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Quem inspeciona as condições de trabalho nas escolas?

A desvalorização que há muito se vem fazendo sentir dos não docentes na Escola Pública (fundamentalmente dos assistentes operacionais), tem-se acentuado de forma preocupante, com consequências no normal funcionamento das escolas e inevitavelmente na segurança dos alunos, bem como nas condições de trabalho. Contributo de José Lopes.

Este facto merecia, não só a preocupação das comunidades educativas, dos pais e suas organizações associativas, como a intervenção de entidades de inspeção, que a exemplo da Inspeção do Trabalho, mesmo que amputada do seu verdadeiro papel junto do sector privado, pudesse igualmente atuar perante os flagrantes maus exemplos a que se assiste, no âmbito das relações laborais no sector público com o patrão Estado.

É verdade que o pensamento, no caso concreto do atual governo e do seu Ministro da Educação, Nuno Crato, no que toca à forma como vê o papel dos não docentes, é desde logo assumida numa nota designada, “Sobre o Ministério da Educação e Ciência”, na sua página na internet, quando, sem uma única referência a estes elementos fundamentais das comunidades escolares, diz que, “A Educação determina o futuro do país e deve gerar igualdade de oportunidades para as gerações futuras. Para obter bons resultados é necessário determinação e rigor. A cooperação de pais, professores e alunos é fundamental para a criação de um ambiente de trabalho favorável, que privilegie a exigência”, concluindo este parágrafo, sobre o tema da Educação com a afirmação, de que “O Governo assume a Educação como serviço público universal e defende como princípios o esforço, a disciplina e a autonomia”. Linha de orientação que só pode resumir-se à prioridade de autoritarismo, porque a prática governativa a pretexto do fanatismo de redução do défice, privilegia a desregulamentação laboral na função pública e insiste violentamente no corte de despesas na Educação e consequentemente na Escola Pública, que se reflete com grave incidência na significativa redução de pessoal docente e não docente, deixando-a perigosamente descaracterizada. Cenário inquietante que determinará o futuro do país sim, mas cada vez mais distante da apregoada e constitucionalmente estabelecida, “igualdade de oportunidades para as gerações futuras”.

O ataque aos professores, traduzido no maior despedimento coletivo, deixou fora das escolas milhares de profissionais da educação, como corolário de todas as medidas legislativas e ajustamentos curriculares para reduzir mão-de-obra. Estas medidas foram sendo arquitetadas e ensaiadas meticulosamente por sucessivos governos, que não mereceram a devida atenção para as suas consequências e objetivos finais, que o atual governo ao serviço da troika demonstra poder continuar a desbravar, perante portas tão escancaradas, prometendo mais e mais redução de docentes na Escola Pública e o aumento da sua precariedade e proletarização, em nome da estranha lógica dos custos com a Educação.

No caso dos assistentes operacionais, a precariedade, não só é igualmente selvagem e indigna, como, se agudizam de forma dramática os efeitos de redução de efetivos, que vêm sendo impostos nos últimos anos nas escolas, resultando num inegável défice de pessoal auxiliar, independentemente de falaciosos rácios que vêm tentando justificar a eliminação de postos de trabalho nesta área dos serviços públicos.

As consequências dos cortes cegos estão bem à vista de todos os elementos das comunidades educativas. Nas escolas faltam assistentes operacionais que garantam o normal funcionamento dos serviços, a segurança dos alunos, a qualidade do meio escolar, o indispensável acompanhamento das crianças ao almoço, a relação social e humanizada de que cada vez mais o meio escolar carece no atual quadro de fragilidade das famílias social e economicamente, e para o qual estes profissionais são decisivos até na colaboração e compreensão de fenómenos de dramas sociais, resultantes da situação de crise que se vive nas comunidades locais, e que para tal muito precisam de ser incentivados, motivados, formados e dignificados.

A sucessiva redução de contratações, mesmo em regime precário, teve particular destaque neste ano letivo. Um ano de mais e insustentáveis medidas governamentais de agravamento da austeridade, com as escolas e os mega-agrupamentos com falta de capacidade de resposta ao nível de meios humanos, como o pessoal assistente operacional, para garantir a efetiva normalidade dos serviços, de forma a serem respeitados os direitos e conteúdos funcionais destes trabalhadores, cada vez mais usados numa lógica do desenrasque. Caminho pouco coerente com a Lei de Bases do Sistema Educativo e princípios gerais, que os não docentes também têm o seu contributo a dar, para que o sistema educativo responda efetivamente às necessidades resultantes da realidade social, “contribuindo para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários e valorizando a dimensão humana do trabalho”. Dimensão humana, que não pode deixar de ser tida em linha de conta, também para os profissionais da educação, já que, segundo a Lei de Bases do Sistema Educativo: “A educação promove o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva”.

Para atingir tais princípios gerais, que as políticas governamentais vêm desvirtuando e desvalorizando, são necessários indiscutivelmente profissionais da educação que não estejam a ser influenciados pelo medo, a ser usados como descartáveis, a ser despidos do seus papel de pedagogos ou a serem ultrajados na sua dignidade pessoal e profissional, que só pode comprometer irremediavelmente o seu fundamental papel na Escola Pública, sejam professores, técnicos especializados, administrativos ou assistentes operacionais.

16/10/2012

Contributo de José Lopes

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