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Não em nosso nome!

Sim, a Irmandade causou sofrimento às massas quando exerceu poder; mas o Exército quer restaurar a “estabilidade” – ou seja o regresso de uma certa ordem e do regime. Quer acabar com a revolução, e usará a Irmandade para tal. Declaração dos socialistas revolucionários egípcios.
Comemorações pelo derrube de Morsi. Foto de S. Behn, wikimedia commons

Quaisquer crimes que a Irmandade tenha cometido contra o povo e contra os Coptas em defesa do seu poder e em nome da religião, não cedemos a nossa autoridade ao chefe do exército Al-Sissi. Não iremos para as ruas na sexta-feira oferecendo um cheque em branco para cometer massacres.

Se Al-Sissi tem os meios legais para fazer o que quiser, por que motivo chama o povo às ruas? O que ele quer é um referendo popular para assumir o papel de César, e a lei não o fará mudar de ideias.

Sim, a Irmandade causou sofrimento às massas quando exerceu poder, e hoje vemos o regresso de atos terroristas no Sinai, em Al-Arish, e ataques contra o povo que vive em Manival e Al-Nahda.

Contudo, o exército não precisa de “permissão” para lidar com atos de terrorismo. Tem os meios legais para fazer isso e mais. Mas quer mesmo mais – quer uma mobilização popular que lhe dê sustentação para aumentar a coesão do Estado e da classe dominante atrás da sua liderança.

Quer apagar uma das conquistas mais importantes da revolução até ao momento, ou seja, a consciencialização das massas em relação ao papel repressivo do aparelho do estado e a intensa hostilidade deste contra elas. Quer tornar verdadeira a mentira “o exército, a polícia e o povo são um só”. O exército quer que o povo o siga pelas ruas, apenas um ano depois de as massas terem gritado “abaixo, abaixo o poder militar”.

Querem, finalmente, restaurar a “estabilidade” – ou seja o regresso de uma certa ordem e do regime. Querem acabar com a revolução, e usarão a Irmandade para tal. A Irmandade, em apenas um ano de poder virou contra si toda a gente: o Estado anterior, o exército e a polícia, a classe dominante, os trabalhadores e os pobres, os coptas, as organizações revolucionárias e partidos políticos. A queda da Irmandade era inevitável, e o povo celebrava a queda de Morsi mesmo antes de ir para as ruas em 30 de junho.

O aparelho militar, que se tinha aliado com os islamitas nos dois anos anteriores, decidiu quebrar esta aliança depois de aqueles terem fracassado a tarefa de conter a mobilização social e o aumento da revolta nas ruas. Aproveitou portanto a oportunidade para se ver livre de Morsi, para deter o desenvolvimento de um movimento revolucionário e impedir que o mesmo se enraizasse.

Querem encaminhar este movimento para uma direção “mais segura”, livrando-se da Irmandade para restaurar a ordem anterior. Esta estratégia viu os indefectíveis, polícia e exército, serem ilibados nos tribunais, enquanto os seus crimes eram adicionados à lista de processos contra a Irmandade.

E, acima de tudo, reivindicam também a responsabilidade pela revolução de 25 de janeiro. Não queremos ver Morsi julgado pelo assassínio dos mártires de Port Said e outros. Foi a política de Mubarak/Morsi a responsável. O mais importante é abrir a porta que se fechou com o acordo de Morsi: Justiça para os mártires.

Os crimes de Morsi foram cometidos junto com os militares, a polícia e o Estado de Mubarak. Deviam ser todos julgados em conjunto. Dar ao Estado anterior um mandato para que as suas instituições repressivas possam fazer o que querem aos seus parceiros de crimes anteriores, apenas lhes dará “mão livre” para reprimir toda e qualquer oposição daqui para a frente.

Vão reprimir todos os movimentos de protesto, greves de trabalhadores, protestos estáticos (1) e manifestações. Não podemos esquecer que os crimes que a Irmandade cometeu tiveram lugar debaixo do nariz da polícia e do exército, sem que estes interviessem para proteger os manifestantes ou o povo.

A ida às ruas das massas na sexta-feira é prejudicial à revolução, independentemente do que possam pensar os participantes. Dar ao exército um mandato popular para acabar com a Irmandade Muçulmana conduzirá inevitavelmente à consolidação do regime que a revolução conseguiu derrubar. Devemos usar a queda da Irmandade para aprofundar a revolução, não para sustentar o regime.

Temos de lidar com a Irmandade a um nível popular e político, respondendo aos seus atos de violência com a maior firmeza. Devemos organizar comités populares para nos defendermos contra ataques da Irmandade e proteger a revolução, que não cederá antes de derrubar o regime, e de ganhar pão, liberdade e justiça social, bem como a justa paga aos assassinos dos mártires.

Socialistas Revolucionários

Julho 25, 2013

Esta tradução apareceu pela primeira vez no Socialist Worker (Inglaterra)

Tradução de Luís Moreira para o Esquerda.net

NOTAS DA TRADUÇÃO PORTUGUESA

  1. Do documento em Inglês “sit-in”, onde as pessoas protestam sentando-se e bloqueando ruas, ou passagem de tropas

(...)

Neste dossier:

Egito, revolução e golpe de Estado

Na noite de 3/7/2013, o Exército anunciou a deposição do presidente Mohammad Morsi, contestado por grandes manifestações. O presidente foi detido, órgãos de comunicação ligados à Irmandade Muçulmana fechados e as forças repressivas mataram dezenas em manifestações pró-Morsi. Que aconteceu? Neste dossier, coordenado por Luis Leiria, procuramos contribuir para a compreensão do rumo que o Egito está a seguir.

Não em nosso nome!

Sim, a Irmandade causou sofrimento às massas quando exerceu poder; mas o Exército quer restaurar a “estabilidade” – ou seja o regresso de uma certa ordem e do regime. Quer acabar com a revolução, e usará a Irmandade para tal. Declaração dos socialistas revolucionários egípcios.

“Não deixem que o exército vos engane!”

Apelo de Fatma Ramadan, do comité executivo da Federação Egípcia dos Sindicatos Independentes (EFITU): A “permissão” [solicitada ao povo egípcio] pelo general Al-Sissi, é um veneno mortal. Não se deixem enganar substituindo uma ditadura religiosa por uma ditadura militar.

Graxa democrática para botas militares egípcias

O Ministério do Interior anunciou que vários órgãos de segurança que foram desmantelados depois do levantamento popular de 2011 serão restabelecidos. O governo também disse que pode voltar a adotar a Lei de Emergência, usada durante anos para reprimir a oposição política. Por Cam McGrath, da IPS

Direto do Egito: Uma traição para entrar na história

Desde o derrube do presidente Mohamad Morsi, no dia 2 de julho, a esmagadora maioria dos dirigentes com algum tipo de inserção na juventude ou nos círculos operários passou a apoiar ou integrar o atual governo dirigido pelo Exército. E pior, o processo de adesão ao regime ocorre em meio ao derramamento de sangue de dezenas de trabalhadores e camponeses apoiantes do presidente deposto, que estão a ser massacrados pelas Forças Armadas. Por Aldo Sauda, do Cairo

Lei de emergência, Caos Político e Mobilização Social

Depois das manifestações de 30 de junho, as imensas vagas de greves que as precederam durante três meses, é quase certo que a população saia novamente à rua por reivindicações próprias: “pão, justiça social e liberdade.” Por Jacques Chastaing, A l'encontre

“Forças Armadas do Egito não querem a democracia”

Em entrevista à Carta Maior, o egípcio Omar Ashour, professor da Universidade de Exter, analisa o impasse político que vive o seu país, após o golpe militar que derrubou o governo de Mohammed Morsi. Para ele, as forças armadas egípcias não aceitam um controlo democrático e estão dispostas a fazer o que for preciso para permanecer no poder. “O atual governo com civis com doutoramento e PhD foi nomeado pelos militares e só fará o que os militares disserem. Se houver um confronto eles serão afastados”, diz Ashour. Por Marcelo Justo, de Londres.

O Exército, a Irmandade Muçulmana e a Arábia Saudita

A saída de Morsi constitui incontestavelmente uma vitória para a Arábia Saudita e para os Emirados Árabes Unidos e uma derrota para o Qatar. O primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan é outro que perde com a nova realidade política egípcia. Por Alain Gresh.

Egito e Síria: o grande dilema

Talvez vocês enfrentem o mesmo dilema moral que eu: Que pensar acerca da Síria? Que pensar acerca do Egito?

PC egípcio afirma que foi uma "revolução democrática", não um golpe

Para Salah Adli, secretário geral do partido, o movimento que derrubou o presidente Mohammad Morsi do seu cargo não foi um golpe de Estado militar, mas sim uma Revolução feita pelo povo para se desfazer de um regime fascista.