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A austeridade tem perna curta

A visita de Angela Merkel a Portugal é uma provocação porque, ao contrário do que é dito, não é uma visita de solidariedade. É uma visita que procura validar uma política que nos está a destruir, em benefício próprio.

Na semana que agora passa, e numa ante-estreia da visita a Portugal, Angela Merkel visitou o Parlamento Europeu e participou numa reunião com deputados. Entre outras coisas, reforçou várias vezes a ideia de que os programas de ajustamento estão a dar resultado, deu o exemplo de Portugal, e que a austeridade é para continuar.

Postas as coisas nestes termos, a visita de Angela Merkel a Portugal é uma provocação. É uma provocação porque, ao contrário do que é dito, não é uma visita de solidariedade. É uma visita que procura validar uma política que nos está a destruir, em benefício próprio. É uma provocação porque Angela Merkel se apresenta perante o povo português como a líder de um país generoso que nos está a ajudar. Na sua cartilha, se estamos em dificuldades é devido aos supostos excessos que o povo cometeu no passado. Ora isto não é verdade, é antes um mito, e não por tanto repeti-lo que se transforma em verdade. Os contribuintes alemães não pagaram ainda um euro que fosse para os supostos resgates de Portugal, da Grécia ou da Irlanda. O que o Estado alemão fez foi conceder garantias a um fundo europeu, esse fundo emite dívida a taxas quase nulas para emprestar depois com taxas de 3% ou 4% a estes mesmos países. Ajuda? Não nos deixemos enganar. Lucro de alguns. É isso mesmo: há quem esteja a lucrar com estes sacrifícios que estamos a ser obrigados a fazer. E quem lucra não são os contribuintes alemães, mas antes os bancos alemães.

Disto tudo podemos retirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, não é a Alemanha que nos está a financiar, mas nós que estamos a financiar a banca alemã. Em segundo, temos de desmistificar a ideia de andamos a viver acima das nossas possibilidades, quando na realidade o que estamos a fazer é alimentar a economia alemã acima das nossas possibilidades.

Certo, certo é que não há mentira que a realidade não desfaça e está cada vez mais à vista. A Europa não pode sobreviver eternamente a uma escalada de divergência, onde os excedentes de uns são feitos à custa da dívida dos outros, ou onde a banca alemã singra à custa do trabalho e do Sul da Europa por via dos cortes salariais, do aumento do desemprego, da precariedade e dos impostos. É por isso que nas previsões económicas avançadas esta semana em Bruxelas se vê que em 2013 a Alemanha é já colocada em terreno de recessão, longe dos 3% de crescimento que teve em 2011. Se mais provas faltassem, ei-la a definitiva: a austeridade, como dissemos à Senhora Merkel, mata e é suicida não só para os países do sul, mas para a Europa como um todo.

Artigo publicado no jornal “As Beiras” de 10 de novembro de 2012

Sobre o/a autor(a)

Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga.
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