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Bytes de terror: Edward Snowden e a Arquitetura da Opressão

A denúncia histórica de Snowden revelou o que ele chama de “arquitetura da opressão” – uma série de programas de vigilância ultra-secretos que ultrapassam em larga escala aquilo que até hoje se conheceu publicamente.
Foto de ubiquit23

Edward Snowden revelou ser o denunciante responsável por talvez a mais significativa libertação de documentos governamentais secretos na história dos Estados Unidos. O ex-funcionário da CIA e analista da empresa privada de Consultadoria Booz Allen Hamilton falou aos jornalistas Glenn Greenwald, Laura Poitras e Barton Gellman em Hong Kong, fornecendo evidências convincentes de que o governo dos Estados Unidos, mais concretamente a Agência de Segurança Nacional, (NSA) está a realizar uma enorme vigilância inconstitucional por todo o mundo e talvez o mais controverso, por quase todos, se não todos, os cidadãos dos Estados Unidos.

A unanimidade em estabelecer condenação foi rápida e implacável. Jeffrey Toobin, perito judicial, imediatamente escreveu no seu blogue que Snowden era um “um grandioso narcisista que merecia estar na prisão.” A este coro logo se juntaram, os colunistas do New York Times, com Thomas Friedman a escrever: “Não creio que Edward Snowden, o denunciante de todo este material secreto, seja um heroico delator.” O seu colega David Brooks envolvido na psicanálise especulativa de Snowden, fez o seguinte comentário; [em]bora sendo óbvio que é terrivelmente brilhante, não podia ter feito com sucesso o seu percurso na instituição do ensino médio. A seguir falhou em prosseguir o seu caminho na comunidade universitária.”

O percurso académico de Snowden, tem atraído atenção significativa. Senadores americanos questionaram com gentileza o Diretor da NSA Gen. Keith B. Alexander e outros numa audiência do Comité de Apropriações do Senado, incluindo o Senador liberal democrata Dick Durbin do Illinois, fazendo eco da incredulidade de Brooks de que alguém com um GED pudesse enganar todo o aparelho de Segurança dos Estados Unidos. Alexander confessou: “Na área de IT, na ciber área, algumas destas pessoas têm capacidades como operadores de redes. Na sua maior parte esse era o seu trabalho; tinha grandes capacidades nessa área. O resto inventou. Temos de recuar e olhar para os processos – ver onde falhámos.”

O lendário denunciante Daniel Ellsberg rebateu as críticas, ao escrever: “Na minha opinião, nunca houve na história dos Estados Unidos uma denúncia tão importante quanto a libertação dos documentos da NSA de Edward Snowden – e que sem qualquer dúvida inclui os Papeis do Pentágono de há 40 anos. A denúncia de Snowden dá-nos a possibilidade de reverter uma parte importante do que contribuiu para um “golpe executivo” contra a Constituição dos Estados Unidos.”

A denúncia histórica de Snowden revelou o que ele chama de “arquitetura da opressão” – uma série de programas de vigilância ultra-secretos que ultrapassam em larga escala aquilo que até hoje se conheceu publicamente. A primeira foi uma ordem do Tribunal de Justiça de vigilância secreta estrangeira dos Estados Unidos pedindo a uma divisão da gigante telefónica Verizon para que passasse “todos os registos de chamadas” de e para os Estados Unidos, ou dentro dos Estados Unidos, incluindo chamadas locais. Um outro documento foi uma apresentação em slides revelando um programa chamado “PRISM” que alegadamente dava autorização à NSA para ter acesso a todos os dados privados gravados pela Internet de gigantes tais como a Microsoft, AOL, Skype, Google, Apple e Facebook, incluindo e-mails, conversas em vídeo, fotografias, transferências de ficheiros e muito mais.

Snowden denunciou a Diretiva Política Presidencial 20 – um memorando secreto do Presidente Barack Obama às agências de segurança dos Estados Unidos para elaborarem uma lista de alvos de ataques cibernéticos aos Estados Unidos. Finalmente, chegou a prova do programa chamado “Informante sem limites” "Boundless Informant” que cria um “mapa de calor” a nível mundial detalhando os países de origem dos 97 milhões de registos intercetados recolhidos eletronicamente pela NSA no mês de Março de 2013. Entre os alvos principais estavam o Irão, Paquistão, Egito e Jordânia. O mapa tinha códigos de cores para os países: vermelho para “quente”, depois amarelo e verde. Em Março passado, os Estados Unidos tinham a cor amarela, dando à NSA perto de 2.9 mil milhões de intercetações.

O Sindicato das Liberdades Civis Americanas entrou com uma ação judicial imediatamente a seguir à revelação dos programas, argumentando que a “prática é semelhante a roubar o livro de endereços de cada cidadão americano – com anotação detalhadas de com quem falou, quando falou, durante quanto tempo e de onde foi efetuada a chamada. Isto dá ao governo um registo abrangente das nossas associações e movimentos públicos, revelando uma riqueza de detalhes sobre as nossas associações familiares, políticas, profissionais, religiosas, e íntimas.”

No momento da redação deste artigo, Edward Snowden encontra-se na clandestinidade, possivelmente ainda em Hong Kong, onde falou com o South China Morning Post, “não estou aqui para me esconder da justiça: estou aqui para revelar criminalidade.” Na entrevista filmada que deu a Gleen Greenwald and Poitras, Snowden falou das suas razões por detrás de revelação: “Sentado à minha secretária, [eu] possivelmente tinha as autoridades a escutar alguém, a si ou ao seu contabilista a um juiz federal, ou até ao presidente... Isto é algo que não nos compete decidir. O público precisa decidir se estes programas e políticas estão certos ou errados.”

Artigo publicado a 13 de junho de 2013 em "Democracy Now". Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna.Traduzido do inglês para português por Noémia Oliveira para esquerda.net

Sobre o/a autor(a)

Co-fundadora da rádio Democracy Now, jornalista norte-americana e escritora.
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