You are here
Ameaças do Acordo Transpacífico

Na primeira semana de abril de 2013, foram retomadas em Singapura as negociações do Acordo Transpacífico, um projeto anunciado pelos seus promotores como o maior e mais ambicioso tratado comercial. Participam 11 países: Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Estados Unidos, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Singapura e Vietname. Diz-se que será um instrumento para o crescimento, o emprego e a prosperidade. Essa é a promessa, mas a realidade será diferente.
A economia mundial tem três décadas de acordos comerciais de corte neoliberal que incluíram uma forte liberalização financeira, tanto internamente como nos fluxos transfronteiriços. Também têm sido acompanhados de regras sobre propriedade industrial, compras do sector público, medidas sanitárias e fitossanitárias, relações de trabalho e a proibição de ações jurídicas sobre as corporações internacionais. Esses acordos comerciais redefiniram radicalmente a estratégia de desenvolvimento de qualquer país e colocam-na nas mãos das multinacionais e do “livre mercado”.
Qual tem sido o resultado? Uma economia mundial semi-estagnada, altos níveis de desemprego, deterioração acelerada do ambiente e a pior crise em 80 anos. Alguém poderia pensar que com estes “êxitos” o afã de negociar novos acordos comerciaisseria travado. Mas é exatamente ao contrário. As corporações transnacionais precisam de abrir espaços de rentabilidade, ainda que seja em detrimento das regras de ética social e de saúde ambiental. E como essas empresas transnacionais se apoderaram da área da regulação, os seus amanuenses na burocracia esmeram-se na invenção de novos pactos comerciais.
O México aceitou ser parte do processo negociador no ano passado. Ao fazê-lo teve que aceitar duas condições prejudiciais. A primeira é que renunciou a qualquer pretensão de reabrir negociações sobre acordos já adotados pelos países que iniciaram o Acordo Transpacífico (ATP). Isto é, aceitou o princípio de que o que já se acordou deve ser aceite por um novo sócio para entrar no processo. A segunda é que também não pode solicitar a inclusão de novos temas na agenda do processo. Assim, o México entrou nas negociações como sempre: de joelhos e entregando tudo ainda antes de começar a negociar. Alguém poderia pensar que com o Tratado de Livre Comércio para a América do Norte (TLCAN) o nosso país já entregou tudo e não há nada a perder. Isso é parcialmente incorreto. Entregou-se tudo aos Estados Unidos e ao Canadá, não aos outros oito países da Ásia e América Latina. O ATP é uma nova ameaça sobre o México.
Um dos traços característicos do ATP é que os governos podem ser alvo de ação judicial por parte uma empresa estrangeira quando esta considerar que foi afetada nos lucros esperados. Esta parte do ATP é inspirada no capítulo XI do TLCAN que constitui uma ameaça particularmente perigosa em matéria de saúde pública, proteção ao consumidor e ao meio ambiente. Aliás ,este instrumento já foi utilizado pela empresa Metalclad em 1996. Certamente, a Monsanto poderá vir a recorrer a esta parte do TLCAN para forçar o governo federal a abrir completamente o campo mexicano aos seus daninhos milhos transgénicos. Atrever-se-á o governo de Peña Neto a recusar com uma clara negativa os perigosos planos da multinacional ou aceitará jogar o papel de subordinado?
O ATP também é um instrumento para pressionar a China no plano monetário. Como é que o gigante asiático não faz parte do ATP? A resposta é que se pretende criar uma cintura comercial que sirva para travar o auge do yuan chinês como moeda de referência e permita ampliar a vida útil do dólar norte-americano. As chamadas guerras de divisas de hoje serão exacerbadas pela entrada em vigor do ATP.
Por sua vez, o Japão apenas vai participar nas negociações. Os japoneses estão preocupados com a pressão para abrir o seu sector agropecuário e desregular o seu sistema de saúde pública. A 13 de março, um comité do parlamento japonês enviou uma carta ao primeiro-ministro Shinzo Abe alertando sobre a ameaça do ATP. A sua advertência central: é necessário evitar a humilhação e subordinação do México ao incorporar o processo no ano passado. Aos parlamentares japoneses não escapou o custo que significa aceitar um projeto de tratado que já está muito avançado sem terem participado nas negociações. Ao contrário dos governos mexicanos, o Japão não acha que deve comportar-se como satélite dos Estados Unidos.
O ATP também poderá converter-se num cordão ou num bloco militar. Nesta região já existem antecedentes de acordos comerciais e estratégicos para travar o auge económico de uma potência emergente que tinha as suas próprias pretensões imperialistas (Japão nos anos 1921-1938). O resultado foi a extensão da segunda guerra mundial no oceano Pacífico. Um mau presságio: Obama acaba de estabelecer o Pacífico ocidental como o centro de operações das forças navais norte-americanas.
Artigo de Alejandro Nadal, publicado no jornal mexicano La Jornada. Tradução de Carlos Santos para esquerda.net
Add new comment