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Associações opõem-se a introdução de propinas no ensino secundário

Segundo o primeiro ministro, “temos uma Constituição que trata o esforço do lado da Educação de uma forma diferente do esforço do lado da Saúde". Na área da Educação, adianta, "temos alguma margem de liberdade para poder ter um sistema de financiamento mais repartido entre os cidadãos e a parte fiscal directa que é assumida pelo Estado.”
Ainda que o Ministério da Educação de Ciência (MEC) tenha vindo a garantir esta quinta-feira ao jornal Público que “nunca o Governo pôs em causa a gratuitidade da escolaridade obrigatória", certo é que vários órgãos de comunicação social avançam que o governo planeia introduzir propinas no ensino secundário, o que tem gerado uma enorme onda de contestação.
O Correio da Manhã noticia, inclusive, que em causa estão dois cenários possíveis: ou a propina aplicada é "igual para todas as famílias, com a atribuição de uma bolsa com base no IRS", ou é aplicada "através de escalões indexados ao referido imposto".
Introdução de propinas no secundário leva a aumento do abandono escolar
A introdução de propinas no secundário “vai fazer com que em vez de se combater o abandono escolar se esteja a criar condições para promover o abandono escolar, que os nossos jovens abandonem a escola por incapacidade das famílias em os manter no sistema educativo sobretudo ainda tendo de pagar para o frequentar", explicou João Dias da Silva, secretário-geral da Federação Nacional da Educação (FNE), à agência Lusa, defendendo que o “Estado tem a responsabilidade de oferecer a escolaridade obrigatória gratuita”.
Também José Pacheco, diretor do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho, acredita que “a medida terá necessariamente reflexos a nível do abandono escolar” e considera “absolutamente lamentável” que, “em vez de aumentar o orçamento da Educação — como é regra nos países nórdicos em momentos de crise financeira —, o Governo esteja a fazer o oposto e, além disso, a tomar medidas avulsas e economicistas, que desregulam a escola pública”.
"Que legitimidade tem o Estado para estabelecer a obrigatoriedade de ensino até ao 12.º ano e depois taxar a sua frequência? Ao menos que seja coerente e acabe com essa obrigatoriedade”, afirmou o investigador, em declarações ao jornal Público.
"É um dado objetivo que a escola pública tem, em Portugal, uma função social extremamente importante, que este Governo está também a pôr em causa", frisou.
“Quando desinvestimos na educação, estamos a hipotecar as gerações futuras”
Também a Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE) manifestou a sua indignação perante a intenção do Governo de introduzir um sistema de co-financiamento no ensino secundário.
Em declarações à agência Lusa, Isabel Gregório, representante da CNIPE, afirmou que “quando desinvestimos na educação, estamos a hipotecar as gerações futuras”. “Um povo sem educação, sem cultura, é um povo alienado, quase como animais irracionais”, ilustrou.
“A cada dia que passa, de cada vez que o primeiro-ministro surge na Comunicação Social, estamos sempre à espera de mais qualquer coisa para empobrecer as famílias”, disse Isabel Gregório.
“Por um lado, tentam colmatar a fome nas escolas e depois cobram?”, questionou, sublinhando qie “ainda gostaria de perceber o que o Governo quer fazer com os nossos filhos”.
“Para que pagamos impostos, se não temos direitos nenhuns?”, interrogou ainda Isabel Gregório.
Governo promove “uma revisão constitucional encapotada”
O presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP), Albino Almeida, frisou, em declarações à agência Lusa, que o anúncio de Pedro Passos Coelho “é surpreendente, numa altura em que se fez uma revisão curricular que retirou várias ofertas e ocorre o maior aumento de impostos de sempre”.
“A obrigatoriedade (da escolaridade) não pode ser seguida de comparticipação pelas famílias”, reiterou Albino Almeida, acusando o governo de estar a promover “uma revisão constitucional encapotada” e de não ter “legitimidade” para “dar esse passo”.
“O primeiro-ministro não pode esquecer que os pais colocam dinheiro na educação”, rematou.
A medida é “manifestamente inconstitucional”
Para o constitucionalista Jorge Miranda, esta medida é “manifestamente inconstitucional”. “Não tenho a mínima dúvida — na Constituição a gratuitidade está relacionada com a obrigatoriedade e, a partir do momento em que o ensino secundário passa a ser obrigatório, tem necessariamente de ser, também, gratuito”, afirmou Jorge Miranda ao jornal Público.
Mas “ser ou não inconstitucional nem é o mais significativo nesta discussão”, adiantou. “Apesar do esforço que tem sido feito, ainda há muito, muito, a fazer em termos de qualificações e essa é uma medida que com toda a certeza iria contribuir para o abandono escolar e para o empobrecimento cultural do país. Seria muito grave”, defendeu o constitucionalista.
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Estas declarações do Passos
Estas declarações do Passos Coelho só demonstram ignorância. Então, agora que o ensino secundário passou a ser obrigatório vai passar a ser pago? Alguém com um mínimo de bom senso acha que isso faz algum sentido?
Realce também para as lamentáveis declarações do constitucionalista Bacelar Gouveia, ao considerar não só essa eventual medida como constitucional mas também ao afirmar que "os ricos podem e devem pagar". Esse é o argumento estafado dos que atacam o Estado Social (dizem o mesmo sobre a saúde), esquecendo que, se os ricos tiverem de pagar os serviços públicos, irão para o privado, no que serão seguidos pela maioria das classes médias. Ficando destinados apenas aos pobres, degradar-se-ão, pois não só estes têm fraca capacidade de reivindicar uma maior qualidade mas também a própria imagem dos serviços tenderá a degradar-se.
Se todos pagamos impostos, temos direito a ter, em contrapartida, serviços públicos de qualidade, universais e gratuitos.
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