dias, Bernardo Figueiredo e Fernando Reis perderam a vida no combate aos fogos e outros três bombeiros estão internados em Coimbra com prognóstico reservado. Não se pode admitir esta tragédia a que se somam os custos económicos, ambientais e sociais.
De acordo com o European Forest Fire Information System este ano já arderam mais de 135 mil hectares e nos últimos 20 dias verificou-se uma média de 300 incêndios diários com mais de 5500 operacionais no terreno. O combate aos fogos florestais, se bem que obrigatório, é dispendioso, ineficaz e ineficiente na proteção das áreas florestais, e devia ser o último recurso. Não podemos mais esperar por políticas claras de prevenção dos incêndios florestais.
Ano após ano verificamos a triste realidade de que os governos gastam quatro vezes mais em combater incêndios do que na sua prevenção. Aliás, este ano estão previstos 74 milhões de euros para as operações de combate e apenas 20 milhões para as medidas de prevenção, como a criação e reforço de grupos de sapadores florestais ou a execução de faixas de gestão de combustível. Para mais, a prevenção dos incêndios também sofreu com as políticas de austeridade.
Infelizmente a aposta na prevenção é apenas um sound bite, os Planos Defesa da Floresta Contra Incêndios não são aplicados, as faixas de gestão de combustível não existem na maior parte dos casos. O que se verifica é um abandono das florestas e do espaço rural. Esta negligência e a contínua redução de recursos e o desmantelamento dos serviços florestais trouxeram-nos à situação dramática de hoje.
Só a gestão florestal ao nível da paisagem, comunitária e partilhada permitiria reduzir o risco de incêndio, identificando as zonas de maior propensão e realizando ações de controlo de combustível. É necessário conceber, implementar e apoiar um sistema que permita aos proprietários e produtores florestais conhecerem as suas propriedades - relembre-se que a maioria do território não cadastro - e criar condições para que estas possam ser geridas na perspetiva do bem comum e da valorização dos vários produtos e serviços florestais, o que não é possível com a microgestão do minifúndio - o proprietário florestal médio tem mais de sete propriedades que, no seu conjunto, não totalizam um hectare.
As Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) continham em si essa promessa e estavam desenhadas para permitir uma gestão não fragmentada da floresta, mas os apoios ao seu funcionamento ou tardaram a chegar ou nunca chegaram, e muitas ZIF nunca saíram do papel. Apesar disso estão hoje constituídas mais de 160 ZIF com uma área total próxima dos 900.000 ha (cerca de 9% do território do continente) o que constitui um esforço de contacto com dezenas de milhares de proprietários, que o ministério da tutela não respeita.
E por falar em papel, a eucaliptização do país - de acordo com os dados provisórios do último Inventário Florestal Nacional o eucalipto já é a espécie mais representada na floresta de Portugal Continental – é agora acelerada pela nova lei de Assunção Cristas que permite a arborização e rearborização com qualquer espécie florestal, criará condições para épocas de incêndio ainda mais desastrosas (ver aqui).
Quando as temperaturas descerem, quando terminar o combate, quando relembrarmos as vítimas dos incêndios, é tempo de fazer as perguntas difíceis e de não aceitarmos desculpas para não fazer o que tem de ser feito.
Comments
Porque não fazer campanhas de
Porque não fazer campanhas de proteção do Património também em Portugal? Prevenir os incêndios, investir no planeamento ambiental, promover e incentivar quiçá economicamente a limpeza das matas...em vez de ver crescer os lóbis do combate aos incêndios
Na medicina, nós sabemos que é na prevenção que devemos actuar....
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