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Bradley Manning e a culpa

Aquele que aos olhos da Administração norte-americana é um traidor revelou crimes de guerra inaceitáveis à luz de qualquer padrão de sociedade, esses sim os verdadeiros crimes. E, no entanto, quem cometeu os verdadeiros crimes continua impune.

Bradley Manning está preso há três anos. Na semana que agora passou, e depois de ter sido vítima dos mais atrozes abusos dentro da cadeia, foi julgado e condenado. Estava ainda a começar o ano de 2011 quando escrevi nas páginas deste jornal: “através da Wikileaks foram publicadas informações que marcaram a agenda dos últimos meses: “despiu-se” a diplomacia, puseram-se a nu “os imperadores”. A pessoa que alegadamente passou as informações – entendamo-lo, de clara utilidade pública – está isolada há meses em condições sub-humanas. O soldado Manning foi contratado para ler os relatórios que leu. Fê-lo supostamente com “demasiado profissionalismo” e, juntando os fios soltos, revelou teias muito densas de relações de poder, de claros abusos aos direitos humanos e uma manifesta falta de verdade num modelo de democracia que está minado pelos jogos de interesses. Esse mesmo modelo de democracia, que não aceita a “traição” de Manning, tudo faz para travar a “onda” de transparência entretanto iniciada. Por revelar a verdade, Manning falou demais. Ainda falta apurar a culpa”.

A culpa nunca morre solteira, diz o ditado. A culpa é a responsabilidade por um ato ou por uma omissão repreensível ou criminosa, diz o dicionário. Bradley Manning foi considerado culpado. Neste caso, a culpa foi-lhe atribuída pelos atos e não pelas omissões e acabou por arrecadá-la sozinho, ‘solteiro’ para seguir o ditado. Entre outros, foram-lhe atribuídos os crimes de roubo e de espionagem. Aquele que aos olhos da Administração norte-americana é um traidor, foi percebido um pouco por todo o mundo como um ícone da liberdade de expressão, revelou crimes de guerra inaceitáveis à luz de qualquer padrão de sociedade, esses sim os verdadeiros crimes. E, no entanto, quem cometeu os verdadeiros crimes continua impune.

Manning ficou a saber esta semana que, seja qual for a sentença final, irá passar as próximas décadas sem acesso à liberdade pelo crime de ter feito de nós seres mais informados, neste caso, mais livres.

Artigo de Marisa Matias, publicado no jornal “As Beiras” a 3 de agosto de 2013

Sobre o/a autor(a)

Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga.
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